Estamos explicando o texto? - Parte 4
2.5 Um texto; múltiplos significados?
Diante
de exemplos como o da alegorização que o pregador mencionado anteriormente fez
do verso do cego à beira do caminho ou do uso ilegítimo de 1 João 2.15 (além de
várias outras formas comuns de mal-interpretar o texto bíblico, como a
moralização, a espiritualização, a pregação exemplarista e antropocêntrica
etc), muitos se perguntam: “Mas o texto não pode ter o significado que você
explicou e também este outro significado?” – mesmo que tais significados não
possuam qualquer relação entre si.
Pretendendo
exaltar a Bíblia, gostamos de pensar nela como sendo infinita. Com isso,
defendemos que um mesmo texto pode possuir diversos significados. A Bíblia,
porém, não se propõe ser infinita nesse sentido. Obviamente, ela é inexaurível
no que tange a sua profundidade, não quanto a uma variedade de significados
totalmente diferentes em cada verso. Um texto que pode significar coisas sem
qualquer relação entre si acaba não significando nada em si mesmo. Um texto
possui apenas um significado: aquele que o próprio autor lhe conferiu. Esse
único significado pode ser infinitamente profundo e apresentar uma mesma
verdade sob várias facetas, mas não pode apresentar a infinidade de
significados que a imaginação do leitor pretender, por mais belos e piedosos
que pareçam. Não é a beleza e criatividade que valida a interpretação, mas a
fidelidade à intenção do autor. “A Escritura afirma também existir da parte dos
escritores bíblicos uma bem definida verdade-intenção, e não uma multiplicidade
de significados subjetivos e livres” (DEDEREN, 2011, p. 75).
Alguns
se escandalizam diante da afirmação de que o texto bíblico não possui vários
significados, porém, não se escandalizam diante do fato de que, ao atribuir
vários significados ao texto bíblico (e a qualquer texto), atribui-se significados
que o próprio autor não pretendeu atribuir, e, portanto, não somos autorizados
a fazê-lo. O significado do texto pertence a quem o concebeu, não a quem o lê.
Mesmo
os acadêmicos que escrevem inúmeros livros e artigos para dizer que o
significado pertence ao leitor, e não ao autor, pretendem que todos os seus
livros e artigos sejam entendidos como eles escreveram, e não como o leitor
imaginar. Então, amigo, não caia nessa. Seja respeitoso e responsável para com
a Palavra de Deus. É a obrigação de todo o que pretende abri-la, sobretudo
perante o povo.
2.6
Analfabetismo bíblico
No
último dia 28 de outubro, o Instituto de Pesquisas LifeWay publicou uma
pesquisa assustadora.Além de 50% dos evangélicos entrevistados haver respondido
que “a Bíblia é útil, mas não uma verdade literal”, afora graves erros de
percepção acerca de doutrinas basilares, como a doutrina da Trindade, é
extremamente preocupante também as respostas dos entrevistados acerca da
doutrina da Salvação. 18% deles creem que “Deus me ama por causa das coisas
boas que fiz ou faço”. 56% disseram que “as pessoas devem contribuir com seu
esforço para serem salvas”. 71% afirmaram que “primeiro as pessoas buscam a
Deus, então Ele responde com Sua graça”. Se você não viu problema com tais respostas,
tema e trema por você, meu irmão! Peça misericórdia e sabedoria a Deus e corra
para se debruçar sobre o tema da salvação.
Comentando
essa pesquisa, John Stackhouse, professor de teologia no Regent College,
afirmou “que é preciso mais empenho dos que pregam para deixar claro o que a
Bíblia ensina sobre essas questões-chaves”.[1] Quando você não se preocupa em
orar e pesquisar para saber o que é explicar o texto bíblico e como fazê-lo,
cada sermão seu se torna um semeador de analfabetismo bíblico, por mais bem
apresentado, interessante, cheio de dados, citações e versos bíblicos que ele
esteja.
2.7 Reavivados pelo quê?
Temos em nossa igreja um
projeto cujo título consiste em uma redundância útil: “Reavivados por Sua
Palavra”. Assim como só podemos subir se for para cima, descer se for para
baixo ou entrar se for para dentro, só podemos ser reavivados se for por Sua
Palavra. Então, não gaste púlpito com o que não for a Palavra ou com o que não
for acessório para melhor explicá-la.
Veja os
reavivamentos bíblicos (2Cr 17.9; 2Cr 34.30-33; Ne 8). Note que não há
reavivamento que não comece pela Bíblia e não tenha como finalidade a Bíblia.
Por isso, “Deus terá sobre a Terra um povo que mantenha a Bíblia, e a Bíblia
só, como norma de todas as doutrinas e base de todas as reformas” (WHITE, E. O
Grande Conflito, p. 595).
Estude, recorra a obras de servos de Deus que
lhe ensinem a como fazer para respeitar o contexto de um texto. Ensine às
pessoas o significado correto das passagens. Ensine-as a deixarem de lado as
confortáveis psicologizações feitas a partir da Bíblia, as belas alegorizações
da Palavra às quais pastores e leigos tanto recorrem no púlpito.
As
necessidades urgentes que se fazem sentir nesta época, exige contínua educação
na Palavra de Deus. Isto é a verdade presente. Importa que haja em todo o mundo
uma reforma no estudo da Bíblia, pois ela é agora mais necessária que nunca
(WHITE, E. Conselhos sobre Educação, p. 117).
Não
espere reavivamento genuíno revitalizando cultos, músicas, vigílias, fazendo
aquele super acamp jovem ou aquele congresso inesquecível. Tudo isso tem seu
lugar, mas não passará de ilusão se não começarmos urgentemente a ensinar a
Palavra e proclamar Cristo a cada vez que a abrimos. Não apenas será ilusão,
mas até mesmo pecado, por procurar reavivamento por meios que Deus não proveu
(Rm 14.23; 10.17). Jesus foi categórico: “Se não ouvem a Moisés e aos profetas
[isto é, as Escrituras], tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite
alguém dentre os mortos” (Lc 16.31). De nada adiantarão programações
imperdíveis, nem mesmo que um morto ressuscite, a fim de despertar-nos enquanto
não priorizarmos as Escrituras. Por isso, “o pior tipo de ‘igreja’ é aquela que
aprendeu a ser bem sucedida sem a Bíblia” (Josemar Bessa), pois nos leva a
achar que tudo vai bem, quando não vai.
É
possível ver a todo tempo cristãos medindo a saúde de um grupo eclesiástico
pela quantidade de eventos que ele promove. Uma igreja com um bom coral,
ministério de louvor, que chama muitos pregadores e cantores famosos, que tem
muitos acampamentos, congressos, “louvorzões”, recitais, gincanas, encontros e
afins, só pode ser uma igreja abençoada, pensam alguns. Contudo, todos esses
eventos podem acontecer, ser muito bem organizados, animados ou comoventes,
ainda que Cristo desconheça por completo seus organizadores e participantes (Mt
7.21-23).
Durante
muito tempo, eu tive esse pensamento torto também e gostaria que alguém
houvesse me alertado acerca dele, mas “o despertador toca para todo mundo,
acorda quem quer”. O que falta agora para entendermos que tudo isso é
secundário? O que falta para entendermos que de nada adiantará revitalizarmos
culto, música, eventos se as Escrituras não forem o cerne?
Enquanto
medirmos igrejas pelos eventos e pela música; enquanto medirmos a música pela
modernidade ou tradicionalismo; enquanto medirmos o pregador por quão
desenvolto, carismático e "desenrolado" ele é, não veremos um
reavivamento genuíno, pois todo reavivamento genuíno tem como origem a Palavra
e como finalidade a Palavra.
Continue
indo atrás de música e eventos e tudo o que você conseguirá será pretensos
reavivamentos espasmódicos aqui e ali. Continue deixando que na sua igreja a
Bíblia seja um mero adereço no púlpito, sem qualquer preocupação com fidelidade
ao contexto do texto lido e tudo o que você estará fazendo ali é correr atrás
do vento.
Há
tanta alienação quanto à Bíblia que, se o pregador é bom orador, seja ele duro
ou carismático, sequer percebemos quando estamos sendo “enrolados” e a Bíblia
não está sendo ensinada. Se ele preencher o tempo supostamente “chamando o
pecado pelo nome”, contando historinhas de corrente de e-mail, frases de efeito
de Facebook, lendo textos de escritores famosos ou mesmo bíblicos, mas
aplicando-os ao que bem entender, então, crê-se, a Bíblia está sendo pregada.
Abra o olho, irmão! Em quê os sermões que você prega ou ouve tem ajudado a
abrir a Bíblia e compreender contextualmente o que se leu, como no tempo de
Esdras (Ne 8.7-12)? Não se deixe enganar!
Não
importa o quão emocionado ou motivado a fazer grandes e piedosas coisas o povo
esteja ao fim. Isso é superficial. Se a Bíblia não foi contextualmente
explicada, você fracassou em sua missão. Tais resultados jamais serão legítimos
se o percurso não o for.
Deus
pede um reavivamento e uma reforma. As palavras da Bíblia, e a Bíblia somente,
deviam ser ouvidas do púlpito. Mas a Bíblia tem sido roubada em seu poder [...]
Os ouvintes não podem dizer: 'Porventura, não nos ardia o coração, quando Ele,
pelo caminho, nos falava, quando nos expunha as Escrituras?' (Lc 24:32). Há
muitos que estão clamando pelo Deus vivo, ansiando pela divina presença.
Permitam que a Palavra de Deus lhes fale ao coração. Deixem que os que têm
ouvido apenas sobre tradição, teorias e máximas humanas ouçam a voz dAquele que
pode renovar o coração para a vida eterna (White, E. Profetas e Reis, p. 626).
2.8 A pergunta mais aterradora a ser feita à cristandade atual
Quer um
exemplo da grave negligência no ensino da Palavra? Arrisque uma pesquisa com
você e com os membros de sua igreja com perguntas como: O que a Bíblia diz
sobre o que é o Reino de Deus? Ou, o que ela diz sobre o Evangelho? E veja como
a maioria das pessoas – talvez até mesmo você – não sabe o que são essas
coisas, biblicamente; tampouco ensinou ou ouviu tais coisas claramente no
púlpito. Eu gostaria muito de aprender mais sobre esses temas. Logo, é pesarosa
a constatação de que, por vezes, não temos podido contar com o púlpito para nos
auxiliar nesse aprendizado.
Muitos
sabem versos de cor, curiosidades bíblicas, acertam perguntas no concurso
bíblico e acham que, por isso, conhecem as Escrituras. Porém, esse tipo de
coisa mede sua capacidade de memorização, não sua aptidão para assumir um
púlpito. As perguntas acima jazem à própria base do cristianismo, mas a
esmagadora maioria de nós não tem a menor noção sobre esses temas. Os usamos
meramente em frases de efeito.
Talvez
a pergunta mais aterradora a ser feita à cristandade atual seja: “Você poderia
dizer, biblicamente, o que é o Evangelho?”. Não sei a você, mas, a mim, tal
fato é extremamente perturbador. Foram noites insones quando me dei conta
disso. Como podemos saber se estamos pregando o Evangelho se sequer sabemos o
que é o Evangelho? Percebe a gravidade disso? Percebe como precisamos rever com
alarmante urgência nossa atitude como ocupantes e ouvintes do púlpito?
O
apóstolo Paulo exclamou: “Ai de mim se não pregar o Evangelho” (1Co 9.16).
Infelizmente, não temos demonstrado esse santo temor diante de tal
responsabilidade, visto que sequer nos demoramos acerca do que de fato o
Evangelho é.
2.9- Você está disposto a pagar o preço?
Diante
de tudo isso a conclusão é óbvia: nem todos, por melhores intenções que
possuam, podem subir ao púlpito (Tg 3.1). É necessário estar disposto a pagar o
alto preço do estudo e dedicação. Caso não esteja disposto a isso, não suba ao
púlpito, desonrando assim a Deus e a igreja ao privá-la das Escrituras. Por
favor, pelo bem da igreja e seu mesmo, leve a sério estas palavras.
Em
diferentes níveis, isso se dirige não só ao pregador, mas também a você que
precisa ensinar a Bíblia na Escola Sabatina, classe bíblica, evangelismo,
pequeno grupo, à sua casa, a si mesmo ou a quem quer que vá a você precisando
de Cristo na rua, trabalho, escola, vizinhança, ônibus, onde for. Este urgente
apelo é a você, cristão comum, que, como quem quer que nasça no reino de Deus,
nasce com a incumbência de ler, viver e pregar a Palavra. Creia: a Palavra é a
solução para a sua igreja, para a sua família, para a sua vida. Empenhe-se em
conhecer, praticar e alimentar o povo com a Palavra. Isso basta. Quando
falhamos nisso, falhamos em tudo o mais.
Vanedja Cândido Barbosa
IASD de Funcionários II, João Pessoa, Paraíba.
_______
[1] ARAGÃO. Pesquisa mostra as heresias mais comuns nas igrejas modernas. Gospel Prime, 29 out 2014.http://noticias.gospelprime.com.br/pesquisa-evangelicos-doutrinas-basicas/. Acesso em 29 out 2014.
Parte
1 - Explique o
texto. Pregue a Cristo
Parte
2 - Estamos
explicando o texto?
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