A autoridade de Paulo e o Evangelho – Gálatas 1 – por Matheus Cardoso

Gálatas 1: 1-24
– A afronta a autoridade de Paulo
– Defesa do Apóstolo
– A Graça e o Evangelho
– A Primeira Viagem de Paulo a Jerusalém
– Reconhecimento de Paulo na igreja

Prefácio e saudação:

1 Paulo, apóstolo – não da parte de pessoas, nem por meio de homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que O ressuscitou dos mortos –, 2 e todos os irmãos que estão comigo, às igrejas da Galácia.

3 Que a graça e a paz estejam com vocês, da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo, 4 o qual entregou a Si mesmo pelos nossos pecados, para nos livrar deste mundo perverso, segundo a vontade de nosso Deus e Pai, 5 a quem seja a glória para todo o sempre. Amém!

1:1-10 Introdução. Em todas as suas cartas, Paulo começa com uma seção introdutória, que normalmente inclui uma saudação inicial e uma oração expressando gratidão a Deus pelo que Ele estava fazendo na vida dos leitores. Essas introduções contêm pistas de quais são as preocupações de Paulo naquela carta. Esse é também o caso de Gálatas, o que indica que devemos prestar bastante atenção a esses primeiros versículos.

1:1-5 Saudação. As cartas antigas, inclusive as de Paulo, geralmente iniciavam com uma saudação que apresentava o nome do autor (remetente), o nome daqueles a quem ele estava escrevendo (destinatários) e uma expressão de bons votos. As cartas de Paulo seguiam este padrão: “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo pela vontade de Deus, à igreja de (cidade): A vocês, graça e paz da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo.”

À primeira vista, encontramos em Gálatas somente mais um exemplo das saudações comuns de Paulo, embora com alguns acréscimos ou variações. Uma olhada mais atenta, no entanto, deixa claro que essa abertura é bem incomum e
revela os principais temas e as preocupações de Paulo em Gálatas. Duas características se destacam: (1) a forte ênfase no fato de que o seu ministério apostólico teve origem em Deus (Gl 1:1) e (2) a ausência de ação de graças, oração ou louvor, tudo isso substituído por uma forte repreensão (Gl 1:6-10).

Como os oponentes de Paulo questionavam sua integridade e autoridade como apóstolo, ele inicia a carta apresentando uma vigorosa defesa de seu apostolado. Assim como em outras cartas de Paulo, essa saudação menciona “graça e paz”, mas não encontramos agradecimentos ou louvor a Deus, nem referência à fé ou amor dos gálatas. Além disso, eles estavam questionando o próprio conteúdo do evangelho que Paulo anunciava. Na opinião dessas pessoas, ele estava pregando uma mensagem peculiar que contradizia o ensino dos demais cristãos, especialmente da igreja em Jerusalém.

1:1 Paulo, apóstolo. Paulo inicia a carta deixando claro que sua autoridade foi comissionada pelo próprio Deus, que lhe confiou a sagrada missão de anunciar o evangelho. Apóstolo significa, literalmente, “aquele que é enviado”. É alguém encarregado de uma missão, levando a autoridade do remetente. A mesma palavra é traduzida como “enviado” (Jo 13:16) e “mensageiro” (2Co 8:23; Fp 2:25). O próprio Jesus é referido como um “apóstolo”, ou seja, alguém enviado em missão por Deus (Hb 3:1).

A literatura judaica da época de Paulo menciona emissários (em hebraico, shaliah), pessoas que eram enviadas pelos líderes religiosos de Jerusalém para cumprir alguma missão no interior da Judeia ou no exterior (a Diáspora). Paulo, que antes era um shaliah, um apóstolo do judaísmo, agora era um apóstolo de Jesus Cristo e das boas-novas. Antes ele levava terror e destruição àqueles a quem considerava inimigos da fé judaica. Depois, como apóstolo de Jesus, passou a levar perdão e libertação a todos os povos. Embora Paulo estivesse preocupado com a salvação de seu próprio povo (judeu), a sua missão apostólica especial era “aos gentios” (Rm 11:13; veja Gl 2:7; At 22:21; Rm 1:5; 15:16).
não da parte de pessoas, nem por meio de homem algum. Assim como em Gálatas 1:11-12, 16-29, Paulo destaca que ele recebeu a mensagem do evangelho diretamente do Senhor, e não de segunda mão, através de algum ser humano. Ao contrário do que geralmente acontecia, ele não havia sido comissionado por uma congregação (2Co 8:23; Fp 2:25) ou mesmo por profetas (1Tm 1:18; 4:14), mas pelo próprio Jesus Cristo e por Deus Pai. Entre outros apóstolos com autoridade, Deus designou Paulo para estabelecer a fundação da igreja (1Co 3:10; 9:1; Ef 2:20; 3:3-5).

1:2 todos os irmãos que estão comigo. Paulo não trabalhava sozinho, como seus adversários sugeriam, mas em comunhão com a igreja. Às vezes Paulo menciona outra pessoa como remetentes da carta, junto com ele (1Co 1:1; 2Co
1:1), mas a expressão “todos os irmãos” aparece unicamente em Gálatas, acrescentando peso à carta. Em outras palavras, Paulo está acompanhado de um grupo de cristãos, que concordam com o evangelho que ele proclama. Portanto, não se tratava de alguma opinião pessoal que ele mantinha. Além disso, eles compartilham igualmente das preocupações que o apóstolo expressa na carta.

1:3 Que a graça e a paz estejam com vocês. Nas cartas greco-romanas, a saudação costumava ser acompanhada de votos de bem-estar e introduzindo o tema principal. No caso de Gálatas, esse tema era o evangelho. Todas as cartas de
Paulo começam com uma referência a essas duas bênçãos de Deus: Sua graça e Sua paz. “Graça” era uma saudação bastante comum entre os gregos, enquanto “paz” era a saudação tradicional dos judeus (em hebraico, shalom). Paulo usa essa combinação em várias de suas cartas (Rm 1:7; 1Co 1:3; 2Co 1:2; 1Ts 1:1). Até mesmo na saudação o apóstolo procurava mostrar que judeus e gentios são iguais em Cristo e constituem igualmente o Seu povo (Gl 3:28).

“Graça e paz” não eram apenas termos formais, mas, na verdade, resumem a mensagem da salvação pregada por Paulo. “A natureza da salvação é paz, ou reconciliação: paz com Deus, paz com os homens, paz interior. A fonte da salvação é a graça, o favor livre de Deus, independente de qualquer mérito ou obras humanas, Sua benevolência para com os que não merecem. E esta graça e paz fluem tanto do Pai quanto do Filho.”1 (John R. W. Stott, A Mensagem de Gálatas: Somente um caminho (São Paulo: ABU, 1989), p.18.

Os gálatas precisam aprender que devem a salvação exclusivamente à graça de Deus e que devem viver pela Sua graça (Gl 1:6). A graça de Deus é o Seu favor não merecido, o Seu presente gratuito de salvação, que será uma grande ênfase de toda a carta. Ela se refere a tudo o que Deus nos deu em Cristo, sem que fizéssemos algo por merecer e sem condições de retribuir. A paz de Deus é a plenitude da Sua bênção, o completo bem-estar espiritual que só pode ser encontrado em Jesus. Ela se refere ao nosso relacionamento com o Pai, que Cristo garantiu por Sua morte e ressurreição. “Portanto, uma vez que pela fé fomos declarados justos, temos paz com Deus por causa daquilo que Jesus Cristo, nosso Senhor, fez por nós” (Rm 5:1, NVT).

Até mesmo a saudação típica de Paulo buscava corrigir os equívocos dos judaizantes. Se a salvação é pelas obras, como eles afirmavam, então não é pela “graça” e não pode resultar em “paz”, visto que ninguém é capaz de produzir boas obras o suficiente para garantir a segurança eterna.

Deus, nosso Pai, e [o] Senhor Jesus Cristo são a fonte da bênção divina. Como acontece com frequência nas cartas escritos de Paulo, “Deus” indica que o Pai é Deus, enquanto “Senhor” significa que o Filho é Deus (1Co 8:6).

1:4 entregou a si mesmo. A morte de Cristo foi um autosacrifício voluntário. Esse sacrifício está no centro da mensagem do Novo Testamento (Mt 26:28; Rm 4:25; 5:8, 15-19; 8:3; 2Co 5:21; Gl 1:4; 2:20; Tt 2:14; 1Pe 2:24). A obra que Jesus realizou na cruz está na linha de frente dos interesses de Paulo e, por isso, aparece desde o início da carta.

pelos nossos pecados. Precisamos de Cristo para nos resgatar porque pecamos – tanto os “pecados deliberados” e evidentes (Sl 19:13) quanto aqueles nos quais dificilmente pensamos como pecados (Sl 19:12; Mt 5:22, 28; Lc 10:30-32). Todos os pecados refletem nossa falha em amar a Deus e ao próximo como deveríamos. Não podemos nos libertar do pecado pelo esforço humano ou pela obediência à lei (Rm 3:20). A única maneira é ser perdoado pela graça de Deus, o que Jesus realizou por meio de Sua morte na cruz (Gl 3:13; 2Co 5:19-21).

para nos livrar deste mundo perverso. A Nova Versão Internacional traduz muito bem essa expressão como “a presente era perversa”. Essas palavras, no entanto, não se referem ao planeta Terra em si mesmo (“este mundo”) nem a um período de tempo (“presente era”). Em vez disso, se trata de uma realidade: o sistema atual do mundo ou desta era dominado pelo pecado e por Satanás, em rebelião contra a vontade de Deus (Rm 12:2; 1Jo 2:15-16; 5:19).

O mundo e tudo o que nele existe pertencem a Deus (Sl 24:1), e o Seu governo é universal e eterno (Sl 103:19; 145:13). Mas a época atual é “má”, visto que o governo de Deus não é amplamente reconhecido; em vez disso, as pessoas (conscientemente ou não) prestam lealdade ao mal e ao pecado (2Co 4:4). A “presente era perversa” (NVI) é o estado deste mundo, e daqueles que estão sem Cristo, até o Seu retorno.

Os judeus da época de Jesus e dos apóstolos acreditavam que a “presente era perversa” seria substituída pela “era por vir”, quando o Messias reinaria e prevaleceria a justiça de Deus. Mas, de acordo com Paulo, a morte e ressurreição de Jesus já deram início a essa transformação, que vai se concretizar plenamente em Sua volta (Gl 6:14-15; Rm 12:2; 1Co 7:31; 10:11). Numa espécie de novo êxodo não é Moisés quem nos liberta, mas Jesus Cristo. Não um só povo (Israel), mas todos os povos (Gl 3:28). E não do Egito, mas “deste mundo perverso”, dominado pelo mal. Quem crê em Jesus já é uma “nova criatura” (Gl 6:15) e até mesmo uma “nova criação” (2Co 5:17, NVI) – parte da nova realidade que Jesus trouxe em Sua vida e morte. Eles foram resgatados do “poder das trevas” e transportados para o “para o Reino do Seu Filho amado” (Cl 1:13).

O resumo do evangelho apresentado em Gálatas 1:4-5 é a base para a repreensão que vem a seguir (Gl 1:6-10) e para a mensagem de toda a carta: se Jesus nos resgatou completamente de nossos pecados, não há como nos esforçarmos para receber a salvação por nossos méritos e obras. Por isso, “este mundo perverso” ou “a presente era perversa”, em Gálatas, também estão ligados à tradição legalista e pecaminosa de muitos judeus.

Paulo chama a atenção para o fato de que Cristo veio nos libertar deste era e do seu legalismo. Como ficará mais claro depois, caso os gálatas se desviassem do verdadeiro evangelho para o legalismo, eles estariam nada mais do que voltando a “este mundo perverso” ou à “presente era perversa”. Estariam debaixo do poder do pecado e da condenação da lei, em vem de aceitar a gloriosa dádiva da salvação de Deus.

Paulo termina a saudação dizendo: a quem seja a glória para todo o sempre. Amém! Essa não é simplesmente uma expressão formal, mas revela a preocupação de Paulo em defender e preservar uma verdade central das Escrituras: Deus escolheu Israel e a igreja para a glória do Seu nome, redimiu o Seu povo para Seu louvor e glória e chama os majestade no mundo. Toda a glória deve ser dada somente a Deus, pois a salvação é obra Dele somente.

Essa é a única carta de Paulo cuja saudação se encerra com uma declaração de louvor a Deus. Aqueles que estavam tentando enganar os cristãos da Galácia tinham motivações puramente egocêntricas: eles queriam “causar boa impressão para outros, a fim de não serem perseguidos” (Gl 6:12, NVT). Paulo, por outro lado, começa e termina a sua carta declarando o seu desejo de que toda a glória deveria ser dada unicamente ao Senhor (Gl 6:14).

Em resumo, podemos dizer que, na introdução de Gálatas (Gl 1:1-15), Paulo apresenta assuntos essenciais que serão desenvolvidos na carta:

  1. Paulo se tornou apóstolo porque foi escolhido por Deus, e não por algum ser humano (verso 1).
  2. O evangelho não era apenas uma compreensão de Paulo, mas de “todos os irmãos” (verso 2).
  3. A salvação se tornou uma realidade através da morte e ressurreição de Cristo, que nos liberta “desta presente era perversa” (versos 1, 4, NVI).
  4. Deus é nosso Pai, e, portanto, somos Seus filhos – existe uma unidade entre judeus e gentios (versos 2-4).
  5. O evangelho pregado por Paulo glorifica a Deus (verso 5).

O que é o evangelho?

Timothy Keller mostra que os primeiros versículos de Gálatas (Gl 1:1-5) apresentam um resumo bastante claro e objetivo do que é a mensagem do evangelho.

“Quem somos: impotentes e perdidos. É o que sugere a palavra „livrar‟ no versículo 4. Outros fundadores de religiões vieram ensinar, não livrar. […]

Imagine que você veja uma mulher se afogando. Não será de nenhuma ajuda lhe atirar um manual de natação. Você não lhe lança um ensinamento – você lhe joga uma corda. E Jesus é mais libertador do que mestre – porque é disso que mais necessitamos. Nada do que somos ou fazemos nos salva. […]

O que Jesus fez: como Jesus nos liberta? Ele „se entregou a si mesmo pelos nossos pecados‟ (v. 4a).Temos um sacrifício substitutivo por natureza. A palavra „pelos‟ significa „em benefício de‟ ou „no lugar de‟. A substituição é o motivo de o evangelho ser tão revolucionário. A morte de Cristo não foi apenas um sacrifício geral, mas substitutivo. Ele não nos comprou apenas uma „segunda chance‟, dando-nos nova oportunidade de endireitar a vida e agir certo com Deus. Ele fez tudo que precisávamos fazer, mas não conseguimos. […]

O que o Pai fez: Deus aceitou a obra de Cristo em nosso benefício ressuscitando-o „dentre os mortos‟ (v. 1) e dando-nos a „graça […] e paz‟ (v. 3) que Cristo conquistou e alcançou por nós.

Por que Deus o fez: tudo isso foi feito por graça – não por algo que tenhamos feito, mas „segundo a vontade de nosso Deus e Pai‟ (v. 4d). Não pedimos socorro, mas Deus, em sua graça, planejou o que não tínhamos percebido que necessitávamos, e Cristo, por sua graça (v. 6), veio realizar a libertação que jamais alcançaríamos por nós mesmos. Não há nenhum indicativo de qualquer outra motivação ou causa para a missão de Cristo, exceto a vontade de Deus. Não há nada em nós que a mereça. A salvação é pura graça.”2 (Timothy Keller, Gálatas Para Você, Série A Palavra de Deus para Você (São Paulo: Vida Nova, 2015), p. 16-17)

Não há outro evangelho

Estou muito surpreso em ver que vocês estão passando tão depressa daquele que os chamou na graça de Cristo para outro evangelho, 7 o qual, na verdade, não é outro. Porém, há alguns que estão perturbando vocês e querem perverter o evangelho de Cristo. 8 Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu pregue a vocês um evangelho diferente daquele que temos pregado, que esse seja anátema. 9 Como já dissemos, e agora repito, se alguém está pregando a vocês um evangelho diferente daquele que já receberam, que esse seja anátema. 10 Por acaso eu procuro, agora, o favor das pessoas ou o favor de Deus? Ou procuro agradar pessoas? Se ainda estivesse procurando agradar pessoas, eu não seria servo de Cristo.

1:6-10 Nenhum outro evangelho. Na maioria de suas cartas, depois da saudação inicial, Paulo continua orando pelos leitores ou louvando a agradecendo a Deus pelo que Ele tem feito nas igrejas (veja, por exemplo, Rm 1:8-10; 1Co1:4-5; Fp 1:3-6; Cl 1:3-5; 2Ts 1:2-13). A Carta aos Gálatas é a única em que não existe oração, nem louvor, nem ação de graças nem elogios. Em vez disso, o apóstolo vai direto ao ponto, revelando espanto ao perceber como os gálatas tinham abandonado o verdadeiro evangelho e estavam sendo levados por uma mensagem corrompida.

Paulo identificou imediatamente o problema que afligia os gálatas: eles haviam começado a seguir falsos mestres que ensinavam um falso evangelho. Eles se apresentavam como cristão, mas o evangelho deles era um “evangelho diferente” (Gl 1:6) – que, na verdade, era uma completa distorção da mensagem de Cristo.

O evangelho de Paulo – que ele havia pregado aos gálatas e em todos os lugares – era o “evangelho da graça de Deus” (At 20:24). Ele proclamava que “ninguém será declarado justo diante de Deus por fazer o que a lei ordena” (Rm 3:20, NVT) e que “vocês são salvos pela graça, por meio da fé, e isto não vem de vocês, é dom de Deus; não por obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2:8-9, NVI).

1:6 Estou muito surpreso. Sem se deter (como em outras cartas) em dar graças a Deus pela fé daqueles a quem escreve, Paulo expressa imediatamente suas preocupações. vocês estão passando tão depressa. O tempo que se passou entre a pregação aos gálatas e o desvio atual era surpreendentemente pequeno. As expressões abandonando […] aquele que os chamou e seguirem outro evangelho (NVI) mostram que não se tratavam de questões periféricas sobre as quais os cristãos podem ter opiniões diferentes. Os gálatas estavam questionando e distorcendo o próprio evangelho, e a reação de Paulo é um modelo de como agir quando estão em jogo verdades centrais do evangelho.

O apóstolo não poupou palavras. O termo “abandonando” era muitas vezes usado para descrever soldados que traíam a fidelidade ao país, abandonando o exército. Paulo estava dizendo que os gálatas eram desertores que estavam virando as costas para Deus. aquele que os chamou. A graça nos alcança por iniciativa e chamado de Deus, não por causa de qualquer coisa que tenhamos eito para merecê-la (Gl 1:15; Rm 4:4-8; 8:30; 9:11-13). Deus usa a proclamação (humana) do evangelho para “chamar” os ouvintes a si mesmo (2Co 5:19-20; 2Ts 2:14). Aqueles que ouvem o evangelho corretamente não o recebem como palavras de um ser humano, mas como a palavra de Deus (1Ts 2:13).

Em 2 Coríntios 11:4, Paulo expressa uma preocupação notavelmente semelhante à que ele apresenta em Gálatas: “Pois, se vem alguém que prega outro Jesus, diferente daquele que nós pregamos, ou se vocês aceitam um espírito diferente daquele [Espírito] que já receberam ou um evangelho diferente do que já aceitaram, vocês toleram isso muito bem.” Em ambas as cartas, o que estava em jogo era um falso Jesus, um falso Espírito Santo e um falso evangelho. E tanto os gálatas quanto os coríntios os estavam aceitando facilmente! os chamou na graça de Cristo. Viver na graça é experimentar o favor de Deus, mesmo não o merecendo (Rm 5:2). Esse favor está necessariamente ligado a Cristo, mediador entre Deus e a humanidade (1Tm 2:5). Portanto, desligar-se de Cristo é desligar-se da graça (Gl 5:4). Ao rejeitarem as boas-novas que Paulo havia proclamado e confiarem em sua obediência à lei como meio de serem salvos, os gálatas estavam se afastando de Deus. Afinal, Ele os havia chamado e salvo por meio da graça de Cristo (Gl 1:6), e não por meio da obediência à lei (Gl 2:16).

1:7 há alguns que estão perturbando. Alguns cristãos judeus de Jerusalém insistiam que os gentios deveriam não apenas crer em Jesus para serem salvos, mas também serem circuncidados. Eles estavam dizendo: “Se vocês não forem
circuncidados segundo o costume de Moisés, não podem ser salvos” (At 15:1). Com isso, as pessoas estariam assumindo o compromisso de observar toda a lei do Antigo Testamento e as tradições judaicas como o caminho para a salvação (Gl 2:3-5, 12; 4:17; 6:12-13).

Em outras palavras, os oponentes de Paulo estavam dizendo: “Nós também fomos treinados no Q. G. de Jerusalém. E sabemos que Paulo não lhes contou a história inteira. Existem outras coisas que vocês devem fazer a fim de agradar a Deus.” 3 [3. Keller, Gálatas para você] Eles não estavam negando que era preciso crer em Jesus e em Seu sacrifício para se obter a salvação, mas diziam que era necessário fazer outras coisas para ser aceito e perdoado por Deus. Em outras palavras, “nós mesmos teríamos que completar, através de nossa obediência à lei, o que Cristo havia começado. Era preciso acrescentar nossas obras à obra de Cristo. Era preciso concluir a obra inacabada de Cristo”.4 [4-Stott, A Mensagem de Gálatas, p. 23.]

“Assim, as duas características principais dos falsos mestres eram que eles estavam perturbando a igreja e alterando evangelho. Estas duas coisas andam juntas. Falsificar o evangelho resulta sempre em perturbação para a igreja. Não se
pode mexer no evangelho e deixar a igreja intacta, pois esta é criada pelo evangelho e vive por ele. Na verdade, os maiores perturbadores da igreja (agora e naquele tempo) não são os que se lhe opõem de fora, que a ridicularizam e a perseguem, mas aqueles que dentro dela tentam alterar o evangelho.” Por outro lado, “a melhor forma de servir a igreja é crer no evangelho e pregá-lo”.5[5 Ibid., p. 24.]

1:8 que esse seja anátema. A palavra grega “anátema” significa “condenado eternamente”; nesse caso, também “separado de Cristo”. Esse termo era muitas vezes usado para traduzir o hebraico herem, que no Antigo Testamento designa algo dedicado a Deus para ser totalmente destruído (Lv 27:28-29; Rm 9:3; 1Co 12:3; 16:22). Nessa parte de suas cartas, Paulo geralmente apresentava agradecimentos a Deus pela fé e pelo comportamento da igreja à qual ele estava se dirigindo. Mas aqui, ao contrário, essas ações de graças são substituídas pela ameaça de maldição. A razão disso é bastante clara e séria: o evangelho – a mensagem da salvação por meio de Cristo – é imutável.

Nem sequer o próprio Paulo, ou mesmo um anjo vindo do céu, estavam autorizados a fazer qualquer alteração na mensagem do evangelho (Gl 2:6-10, 11-14). Ainda que um anjo revelasse outro ensino, esse evangelho angélico seria falso! Nem mesmo um apóstolo poderia mudar a mensagem de Cristo ou acrescentar algo a ela. Essas advertências deixam claro que o interesse de Paulo não era preservar a sua própria popularidade, mas ser fiel à verdade do evangelho. Afinal, até mesmo ele deveria ser rejeitado pelos gálatas!

“Paulo está dizendo, no versículo 8, que até sua autoridade apostólica deriva da autoridade do evangelho, não o contrário. Ele diz aos gálatas para avaliarem e julgarem tanto seu apostolado quanto seu ensino à luz do evangelho bíblico. A Bíblia julga a igreja; a igreja não julga a Bíblia. A Bíblia é que cria e fundamenta a igreja; a igreja não cria nem fundamenta a Bíblia. A igreja e sua hierarquia devem ser avaliadas pelo crente à luz do evangelho bíblico, considerando-o o padrão ou prumo para julgar todas as afirmações de verdade.” 6 [6 Keller, Gálatas Para Você, p. 23.]

1:10 procuro agradar pessoas? Por que Paulo não exigia que os conversos gentios fossem circuncidados? De acordo com os seus oponentes, era porque ele queria conversões a qualquer custo. Afinal, os gregos e romanos viam a prática da circuncisão como repulsiva e bárbara. Agradar o auditório era uma prática comum entre os oradores gregos e romanos (era chamada, em latim, captatio benevolentiae). Paulo renuncia a isso e apresenta dois objetivos totalmente incompatíveis: agradar as pessoas ou agradar a Deus. É impossível combinar as duas coisas.

O tom e o conteúdo da carta deixam claro que conquistar o favor das pessoas e agradar pessoas não era o objetivo de Paulo. Os falsos mestres o acusavam de tentar agradar os outros, pregando uma “graça barata”, um evangelho supostamente fácil, porque ele dizia que somos salvos unicamente pela graça e pela fé – e não também pela obediência à lei, o que, segundo eles, era o evangelho completo.

Ser um servo de Cristo, no entanto, exige fidelidade irrestrita a Ele, não importando como as pessoas reagem (At 5:29; Ef 6:5-6; 1Ts 2:3-6). A atitude de Paulo estava em harmonia com a dos antigos profetas de Israel, como Micaías (1Rs 22:7-9), Isaías (Is 30:10), Jeremias (Jr 15:19) e Miqueias (Mq 3:8).

Em Gálatas 1:10, Paulo nos adverte “a respeito do perigo de tentar agradar as pessoas em vez de agradar a Deus. Que escravidão vivemos quando esperamos pela opinião positiva de outros! […] Temer seres humanos pode ser fatal. A razão pela qual muitos não creram em Jesus foi o fato de que ansiavam a glória e louvor das pessoas mais do que a aprovação de Deus [veja Jo 5:43, 44; 9:22; 12:42, 43] […].

“Talvez nosso temor seja contar a algum colega de trabalho o que significa ser cristão. Ou talvez seja compartilhar nossas lutas e dificuldades com outros cristãos porque poderão pensar mal de nós. […] O que nos livra desse temor? A
promessa de que Deus nos dará tudo o que precisamos e não recusa nenhum bem àqueles que O temem (Sl 34:9; 84:11).”7 [7 Thomas Schreiner, Galatians Zondervan Exegetical Commentary on the New Testament (Grand Rapids: Zondervan, 2010), p. 91.]

“O evangelho afasta o espírito de „agradar o homem‟ – o impulso para conquistar a aprovação dos homens. Ele substitui esse espírito por seu oposto – a ausência da necessidade de conquistar ou buscar a aprovação humana para o que se faz. Em outras palavras, o evangelho produz seguidores de Jesus confiantes e destemidos, que praticam o que é certo sem se preocuparem com a aprovação e a opinião favorável alheia. […]

“Mas, afinal, como o evangelho destrói a necessidade de agradar o homem – o „temor ao homem‟? Libertando-nos e motivando-nos para buscarmos „o favor de Deus‟ (v. 10). No evangelho, descobrimos que confiar em Cristo produz o favor e a aprovação totais e plenos de Deus. Ao olhar para o cristão, Deus enxerga Jesus (Gl 3:25-27) – e nos diz: „Em ti me agrado‟ (Mc 1:11). Deus se agrada de nós.” 8 [8 Keller, Gálatas Para Você, p. 34, 36.]

Ao lermos essas palavras bastante fortes e incisivas de Paulo, é natural perguntar: Por que essa reação tão drástica e uma linguagem tão pesada? Será que não estamos lidando com alguém desequilibrado ou que não conhecia outra forma de expressão? Será que Paulo estava expressando o verdadeiro amor e compaixão de Cristo?

Em primeiro lugar, temos que perceber que era a glória de Deus que estava em jogo. Essa era a única preocupação de Paulo. Se as nossas obras são uma forma de melhorar o que Cristo fez, se elas ajudam a conquistar o perdão e a aprovação de Deus, então a obra de Cristo foi imperfeita e insatisfatória. “Se a obediência à lei nos tornasse justos diante de Deus, não haveria necessidade alguma de Cristo morrer” (Gl 2:21, NVT).

Em segundo lugar, estava em jogo o bem estar presente e eterno de pessoas por quem Jesus morreu. Paulo não estava tratando de detalhes triviais, meras questões de diferença de opinião, mas da própria essência da mensagem do
cristianismo. O apóstolo sabia que o evangelho de Cristo é o único “poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê” (Rm 1:16). Portanto, distorcer ou corromper o evangelho significava destruir o caminho da salvação e impedir a libertação de inúmeras pessoas que poderiam ser salvas através dele. Paulo se importava profundamente com a salvação das pessoas – até mesmo daquelas que o odiavam e perseguiam. Em Romanos 9:3, ele diz que preferiria ser ele próprio amaldiçoado (anátema) se com isso outras pessoas pudessem ser salvas. 9 [9 Adaptado de Stott, A Mensagem de Gálatas, p. 26-27.]

O fato é que Paulo não poderia ter encontrado palavras mais fortes. O erro que estava arrastando os cristãos na Galácia era tão perigoso que a glória de Deus e a salvação de pessoas amadas estavam sendo atacadas. Para o apóstolo, não havia nada mais central do que a mensagem do evangelho, de salvação pela graça somente. Longe de ser intolerante e agressivo, o tom enérgico de Paulo demonstrava amor e preocupação por seus filhos na fé.

Como Paulo se tornou apóstolo

11 Mas informo a vocês, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é mensagem humana, 12 porque eu não o recebi de ser humano algum, nem me foi ensinado, mas eu o recebi mediante revelação de Jesus Cristo.

13 Porque vocês ouviram qual foi, no passado, o meu modo de agir no judaísmo, como, de forma violenta, eu perseguia a igreja de Deus e procurava destruí-la. 14 E, na minha nação, quanto ao judaísmo, levava vantagem sobre
muitos da minha idade, sendo extremamente zeloso das tradições dos meus pais.

15 Mas, quando Deus, que me separou antes de eu nascer e me chamou pela sua graça, achou por bem 16 revelar seu Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios, não fui imediatamente consultar outras pessoas, 17 nem fui a Jerusalém para me encontrar com os que já eram apóstolos antes de mim, mas fui para as regiões da Arábia e voltei, outra vez, para Damasco.

18 Passados três anos, fui a Jerusalém para me encontrar com Cefas e fiquei quinze dias com ele. 19 E não vi outro dos apóstolos, a não ser Tiago, o irmão do Senhor. 20 Ora, a respeito do que estou escrevendo a vocês, afirmo diante de Deus que não estou mentindo.

21 Depois, fui para as regiões da Síria e da Cilícia. 22 E eu não era conhecido pessoalmente pelas igrejas da Judeia, que estão em Cristo. 23 Ouviam somente dizer: “Aquele que antes nos perseguia, agora prega a fé que no passado procurava destruir.” 24 E glorificavam a Deus a meu respeito.

A argumentação de Paulo em Gálatas 1:11-24 pode parecer longa e complexa, mas, em realidade, é fácil de ser compreendida. Com base na defesa do apóstolo, podemos concluir que as acusações lançadas contra ele eram as seguintes: (1) tudo o que Paulo sabia sobre o evangelho, ele aprendeu com outros líderes da igreja e (2) ele distorceu o que lhe foi ensinado. Em Gálatas 1:11-24, o apóstolo responde à primeira acusação. No capítulo 2:1-10, ele responde à segunda acusação.

A ideia básica de Gálatas 1:11-24 é a seguinte: “O evangelho por mim anunciado não é mensagem humana, porque eu não o recebi de ser humano algum, nem me foi ensinado, mas eu o recebi mediante revelação de Jesus Cristo” (Gl 1:11-12). Para defender essa ideia, Paulo argumenta que:

  1. Não havia razão para que ele abandonasse o judaísmo tradicional e aceitasse Jesus (v. 13-14). Ele não tinha a menor dúvida sobre suas crenças e comportamento (v. 14). Além disso, combatia o cristianismo com todas as forças (v. 13).
  2. Portanto, a única explicação lógica para a mudança tão radical seria uma intervenção divina (v. 15-16). Apenas Deus poderia convencê-lo a aceitar ideias tão diferentes e amar o que antes odiava.
  3. Depois de sua conversão, Paulo teve um contato muito limitado com os
    apóstolos (v. 18-24). Isso mostra que ele não teve tempo de aprender com eles o significado do evangelho. Foi três anos depois de sua conversão que ele se encontrou com Pedro e Tiago e, mesmo assim, por apenas 15 dias (v. 18-19). Além disso, as igrejas da Judeia, onde os apóstolos trabalhavam, nem sequer o conheciam (v. 21-24). Não havia a menor possibilidade de que Paulo tivesse “copiado” dos apóstolos o evangelho, para depois distorcê-lo (Gl 2:1-10). A
    única explicação é que o próprio Cristo lhe revelou o evangelho (v. 12).

1:11–2:21 A origem e defesa do evangelho de Paulo. Paulo argumenta que recebeu o evangelho diretamente de Jesus Cristo na estrada de Damasco, e não de Pedro ou de qualquer outra autoridade humana. Apesar isso, sua mensagem foi plenamente aceita e validada pelos apóstolos de Jerusalém, que eram considerados “colunas” da igreja (Gl 2:9). A autoridade do evangelho pregado por Paulo fica evidente em sua repreensão a Pedro, quando este falhou em viver segundo o evangelho (Gl 2:11-21).

1:11-24 Paulo chamado por Deus. Paulo explica que havia recebido o seu ministério apostólico e a mensagem do evangelho diretamente de Jesus Cristo. Mesmo depois dessa revelação, o contato de Paulo com outros apóstolos era muito limitado para que tivesse recebido sua mensagem deles. As palavras de Paulo mostram que ele não estava simplesmente se defendendo por causa de ressentimento ou orgulho ferido, mas, acima de tudo, tinha uma grande preocupação pastoral. Ele queria garantir aos cristãos da Galácia que o evangelho que eles tinham recebido era o verdadeiro, e não uma mensagem falsa entregue por um mensageiro desonesto.

1:11 O evangelho por mim anunciado é de que as pessoas são declaradas justas diante de Deus por Sua graça, recebida pela fé, e não por meio da obediência à lei (Gl 2:16-17; Rm 10:9-13; Ef 2:8-9). Paulo se defende da acusação de seus adversários, de que havia se rebelado contra os apóstolos de Jerusalém.

1:12 eu não o recebi de ser humano algum, nem me foi ensinado. Os oponentes de Paulo argumentavam que ele havia sido nomeado evangelista pelos outros apóstolos e recebido deles a sua mensagem, mas que, depois, alterou essa mensagem. Paulo responde que ele havia recebido o evangelho da salvação mediante revelação de Jesus Cristo na estrada de Damasco (veja At 9:1-19; 22:3- 21; 26:12-23). Naturalmente, ele aprendeu de outras pessoas detalhes a respeito do ensino cristão, como, por exemplo, episódios da vida de Jesus (Gl 1:18; 1Co 11:23-28; 15:3-11). Essas informações, porém, apenas confirmaram o que o próprio Cristo havia revelado ao apóstolo.

1:13 o meu modo de agir no judaísmo. Para mostrar que sua mensagem não tinha origem humana, Paulo descreve como ele era antes do encontro com Cristo: ele havia sido um judeu exemplar, fariseu e seguidor das tradições judaicas (veja At 8:1-3; 22:1-5; 26:4-8; Fp 3:4-7).

A devoção pré-conversão de Paulo ao judaísmo mostra que Deus transformou sua vida. Mas, uma vez que os gálatas estão, de fato, sendo tentados a abraçar o judaísmo, o apóstolo mostra que ele conhece bem esse estilo de vida, mas o abandonou para servir a Cristo. Isso ajudaria os seus leitores a resistir a essa tentação. Ao mencionar o judaísmo, Paulo não está negando o fato de que é israelita (Rm 11:1), mas rompendo com o erro judaico de buscar a justiça “por obras” – isto, é tentar ser aceito por Deus com base na obediência (Rm 9:30–10:4).

Paulo estava expressando, ao mesmo tempo, a vergonha de ter perseguido a igreja de Deus. A perseguição que Paulo fazia à igreja antes de seu chamado era bastante conhecida entre os primeiros cristãos (At 7:58; 8:3; 9:1-2). O próprio apóstolo se envergonhava profundamente de seu passado (1Co 15:9), mas considerava a sua história como uma evidência de que a graça de Deus pode salvar e transformador até os pecadores mais rebeldes (At 22:4-5; 26:9-11; 1Co 15:10; Fp 3:6-8; 1Tm 1:13-16).

1:14 extremamente zeloso. Paulo gostava de mostrar a ser oponentes que ser judeu, mesmo um judeu dedicado e zeloso, não era suficiente para ser salvo. O apóstolo considerava a sua própria experiência como prova de que o zelo pela lei não pode salvar (Rm 9:30-10:4; 2Co 11:22; Fp 3:4-6).

tradições dos meus pais. Os ensinos dos rabinos eram o fundamento da vida judaica na época de Jesus e dos apóstolos, especialmente para os fariseus. Eles eram bem conhecidos por exigirem a obediência a leis que não eram prescritas nas Escrituras (Mt 15:1-9; Mc 7:6-13). O historiador judeu Flávio Josefo (37-100 d.C.), que viveu na época dos apóstolos, escreveu: “Os fariseus entregaram ao povo certas observâncias por sucessão de seus pais, que não estão escritas nas leis de Moisés” (Antiguidades Judaicas 13.10.6)

O próprio Paulo havia sido fariseu (Fp 3:5). Ele era altamente respeitado entre os judeus e teve como mentor o rabi Gamaliel (At 22:3), o mais importante mestre de sua época. “Esta era a condição de Saulo de Tarso antes de sua conversão: um fanático inveterado, completamente dedicado ao judaísmo e à perseguição de Cristo e da igreja. Um homem nessa condição mental e emocional de maneira alguma mudaria de opinião, nem se deixaria influenciar por outras pessoas. Nenhum reflexo condicionado ou qualquer outro artifício psicológico poderia converter um homem assim. Apenas Deus poderia alcançá-lo – e foi o que Deus fez!” 10 [10 Stott, A Mensagem de Gálatas, p. 32.]

1:15 antes de eu nascer. Literalmente, “desde o ventre da minha mãe”. A expressão remete a Isaías 49:1 e Jeremias 1:5. Paulo também é um servo “chamado” para o serviço de Deus no plano eterno de Deus (veja Sl 139:13-16; Rm 9:10-13). Novamente a ênfase está na iniciativa de Deus: Paulo não foi chamado para ser apóstolo e anunciar o evangelho por nada que ele tivesse realizado.

“Graça é o favor imerecido e gratuito de Deus operando de maneira poderosa na mente e no coração para transformar vidas. Paulo é o exemplo mais claro de que a salvação é só pela graça, não mediante nosso desempenho moral e religioso. Embora seus pecados fossem muito graves, ele havia sido convidado a participar da graça.” 11 [11 Keller, Gálatas Para Você, p. 29.]

1:16 revelar Seu Filho em mim, para que eu O pregasse entre os gentios. Paulo foi convertido e chamado por Cristo a fim de anunciar a mensagem do evangelho primariamente aos não judeus (At 9:15; 22:21; 26:17; Rm 1:5; 11:13- 14; 15:16; Gl 2:9), mas ele não considerava isso como uma comissão para pregar exclusivamente a esse público. Em Atos capítulos 13 a 20 ele muitas vezes pregou aos gentios, e textos como Romanos 1:14-16; 9:1-5 e 1 Coríntios 9:20 mostram que ele também se esforçava para evangelizar os judeus.

No Antigo Testamento, a mensagem da salvação deveria ser levada a todos os povos (Is 2:2-4; Zc 8:20-23), mas, para isso, eles deveriam se tornar judeus. Agora, com a vinda de Cristo, todas as barreiras são plenamente derrubadas e não existe qualquer distinção (Gl 3:28; Ef 2:15). Todos que vêm a Cristo fazem parte do Seu povo.

não fui imediatamente consultar outras pessoas. Obviamente Paulo se encontrou com Ananias três dias depois da sua conversão (At 9:10-19; 22:12-16), mas “consultei” significa apresentar algo a alguém ou submeter alguma coisa à aprovação de outra pessoa. Paulo certamente não consultou Ananias nesse sentido. Em vez disso, o papel de Ananias foi de batizá-lo e confirmar o seu chamado de pregar aos gentios. Paulo não precisava de seres humanos para confirmar ou acrescentar o que Deus havia revelado a ele. Embora estivesse em plena harmonia com eles, Paulo não dependia dos outros apóstolos (Gl 2:1-10).

1:17 fui para as regiões da Arábia. A viagem à Arábia e de volta a Damasco aconteceu no intervalo entre Atos 9:25 e 9:26. A Arábia provavelmente era o reino da Nabateia, na Transjordânia, cuja capital era a famosa cidade de Petra. Paulo não indica o propósito de sua ida para a essa região, mas o objetivo do relato é mostrar que ele estava bem longe de Jerusalém e não poderia estar recebendo instruções dos apóstolos.

1:18-20 Paulo não derivou seu evangelho dos líderes da igreja em Jerusalém. Pedro e Tiago tiveram quinze dias para conversar com Paulo sobre sua mensagem, que claramente se harmonizava com a delas. No entanto, Paulo não foi comissionado pela igreja de Jerusalém; não era dali que derivava o seu ministério apostólico.

1:18 três anos. Esse período significa três anos após a conversão de Paulo ou três anos após seu retorno da Arábia. Tal episódio provavelmente é o mesmo registrado em Atos 9:26-30. Se a conversão de Paulo aconteceu em 34 d.C., essa visita teria ocorrido em torno de 37 d.C. Cefas. O nome que Jesus deu a “Simão, filho de Jonas” (Mt 16:17), também chamado de “Simão, filho de João” (Jo 1:42; 21:15-17). Seu equivalente grego é Pedro (Jo 1:42). O propósito da visita de Paulo a Jerusalém foi limitado (para conhecer Pedro), e não aconteceu até “três anos” após sua conversão. Ele ficou lá por apenas 15 dias, e não encontrou nenhum outro apóstolo.

Quinze dias era pouquíssimo tempo para que Paulo se tornasse dependente de Pedro como seu mentor, mas tempo suficiente para que conhecem amplamente o conteúdo da pregação de cada um e chegassem à conclusão de que estavam em perfeita harmonia. Ao relatar esses episódios, Paulo estava mostrando que eram os seus oponentes que deviam satisfações; afinal, ele havia sido reconhecido pelos líderes e apóstolos de Jerusalém como um pregador do verdadeiro evangelho.

1:19 não vi outro dos apóstolos, a não ser Tiago, o irmão do Senhor. Além de Pedro, Tiago foi o único outro apóstolo que Paulo viu nessa época. Tiago, irmão de Jesus (Mt 13:55; Mc 6:3), aparentemente não estava entre os seguidores de Cristo durante o Seu ministério terreno (Jo 7:5). Mas o Senhor ressuscitado apareceu a ele (1Co 15:7), e mais tarde ele assumiu um papel de liderança na igreja de Jerusalém (At 12:17; 15:13; 21:18; Gl 2:9, 12).

1:20 afirmo diante de Deus que não estou mentindo. Paulo faz aqui um juramento para enfatizar a veracidade de seu relato sobre a viagem que fez a Jerusalém. Ele baseia a verdade de seu evangelho em não recebê-lo de seres humanos, então ele promete solenemente que está falando a verdade sobre seus contatos limitados com Jerusalém.

1:22 eu não era conhecido pessoalmente. Durante esse período, Paulo também esteve longe dos crentes da Judeia. Ele era conhecido por eles apenas pelo relato de sua notável conversão. Afinal, ele havia ficado pouco tempo em Jerusalém e na Judeia e tinha entrado em contato com umas poucas pessoas (Gl 1:18-19).

1:23-24 A conversão de Paulo foi motivo de grande alegria para a igreja de Jerusalém. Essa mudança (Gl 1:13-14) e a mensagem que ele passou a anunciar foram obra de Deus (At 9:31). Paulo estava em completa sintonia com a igreja em Jerusalém.

O testemunho de Paulo e o nosso

Em Gálatas 1:11-24, Paulo compartilha o seu testemunho pessoal “por acreditar que isso ajudará seus ouvintes a terem um encontro com Cristo e os encorajará a não deixá-lo (v. 6). Ele não tem a menor vontade de chamar a atenção ou de ser aclamado. Está focado por inteiro nos ouvintes. Não os usa para exaltar o próprio ego, mas utiliza seu testemunho para ajudar seus amigos.

“Paulo aqui é um bom exemplo para nós. Mostra-nos que devemos ter a coragem de ser vulneráveis e falar em nível pessoal sobre o sentido do evangelho para nós. Por quê? Porque o cristianismo é um apelo para levarmos nossa vida
inteira, mente e coração, a Cristo. Deixar de fora o que pensamos ou como nos sentimos é dar uma imagem incompleta do quanto o compromisso cristão é abrangente. Se excluímos nosso testemunho, também transmitimos uma imagem incompleta do quanto a realização cristã é ampla. Cristo não apela só à nossa mente, ele enche nosso coração.” 12 [12 Keller, Gálatas Para Você, p. 37.]

Você pode ver mais estudos sobre o Livro de Gálatas aqui

Tags , , , .Adicionar aos favoritos o Link permanente.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *