Está Consumado

Escrito por Ellen White¹, publicado pela Casa Publicadora Brasileira
Cristo não entregou Sua vida antes que realizasse a obra que viera fazer, e ao exalar o espírito, exclamou: “Está consumado”. João 19:30. Ganhara a batalha. Sua destra e Seu santo braço Lhe alcançaram a vitória. Como Vencedor, firmou Sua bandeira nas alturas eternas. Que alegria entre os anjos! Todo o Céu triunfou na vitória do Salvador. Satanás foi derrotado, e sabia que seu reino estava perdido.
Para os anjos e os mundos não caídos, o brado: “Está consumado” teve profunda significação. Fora em seu benefício, bem como no nosso, que se operara a grande obra da redenção. Juntamente conosco, compartilham eles os frutos da vitória de Cristo.
Até à morte de Jesus, o caráter de Satanás não fora ainda claramente revelado aos anjos e mundos não caídos. O arqui-apóstata se revestira por tal forma de engano, que mesmo os santos seres não lhe compreenderam os princípios. Não viram claramente a natureza de sua rebelião.
Era um ser admirável de poder e glória o que se pusera em oposição a Deus. De Lúcifer, diz o Senhor: “Tu és o aferidor da medida, cheio de sabedoria e perfeito em formosura”. Ezequiel 28:12. Lúcifer fora o querubim cobridor. Estivera à luz da presença divina. Fora o mais elevado de todos os seres criados, e o primeiro em revelar ao Universo os desígnios divinos. Depois de pecar, seu poder de enganar tornou-se consumado, e mais difícil o descobrir-lhe o caráter, em virtude da exaltada posição que mantivera junto do Pai.
Deus poderia haver destruído Satanás e seus adeptos tão facilmente, como se pode atirar um seixo à terra; assim não fez, porém. A rebelião não seria vencida pela força. Poder compulsor só se encontra sob o governo de Satanás. Os princípios do Senhor não são dessa ordem. Sua autoridade baseia-se na bondade, na misericórdia e no amor; e a apresentação desses princípios é o meio a ser empregado. O governo de Deus é moral, e verdade e amor devem ser o poder predominante.
Era desígnio divino colocar as coisas numa base de segurança eterna, sendo decidido nos conselhos celestiais que se concedesse tempo a Satanás para desenvolver os seus princípios, o fundamento de seu sistema de governo. Pretendera serem os mesmos superiores aos princípios divinos. Deu-se tempo para que os princípios de Satanás operassem, a fim de serem vistos pelo Universo celestial.
Satanás induziu o homem ao pecado, e o plano de redenção entrou em vigor. Por quatro mil anos, esteve Cristo trabalhando pelo reerguimento do homem, e Satanás por sua ruína e degradação. E o Universo celestial contemplava tudo.
Ao vir Jesus ao mundo, o poder de Satanás voltou-se contra Ele. Desde o tempo em que aqui apareceu, como a Criancinha de Belém, manobrou o usurpador para promover Sua destruição. Por todos os meios possíveis, procurou impedir Jesus de desenvolver infância perfeita, imaculada varonilidade, um ministério santo e sacrifício irrepreensível. Foi derrotado, porém. Não pôde levar Jesus a pecar. Não O conseguiu desanimar, ou desviá-Lo da obra para cuja realização viera ao mundo. Do deserto ao Calvário, foi açoitado pela tempestade da ira de Satanás, mas quanto mais impiedosa era ela, tanto mais firme Se apegava o Filho de Deus à mão de Seu Pai, avançando na ensangüentada vereda. Todos os esforços de Satanás para oprimi-Lo e vencê-Lo, só faziam ressaltar, mais nitidamente, a pureza de Seu caráter.
Todo o Céu, bem como os não caídos mundos, foram testemunhas do conflito. Com que profundo interesse seguiram as cenas finais da luta! Viram o Salvador penetrar no horto do Getsêmani, a alma vergando sob o horror de uma grande treva. Ouviram-Lhe o doloroso grito: “Meu Pai, se é possível, passe de Mim este cálice”. Mateus 26:39. À medida que dEle era retirada a presença do Pai, viram-nO aflito por uma dor mais atroz que a da grande e última luta com a morte. Suor de sangue irrompeu-Lhe dos poros, gotejando no chão. Por três vezes foi-Lhe arrancada dos lábios a súplica de livramento. Não mais pôde o Céu suportar a cena, e um mensageiro de conforto foi enviado ao Filho de Deus.
O Céu viu a Vítima entregue às mãos da turba homicida, e, com zombaria e violência, impelida à pressa de um a outro tribunal. Ouviu os escárnios dos perseguidores por causa de Seu humilde nascimento. Ouviu a negação por entre juras e imprecações da parte de um de Seus mais amados discípulos. Viu a frenética obra de Satanás, e seu poder sobre o coração dos homens. Oh! terrível cena! o Salvador aprisionado à meia-noite no Getsêmani, arrastado daqui para ali, de um palácio a um tribunal, citado duas vezes perante sacerdotes, duas perante o Sinédrio, duas perante Pilatos, e uma diante de Herodes, escarnecido, açoitado, condenado e conduzido fora para ser crucificado, carregando o pesado fardo da cruz, por entre os lamentos das filhas de Jerusalém e as zombarias da gentalha!
Com dor e espanto contemplou o Céu a Cristo pendente da cruz, o sangue a correr-Lhe das fontes feridas, tendo na testa o sanguinolento suor. O sangue caía-Lhe, gota a gota, das mãos e dos pés, sobre a rocha perfurada para encaixar a cruz. As feridas abertas pelos cravos aumentavam ao peso que o corpo fazia sobre as mãos. Sua difícil respiração tornava-se mais rápida e profunda, à medida que Sua alma arquejava sob o fardo dos pecados do mundo. Todo o Céu se encheu de assombro quando, em meio de Seus terríveis sofrimentos, Cristo ergueu a oração: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Lucas 23:34. E, no entanto, ali estavam homens formados à imagem de Deus, unidos para esmagar a vida de Seu unigênito Filho. Que cena para o universo celeste!
Os principados e os poderes das trevas estavam congregados em torno da cruz, lançando no coração dos homens a diabólica sombra de incredulidade. Quando Deus criou esses seres para estar diante de seu trono, eram belos e gloriosos. Sua formosura e santidade estavam em harmonia com a exaltada posição que ocupavam. Enriquecidos com a sabedoria de Deus, cingiam-se com a armadura celestial. Eram os ministros de Jeová. Quem poderia, no entanto, reconhecer nos anjos caídos os gloriosos serafins que outrora ministravam nas cortes celestiais?
Instrumentos satânicos coligaram-se com homens maus em levar o povo a crer que Cristo era o maior dos pecadores, e torná-Lo objeto de abominação. Os que escarneciam de Cristo, enquanto pendia da cruz, estavam possuídos do espírito do primeiro grande rebelde. Ele os enchia de vis e aborrecíveis expressões. Inspirava-lhes as zombarias. Com tudo isso, porém, nada ganhou.
Houvesse-se podido achar um só pecado em Cristo, tivesse Ele num particular que fosse cedido a Satanás para escapar à horrível tortura, e o inimigo de Deus e do homem teria triunfado. Cristo inclinou a cabeça e expirou, mas manteve firme a Sua fé em Deus, e a Sua submissão a Ele. “E ouvi uma grande voz no Céu, que dizia: Agora chegada está a salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do Seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derribado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite”. Apocalipse 12:10.
Satanás viu que estava desmascarado. Sua administração foi exposta perante os anjos não caídos e o Universo celestial. Revelara-se um homicida. Derramando o sangue do Filho de Deus, desarraigou-se Satanás das simpatias dos seres celestiais. Daí em diante sua obra seria restrita. Qualquer que fosse a atitude que tomasse, não mais podia esperar os anjos ao virem das cortes celestiais, nem perante eles acusar os irmãos de Cristo de terem vestes de trevas e contaminação de pecado. Estavam rotos os últimos laços de simpatia entre Satanás e o mundo celestial.
Todavia, Satanás não foi então destruído. Os anjos não perceberam, nem mesmo aí, tudo quanto se achava envolvido no grande conflito. Os princípios em jogo deviam ser mais plenamente revelados. E por amor do homem, devia continuar a existência de Satanás. O homem, bem como os anjos, devia ver o contraste entre o Príncipe da Luz e o das trevas. Cumpria-lhes escolher a quem servir.
No início do grande conflito, declarara Satanás que a lei divina não podia ser obedecida, que a justiça era incompatível com a misericórdia, e que, fosse a lei violada, impossível seria ao pecador ser perdoado. Cada pecado devia receber seu castigo, argumentava Satanás; e se Deus abrandasse o castigo do pecado, não seria um Deus de verdade e justiça. Quando o homem violou a lei divina, e Lhe desprezou a vontade, Satanás exultou. Estava provado, declarou, que a lei não podia ser obedecida; o homem não podia ser perdoado. Por haver sido banido do Céu, depois da rebelião, pretendia que a raça humana devesse ser para sempre excluída do favor divino. O Senhor não podia ser justo, argumentava, e ainda mostrar misericórdia ao pecador.
Mas mesmo como pecador, achava-se o homem, para com Deus, em posição diversa da de Satanás. Lúcifer pecara, no Céu, em face da glória divina. A ele, como a nenhum outro ser criado, se revelou o amor de Deus. Compreendendo o caráter do Senhor, conhecendo-Lhe a bondade, preferiu Satanás seguir sua própria vontade independente e egoísta. Essa escolha foi decisiva. Nada mais havia que Deus pudesse fazer para o salvar. O homem, porém, foi enganado; obscureceu-se-lhe o espírito pelo sofisma de Satanás. A altura e a profundidade do amor divino, não as conhecia o homem. Para ele, havia esperança no conhecimento do amor de Deus. Contemplando-Lhe o caráter, podia ser novamente atraído para Ele.
Por meio de Jesus, foi a misericórdia divina manifesta aos homens; a misericórdia, no entanto, não pôs de parte a justiça. A lei revela os atributos do caráter de Deus, e nem um jota ou til da mesma se podia mudar, para ir ao encontro do homem em seu estado caído. Deus não mudou Sua lei, mas sacrificou-Se em Cristo, para redenção do homem. “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo”. 2 Coríntios 5:19.
A lei requer justiça — vida justa, caráter perfeito; e isso não tem o homem para dar. Não pode satisfazer as reivindicações da santa lei divina. Mas Cristo, vindo à Terra como homem, viveu vida santa, e desenvolveu caráter perfeito. Estes oferece Ele como dom gratuito a todos quantos o queiram receber. Sua vida substitui a dos homens. Assim obtêm remissão de pecados passados, mediante a paciência de Deus. Mais que isso, Cristo lhes comunica os atributos divinos. Forma o caráter humano segundo a semelhança do caráter de Deus, uma esplêndida estrutura de força e beleza espirituais. Assim, a própria justiça da lei se cumpre no crente em Cristo. Deus pode ser “justo e justificador daquele que tem fé em Jesus”. Romanos 3:26.
O amor de Deus tem-se expressado tanto em Sua justiça como em Sua misericórdia. A justiça é o fundamento de Seu trono, e o fruto de Seu amor. Era o desígnio de Satanás divorciar a misericórdia da verdade e da justiça. Buscou provar que a justiça da lei divina é um inimigo da paz. Mas Cristo mostrou que, no plano divino, elas estão indissoluvelmente unidas; uma não pode existir sem a outra. “A misericórdia e a verdade se encontraram; a justiça e a paz se beijaram”. Salmos 85:10.
Por Sua vida e morte, provou Cristo que a justiça divina não destrói a misericórdia, mas que o pecado pode ser perdoado, e que a lei é justa, sendo possível obedecer-lhe perfeitamente. As acusações de Satanás foram refutadas. Deus dera ao homem inequívoca prova de amor.
Outro engano devia ser então apresentado. Satanás declarou que a misericórdia destruía a justiça, que a morte de Cristo anulava a lei do Pai. Fosse possível ser a lei mudada ou anulada, então não era necessário Cristo ter morrido. Anular a lei, porém, seria imortalizar a transgressão e colocar o mundo sob o domínio de Satanás. Foi porque a lei é imutável, porque o homem só se pode salvar mediante a obediência a seus preceitos, que Jesus foi erguido na cruz. Todavia, os próprios meios por que Cristo estabeleceu a lei, foram apresentados por Satanás como destruindo-a. A esse respeito sobrevirá o último conflito da grande luta entre Cristo e Satanás.
O ser defeituosa a lei pronunciada pela própria voz divina, o haverem sido certas especificações postas à margem, eis a pretensão apresentada agora por Satanás. É o último grande engano que ele há de trazer sobre o mundo. Não necessita atacar toda a lei; se pode levar os homens a desrespeitar um só preceito, está conseguido seu objetivo. Pois “qualquer que guardar toda a lei, e tropeçar em um só ponto, tornou-se culpado de todos”. Tiago 2:10. Consentindo em transgredir um preceito, são os homens colocados sob o poder de Satanás. Substituindo a lei divina pela humana, procurará Satanás dominar o mundo. Essa obra é predita em profecia. Acerca do grande poder apóstata que é representante de Satanás, acha-se declarado: “Proferirá palavras contra o Altíssimo e destruirá os santos do Altíssimo, e cuidará em mudar os tempos e a lei; e eles serão entregues na sua mão”. Daniel 7:25.
Os homens hão de certamente estabelecer suas leis para anular as de Deus. Procurarão obrigar a consciência de outros, e, em seu zelo para impor essas leis, oprimirão os semelhantes.
A guerra contra a lei divina, começada no Céu, continuará até ao fim do tempo. Todo homem será provado. Obediência ou desobediência, eis a questão a ser assentada por todo o mundo. Todos serão chamados a escolher entre a lei divina e as humanas. Aí se traçará a linha divisória. Não existirão senão duas classes. Todo caráter será plenamente desenvolvido; e todos mostrarão se escolheram o lado da lealdade ou o da rebelião.
Então virá o fim. Deus reivindicará Sua lei e livrará Seu povo. Satanás e todos quantos se lhe houverem unido em rebelião serão extirpados. O pecado e os pecadores perecerão, raiz e ramos (Malaquias 4:1) — Satanás a raiz, e seus seguidores os ramos. Cumprir-se-á a palavra dirigida ao príncipe do mal: “Pois que estimas o teu coração como se fora o coração de Deus, […] te farei perecer, ó querubim protetor, entre pedras afogueadas. […] Em grande espanto te tornaste, e nunca mais serás para sempre”. Ezequiel 28:6-19. Então “o ímpio não existirá; olharás para o seu lugar, e não aparecerá” (Salmos 37:10); “e serão como se nunca tivessem sido”. Obadias 16.
Isso não é um ato de poder arbitrário da parte de Deus. Os que Lhe rejeitavam a misericórdia ceifarão aquilo que semearam. Deus é a fonte da vida; e quando alguém escolhe o serviço do pecado, separa-se de Deus, desligando-se assim da vida. Ele está “separado da vida de Deus”. Efésios 4:18. Cristo diz: “Todos os que Me aborrecem amam a morte”. Provérbios 8:36. Deus lhe dá existência por algum tempo, a fim de poderem desenvolver seu caráter e revelar seus princípios. Feito isso, receberão os resultados de sua própria escolha. Por uma vida de rebelião, Satanás e todos quantos a ele se unem colocam-se em tanta desarmonia com Deus, que Sua própria presença lhes é um fogo consumidor. A glória dAquele que é amor os destruirá.
Ao princípio do grande conflito, os anjos não entendiam isso. Houvesse sido deixado que Satanás e seus anjos colhessem os plenos frutos de seu pecado, e teriam perecido; mas não se patentearia aos seres celestiais ser isso o inevitável resultado do pecado. Uma dúvida acerca da bondade divina haveria permanecido em seu espírito, qual ruim semente, para produzir seu mortal fruto de pecado e miséria.
Não será, porém, assim, ao findar o grande conflito. Então, havendo-se completado o plano da redenção, o caráter de Deus é revelado a todos os seres inteligentes. Os preceitos de Sua lei são vistos como perfeitos e imutáveis. Então o pecado terá patenteado sua natureza, Satanás o seu caráter. Então o extermínio do pecado reivindicará o amor de Deus, e estabelecerá Sua honra perante um Universo de seres que se deleitam em fazer Sua vontade, e em cujo coração está a Sua lei.
Bem podiam, pois, os anjos se regozijar ao contemplarem a cruz do Salvador; pois embora não compreendessem ainda tudo, sabiam que a destruição do pecado e de Satanás fora para sempre assegurada, que a redenção do homem era certa e que o Universo estava para sempre a salvo. O próprio Cristo compreendeu plenamente os resultados do sacrifício feito no Calvário. A tudo isto olhava Ele quando exclamou na cruz: “Está consumado”. João 19:30.


No sepulcro de José

Jesus descansou, afinal. Findara o longo dia de vergonha e tortura. Ao introduzirem os últimos raios do sol poente o dia do sábado, o Filho de Deus estava em repouso, no sepulcro de José. Concluída Sua obra, as mãos cruzadas em paz, descansava durante as sagradas horas do sábado
No princípio, o Pai e o Filho repousaram no sábado após Sua obra de criação. Quando “os céus, e a Terra e todo o seu exército foram acabados” (Gênesis 2:1), o Criador e todos os seres celestiais se regozijaram na contemplação da gloriosa cena. “As estrelas da alva juntas alegremente cantavam, e todos os filhos de Deus rejubilavam”. Jó 38:7. Agora Jesus descansava da obra de redenção; e se bem que houvesse dor entre os que O amavam na Terra, reinou contudo alegria no Céu. Gloriosa era aos olhos dos seres celestiais a perspectiva do futuro. Uma criação restaurada, a raça redimida que, havendo vencido o pecado, nunca mais poderia cair — eis o resultado visto por Deus e os anjos, da obra consumada por Cristo. Com esta cena se acha para sempre ligado o dia em que Jesus descansou. Pois Sua “obra é perfeita” (Deuteronômio 32:4); e “tudo quanto Deus faz durará eternamente”. Eclesiastes 3:14. Quando se der a “restauração de todas as coisas, as quais Deus falou por boca dos Seus santos profetas, desde o princípio do mundo” (Atos dos Apóstolos 3:21, Trad. Figueiredo), o sábado da criação, o dia em que Jesus esteve em repouso no sepulcro de José, será ainda um dia de descanso e regozijo. O Céu e a Terra se unirão em louvor, quando, “desde um sábado até ao outro” (Isaías 66:23), as nações dos salvos se inclinarem em jubiloso culto a Deus e o Cordeiro.
Nos acontecimentos finais do dia da crucifixão, foi dada nova prova de cumprimento da profecia, e novo testemunho da divindade de Cristo. Quando a treva se erguera de sobre a cruz, e o Salvador soltara Seu brado agonizante, ouviu-se imediatamente outra voz, dizendo: “Verdadeiramente este era o Filho de Deus”. Lucas 23:47.
Essas palavras não foram murmuradas em segredo. Todos os olhos se volveram a ver de onde provinham. Quem falara? Fora o centurião, o soldado romano. A divina paciência do Salvador, e Sua súbita morte, com o grito de vitória nos lábios, impressionara esse pagão. No ferido, quebrantado corpo pendente da cruz, reconheceu o centurião a figura do Filho de Deus. Não pôde deixar de confessar sua fé. Assim foi novamente dada a prova de que nosso Redentor devia ver o trabalho de Sua alma. No mesmo dia de Sua morte, três homens, diferindo largamente entre si, declaravam sua fé — o que comandava a guarda romana, o que conduzira a cruz do Salvador e o que morrera na cruz, ao Seu lado.
Ao aproximar-se a noite, um silêncio estranho pairou sobre o Calvário. A multidão dispersou-se, e muitos volveram a Jerusalém com espírito bem diverso do que tinham pela manhã. Muitos haviam afluído à crucifixão por curiosidade, e não por ódio para com Cristo. Contudo, acreditavam nas acusações dos sacerdotes e olhavam-nO como malfeitor. Sob uma agitação fora do natural, uniram-se à turba em injuriá-Lo. Quando, porém, a Terra foi envolta em trevas, e se sentiram acusados pela própria consciência, acharam-se culpados de uma grande injustiça. Nenhum gracejo ou riso de escárnio se ouviu em meio daquela terrível escuridão; e, dissipada ela, fizeram o caminho de volta a casa em solene silêncio. Estavam convencidos de que as acusações dos sacerdotes eram falsas, de que Jesus não era nenhum impostor; e algumas semanas mais tarde, quando Pedro pregou no dia de Pentecostes, achavam-se entre os milhares que se converteram a Cristo.
Mas os guias judaicos não se mudaram pelos acontecimentos que haviam presenciado. Não arrefecera seu ódio para com Jesus. A treva que cobria a Terra durante a crucifixão, não era mais densa que a que ainda envolvia o espírito dos sacerdotes e principais. Em Seu nascimento, a estrela conhecera a Cristo e guiara os magos à manjedoura onde jazia. As hostes celestiais conheceram-nO e entoaram-Lhe o louvor por sobre as planícies de Belém. Conhecera-Lhe o mar a voz e obedecera a Sua ordem. A doença e a morte reconheceram-Lhe a autoridade, entregando-Lhe sua presa. O Sol O conhecera e, à vista de Sua agonia e morte, ocultara a face luminosa. Conheceram-nO as rochas, e fenderam-se, fragmentando-se ao Seu brado. A natureza inanimada conhecera a Cristo, e dera testemunho de Sua divindade. Mas os sacerdotes e príncipes de Israel não conheceram o Filho de Deus.
Todavia, esses sacerdotes e príncipes não estavam tranquilos. Levaram a cabo seu desígnio de matar a Jesus; não experimentavam, no entanto, a sensação da vitória que esperavam. Mesmo na hora de seu aparente triunfo, assaltavam-nos dúvidas quanto ao que viria depois. Ouviram o brado: “Está consumado”. João 19:30. “Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito”. Lucas 23:46. Viram as rochas fenderem-se, sentiram o forte terremoto e estavam desassossegados, inquietos.
Tinham invejado a influência de Cristo para com o povo, enquanto vivo; sentiam o mesmo ainda depois de Ele morto. Temiam mais, muito mais o Cristo morto do que haviam temido o Cristo vivo. Receavam que a atenção do povo fosse atraída ainda para os acontecimentos que acompanhavam a crucifixão. Temiam os resultados da obra daquele dia. Por coisa alguma queriam que Seu corpo permanecesse na cruz, durante o sábado. Este se vinha aproximando, e seria uma violação de sua santidade o ficarem os corpos pendentes da cruz. Assim, servindo-se disso como pretexto, os principais judeus solicitaram de Pilatos que se apressasse a morte das vítimas, e seus corpos fossem tirados antes do pôr-do-sol.
Pilatos tinha tão pouca vontade como eles de que o corpo de Jesus ficasse na cruz. Obtido seu consentimento, quebraram as pernas dos dois ladrões para lhes apressar a morte; mas verificaram estar Jesus já morto. Os rudes soldados abrandaram-se pelo que ouviram e testemunharam de Cristo, e abstiveram-se de Lhe quebrar os membros. Assim, na oferta do Cordeiro de Deus cumpriu-se a lei da páscoa: “Dela nada deixarão até à manhã, e dela não quebrarão osso algum; segundo todo o estatuto da páscoa a celebrarão”. Números 9:12.
Os sacerdotes e principais surpreenderam-se ao verificar que Jesus já estava morto. A morte pela cruz constituía processo vagaroso; difícil era determinar quando cessara a vida. Nunca se ouvira que alguém morrera dentro de seis horas de crucifixão. Os sacerdotes desejavam certificar-se da morte de Jesus, e, por sugestão deles, um soldado atirou uma lança ao lado do Salvador. Da ferida assim feita saíram duas copiosas e distintas correntes, uma de sangue, outra de água. Isso foi observado por todos os espectadores, e João declara a ocorrência de maneira bem positiva. Diz ele: “Um dos soldados Lhe furou o lado com uma lança, e logo saiu sangue e água. E aquele que o viu testificou, e seu testemunho é verdadeiro; e sabe que é verdade o que diz, para que também vós o creiais. Porque isto aconteceu para que se cumprisse a Escritura, que diz: Nenhum dos Seus ossos será quebrado. E outra vez diz a Escritura: Verão Aquele que traspassaram”. João 19:34-37.
Depois da ressurreição, os sacerdotes e principais puseram em circulação o boato de que Cristo não morrera na cruz, que apenas desmaiara e revivera posteriormente. Outro boato afirmava que não era um corpo real, de carne e osso, mas a semelhança de um corpo, o que fora posto no sepulcro. A ação dos soldados romanos contesta essas falsidades. Não Lhe quebraram as pernas, porque Ele já estava morto. Para satisfazer os sacerdotes, furaram-Lhe o lado. Não se houvesse já extinguido a vida, e isso teria ocasionado imediatamente a morte.
Não foi, porém, a lança atirada, não foi a dor da crucifixão, que produziu a morte de Jesus. Aquele grito soltado “com grande voz” (Lucas 23:46) no momento da morte, a corrente de sangue e água que Lhe fluiu do lado, demonstravam que Ele morreu pela ruptura do coração. Partiu-se-Lhe o coração pela angústia mental. Foi morto pelo pecado do mundo.
Com a morte de Cristo, pereceram as esperanças dos discípulos. Olhavam-Lhe as cerradas pálpebras e a cabeça pendida, o cabelo empastado de sangue, as mãos e os pés traspassados, e indescritível era a angústia que sentiam. Até ao fim não acreditavam que Ele morresse; mal podiam crer que estivesse realmente morto. Esmagados pela dor, não recordavam Suas palavras, a predizer essa mesma cena. Coisa alguma de quanto dissera lhes dava então conforto. Viam unicamente a cruz e a ensangüentada vítima. O futuro afigurava-se-lhes negro e desesperador. Sua fé em Jesus morrera; nunca, porém, haviam amado tanto a seu Senhor. Nunca Lhe haviam antes assim compreendido o valor, e a necessidade que tinham da presença dEle.
Mesmo morto, o corpo de Cristo era muito precioso aos discípulos. Anelavam fazer-Lhe honroso sepultamento, mas não sabiam como o haviam de realizar. O crime que dera lugar à condenação de Cristo era traição ao governo romano, e as pessoas mortas por essa ofensa deviam ser sepultadas num terreno especialmente provido para os criminosos. O discípulo João, e as mulheres da Galiléia, haviam permanecido ao pé da cruz. Não podiam deixar o corpo de seu Senhor nas insensíveis mãos dos soldados, e enterrado num desonrosa sepultura. No entanto, não o podiam impedir. Não lhes era possível obter favores das autoridades judaicas, e nenhuma influência tinham junto de Pilatos.
Nessa emergência, José de Arimatéia e Nicodemos vieram em auxílio dos discípulos. Ambos eram membros do Sinédrio e tinham relações com Pilatos. Ambos ricos e influentes, decidiram que o corpo de Jesus teria sepultamento condigno.
José foi ousadamente a Pilatos e pediu-lhe o corpo de Jesus. Pela primeira vez, ouviu Pilatos que Jesus estava na verdade morto. Contraditórias notícias haviam-lhe chegado aos ouvidos quanto aos acontecimentos concernentes à crucifixão, mas ocultaram-lhe propositalmente a morte de Cristo. Pilatos fora prevenido pelos sacerdotes e principais contra algum engano da parte dos discípulos de Jesus em relação ao Seu corpo. Ouvindo o pedido de José, mandou, portanto, chamar o centurião de serviço junto à cruz, e soube com certeza da morte de Cristo. Dele colheu também a narração das cenas do Calvário, confirmando o testemunho de José.

O pedido de José foi satisfeito. Enquanto João estava aflito quanto ao sepultamento do Mestre, voltou ele com a ordem de Pilatos acerca do corpo de Cristo; e Nicodemos chegou trazendo uma custosa mistura de mirra e aloés, de cerca de cem libras de peso, para Seu embalsamento. Ao mais honrado em Jerusalém, não se poderia haver demonstrado mais respeito na morte. Os discípulos surpreenderam-se de ver esses ricos príncipes tão interessados como eles próprios no sepultamento do Senhor.
Nem José nem Nicodemos haviam aceito abertamente o Salvador enquanto vivera. Sabiam que esse passo os excluiria do Sinédrio, e esperavam protegê-Lo por sua influência nos conselhos. Por algum tempo, pareceu haverem sido bem-sucedidos; mas os astutos sacerdotes, vendo como favoreciam a Cristo, embargaram-lhes os planos. Em sua ausência, fora Jesus condenado e entregue para ser crucificado. Agora, que estava morto, não mais ocultaram sua afeição para com Ele. Enquanto os discípulos temiam mostrar-se abertamente como Seus seguidores, José e Nicodemos foram ousadamente em seu auxílio. O concurso desses homens ricos e honrados era muito oportuno. Era-lhes dado fazer pelo Mestre morto o que se tornava impossível aos pobres discípulos; e sua riqueza e influência os protegia, em grande parte, da malignidade dos sacerdotes e principais.
Delicada e reverentemente, removeram eles do madeiro, com as próprias mãos, o corpo de Jesus. Corriam-lhes lágrimas de compaixão, ao contemplarem-Lhe o ferido e lacerado corpo. José possuía um sepulcro novo, talhado numa rocha. Reservava-o para si mesmo, mas ficava próximo do Calvário, e preparou-o então para Jesus. O corpo, com as especiarias trazidas por Nicodemos, foi cuidadosamente envolto num lençol de linho, e o Redentor levado à sepultura. Aí, os três discípulos compuseram-Lhe os mutilados membros, e cruzaram-Lhe as mãos feridas sobre o inanimado peito. As mulheres galiléias foram ver se se fizera tudo quanto se podia fazer pelo corpo sem vida do amado Mestre. Viram então que fora rolada a pesada pedra para a entrada do sepulcro, e o Salvador deixado a repousar. As mulheres foram as últimas ao pé da cruz, e as últimas também a deixar o sepulcro. Enquanto baixavam as sombras da noite, Maria Madalena e as outras Marias demoravam-se ainda em torno do lugar em que descansava o Senhor, derramando lágrimas de dor pela sorte dAquele a quem amavam. “E, voltando elas […] no sábado repousaram, conforme o mandamento”. Lucas 23:56.
Aquele seria um inesquecível sábado para os tristes discípulos, e também para os sacerdotes, os príncipes, os escribas e o povo. Ao pôr-do-sol do dia de preparação, soaram as trombetas, anunciando o começo do sábado. A páscoa foi observada como fora por séculos, ao passo que Aquele a quem ela apontava havia sido morto por mãos ímpias e jazia no sepulcro de José. No sábado, os átrios do templo encheram-se de adoradores. O sumo sacerdote, vindo do Gólgota, ali estava, esplendidamente vestido com os trajes sacerdotais. Sacerdotes de alvos turbantes, em plena atividade, cumpriam seus deveres. Mas alguns dos presentes não se achavam tranquilos, ao oferecer-se pelo pecado o sangue de bezerros e bodes. Não estavam conscientes de que o tipo encontrara o antítipo, de que um infinito sacrifício fora feito pelos pecados do mundo. Não sabiam que não mais havia valor no desempenho do serviço ritual. Mas nunca antes fora aquela cerimônia testemunhada com tão contraditórios sentimentos. As trombetas e os instrumentos de música, bem como as vozes dos cantores, eram tão altos e claros como de costume. Mas dir-se-ia estar tudo possuído de um sentimento de estranheza. Um após outro indagava de um singular acontecimento que ocorrera. Até então o santíssimo fora guardado impenetrável. Mas agora se achava exposto aos olhares de todos. O pesado véu de tapeçaria, feito de puro linho, e belamente trabalhado em ouro, escarlate e púrpura, fora rasgado de alto a baixo. O lugar em que Jeová Se encontrara com o sumo sacerdote, para comunicar Sua glória, o lugar que fora a sagrada câmara de audiência de Deus, jazia aberto a todos os olhos — não mais reconhecido pelo Senhor. Com sombrios pressentimentos ministravam os sacerdotes diante do altar. O haver sido exposto o sagrado mistério do lugar santíssimo os enchia de medo de uma calamidade por vir.
Muitos espíritos ocupavam-se com pensamentos despertados pela cena do Calvário. Da crucifixão à ressurreição, muitos olhos insones estiveram constantemente examinando as profecias, alguns para compreender o inteiro significado da festa que então celebravam, outros para procurar provas de que Jesus não era aquilo que pretendia; outros ainda, corações tristes, buscavam testemunho de que Ele era o verdadeiro Messias. Embora indagassem levados por diferentes motivos, convenceram-se todos da mesma verdade — que se cumprira a profecia nos acontecimentos dos últimos dias, e que o Crucificado era o Redentor do mundo. Muitos que, naquela ocasião, tomaram parte do serviço, nunca mais se uniram aos ritos pascoais. Muitos, mesmo dentre os sacerdotes, ficaram convencidos do verdadeiro caráter de Jesus. Suas pesquisas das profecias não foram em vão, e depois de Sua ressurreição reconheceram-nO como o Filho de Deus.
Nicodemos, ao ver Cristo erguido na cruz, lembrou-se das palavras que Ele proferira à noite, no Monte das Oliveiras: “Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; para que todo aquele que nEle crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. João 3:14, 15. Naquele sábado, enquanto Jesus Se achava no sepulcro, Nicodemos teve ensejo de refletir. Uma luz mais clara iluminou-lhe o espírito, e as palavras que Jesus lhe dirigira não continuaram mais um mistério para ele. Sentiu haver perdido muito por não se ter ligado ao Salvador enquanto vivera. Recordou então os acontecimentos do Calvário. A súplica de Cristo por Seus assassinos, e a resposta que dera ao pedido do ladrão moribundo, tocaram a alma do douto membro do conselho. Contemplou de novo o Salvador em Sua agonia; tornou a ouvir o último grito: “Está consumado” (João 19:30), proferido como palavras de um vencedor. Viu novamente a terra cambaleando, os Céus entenebrecidos, o véu rasgado, as rochas fendidas, e sua fé para sempre se estabeleceu. O mesmo acontecimento que destruiu a esperança dos discípulos, convenceu José e Nicodemos da divindade de Jesus. Seus temores foram vencidos pela coragem de uma firme, inabalável fé.
Jamais Cristo atraíra a atenção do povo como quando jazia no túmulo. Como de costume, levaram os doentes e sofredores para os átrios do templo, indagando: Quem nos pode informar acerca de Jesus de Nazaré? Muitos vieram de longe para encontrar Aquele que curava os enfermos e ressuscitava os mortos. De todos os lados, ouvia-se o clamor: Queremos Cristo, o Médico. Nessa ocasião, examinavam os sacerdotes os suspeitos de lepra. Muitos eram forçados a ouvir seu marido, sua esposa ou filhos serem declarados leprosos, e condenados a sair do abrigo de seu lar e de sob o cuidado dos queridos, para advertir os estranhos com o lamentoso grito: “Imundo! imundo!” As mãos amigas de Jesus de Nazaré, que nunca se recusaram ao toque comunicador de cura ao repugnante leproso, achavam-se cruzadas sobre o próprio peito. Os lábios que lhes respondiam às petições com as confortadoras palavras: “Quero, sê limpo” (Mateus 8:3), estavam agora mudos. Muitos apelavam para os principais dos sacerdotes e os príncipes em busca de simpatia e auxílio, mas em vão. Aparentemente, estavam decididos a ter outra vez entre si o Cristo vivo. Com persistente ansiedade, indagavam por Ele. Não queriam ser mandados embora. Mas eram expulsos dos átrios do templo, e foram postados soldados às portas para deter a multidão que chegava com os doentes e moribundos, solicitando entrada.
Os sofredores que tinham ido para ser curados pelo Salvador, sucumbiam ante a decepção. As ruas estavam cheias de lamentos. Os doentes pereciam à míngua do toque vivificante de Jesus. Médicos eram consultados em vão; não havia eficiência como a dAquele que jazia no túmulo de José.
Os lamentos dos que sofriam levaram a milhares à convicção de que se fora do mundo uma grande luz. Sem Cristo, a Terra era sombra e escuridão. Muitos daqueles cuja voz havia avolumado o grito de “Crucifica-O, crucifica-O” (Lucas 23:21), compreendiam agora a calamidade que lhes sobreviera, e teriam com igual veemência clamado — Dá-nos Jesus! — houvesse Ele estado ainda vivo.
Quando o povo soube que Jesus fora morto pelos sacerdotes, fez indagações quanto a Sua morte. Os pormenores de Seu julgamento foram o mais possível conservados em segredo; mas durante o tempo em que Ele permaneceu no sepulcro Seu nome andava em milhares de lábios, e notícias de Seu irrisório julgamento, e da desumanidade dos sacerdotes e principais circulavam por toda parte. Por homens de inteligência foram esses sacerdotes e príncipes convidados a explicar as profecias do Antigo Testamento a respeito do Messias, e enquanto procuravam forjar qualquer falsidade em resposta, ficaram como loucos. As profecias que indicavam os sofrimentos e a morte de Cristo, não podiam explicar, e muitos indagadores se convenceram de que as Escrituras se haviam cumprido.

A vingança que os sacerdotes julgaram seria tão doce, já lhes era amarga. Sabiam que estavam enfrentando a severa censura do povo e que os próprios a quem influenciaram contra Jesus se sentiam agora horrorizados com a vergonhosa obra que haviam feito. Esses sacerdotes procuraram crer que Jesus era enganador; mas em vão. Alguns deles estiveram ao pé da sepultura de Lázaro e viram o morto chamado novamente à vida. Tremeram de temor de que Cristo ressuscitasse por Sua vez, e tornasse a aparecer diante deles. Haviam-nO ouvido declarar que tinha poder para dar Sua vida, e para tornar a tomá-la. Lembravam-se de que dissera: “Derribai este templo, e em três dias o levantarei”. João 2:19. Judas declarara-lhes as palavras ditas por Ele aos discípulos, durante a última viagem para Jerusalém: “Eis que vamos para Jerusalém, e o Filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes, e aos escribas, e condená-Lo-ão à morte. E O entregarão aos gentios para que dEle escarneçam, e O açoitem e crucifiquem, e ao terceiro dia ressuscitará”. Mateus 20:18, 19. Ao ouvirem essas palavras, zombaram e ridicularizaram. Agora, porém, se lembravam de que até ali se haviam cumprido as predições de Cristo. Afirmara que ressuscitaria ao terceiro dia, e quem poderia dizer que isso também não se cumpriria? Desejavam expulsar esses pensamentos, mas não podiam. Como seu pai, o diabo, creram e tremeram.
Agora, que passara o frenesi da agitação, a imagem de Cristo, malgrado seu, acudia-lhes sempre ao espírito. Viam-nO sereno e sem um queixume perante os inimigos, sofrendo sem murmurar as zombarias e maus-tratos. Ocorriam-lhes todos os acontecimentos de Seu julgamento e crucifixão, com uma empolgante convicção de que Ele era o Filho de Deus. Pensavam que poderia a qualquer momento apresentar-Se diante deles, o Acusado tornando-se acusador, o Condenado a condenar, o Morto a exigir justiça na morte de Seus assassinos.

Pouco puderam repousar no sábado. Embora não transpusessem o limiar de um gentio por temor de contaminação, tiveram no entanto, um conselho quanto ao corpo de Cristo. A morte e o sepulcro deviam guardar Aquele a quem crucificaram. “Reuniram-se os príncipes dos sacerdotes em casa de Pilatos, dizendo: Senhor, lembramo-nos de que aquele enganador, vivendo ainda, disse: Depois de três dias ressuscitarei. Manda pois que o sepulcro seja guardado com segurança até o terceiro dia, não se dê o caso que os Seus discípulos vão de noite, e O furtem, e digam ao povo: Ressuscitou dos mortos; e assim o último erro será pior do que o primeiro. E disse-lhes Pilatos: Tendes a guarda; ide, guardai-O como entenderdes”. Mateus 27:62-65.
Os sacerdotes deram ordens para ser guardado o sepulcro. Uma grande pedra fora colocada diante da entrada. Através dessa pedra, puseram cordas, prendendo as extremidades à sólida rocha e selando-as com o selo romano. A pedra não podia ser removida sem quebrar o selo. Uma guarda de cem soldados foi então colocada em volta do sepulcro, para impedir que alguém tentasse contra sua segurança. Os sacerdotes fizeram o que puderam para manter o corpo de Cristo onde fora posto. Foi fechado com tanta segurança em Seu túmulo, como se nele devesse permanecer para sempre.
Assim se aconselhavam e faziam planos fracas criaturas. Mal percebiam esses homicidas a inutilidade de seus esforços. Por seu proceder, no entanto. Deus foi glorificado. Os próprios esforços, feitos para impedir a ressurreição de Cristo, são os mais convincentes argumentos em prová-la. Quanto maior o número de soldados colocados ao redor do sepulcro, tanto mais vigoroso o testemunho de que Ele ressurgira. Centenas de anos antes da morte de Cristo, o Espírito Santo declarara por intermédio do salmista: “Por que se amotinam as gentes, e os povos imaginam coisas vãs? Os reis da Terra se levantam, e os príncipes juntos se mancomunam contra o Senhor e contra o Seu Ungido. […] Aquele que habita no Céu Se rirá; o Senhor zombará deles”. Salmos 2:1-4. As guardas e as armas romanas foram impotentes para limitar o Senhor da Vida dentro do túmulo. Aproximava-se a hora de Sua libertação.
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. Fonte: 1- Ellen White, O Desejado de Todas as Nações. Cap. 79 e 80
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