A Mensagem de Daniel 11 – Comentário de C Mervyn Maxwell

Você pode adquirir este livro na CPB

Deus Conhece Tudo a Nosso Respeito

Uma diferença fundamental entre as visões anteriores do livro de Daniel e a do capítulo 11, é aquelas que tratam basicamente com a sucessão de impérios, ao passo que esta se ocupa mais com indivíduos. Nas outras visões, ‘rei’ significa ‘reino’. Em Daniel 11, porém, com bastante frequência ‘rei’ significava efetivamente rei.

[…] no quinto e sextos séculos depois de Cristo o líder do estado romano foi sucedido pelo líder da igreja romana; ou seja, o “augusto” foi sucedido pelo “Santo Padre”. O “homem vil” que surgiria em lugar de Augusto era, portanto, o papa medieval – visto, a exemplo de outros líderes de Daniel 11, apenas sob o ângulo de suas hostilidades.

Lembre-se: em Daniel 11 todas as pessoas são hostis, exceto os “entendidos” dos versos 32 a 34, que se mantêm firmes ao lado de Deus, durante os tempos de perseguição.

“Com lisonjas, perverterá aqueles que violaram a aliança, mas o povo que conhece o seu Deus se tornará forte e ativo. Os sábios entre o povo ensinarão a muitos; todavia, cairão pela espada e pelo fogo, pelo cativeiro e pelo roubo, por algum tempo. Ao caírem, receberão uma pequena ajuda; mas muitos se ajuntarão a eles com lisonjas.”

“[…] pois todos pecaram e carecem da glória de Deus,” Romanos 3:23

Portanto, o papado medieval cresce e se fortalece a partir de uma posição inicial de insignificância (verso 23), estabelece tratados baseados no engano (verso 23) e saqueia os ricos de modo a poder recompensar seus amigos de um modo tal que jamais havia sido visto antes (verso 24).

Segundo esta interpretação, os versos 25 a 30 antecipam a era das cruzadas – um importantíssimo fenômeno e um dos mais destacados exemplos da hostilidade de Roma cristã. Iniciadas vigorosamente pela incisiva oratória do Papa Urbano II, a era das cruzadas contemplou a Europa Ocidental dirigindo-se para o exterior nada menos que sete vezes no espaço de aproximadamente 150 anos (1095 a 1250), com o fito de arrancar a Terra Santa das mãos muçulmanas, deixando-a livre para os peregrinos cristãos.

Os mulçumanos que controlavam Jerusalém à época da primeira cruzada, e que de tempos em tempos readquiriram o controle sobre a cidade, eram capitaneados pelos califas (ou mais tarde pelos sultões) do Egito.9

Assim, a primeira cruzada foi um feroz ataque contra o “reio do Sul”:

“Virá também de surpresa aos lugares mais férteis da província e fará o que nunca fizeram os seus pais, nem os pais de seus pais: repartirá entre eles a presa, os despojos e os bens; e fará os seus planos contra as fortalezas, mas só por certo tempo.

— Despertará a sua força e a sua coragem contra o rei do Sul, à frente de grande exército. O rei do Sul sairá à batalha com um grande e poderoso exército, mas não prevalecerá, porque farão planos contra ele.” Daniel 11: 24-25. Sem dúvida, ela representou um grande sucesso – dependendo do ponto de vista. Jerusalém foi tomada no dia 15 de julho de 1099.

Em seu zelo religioso os invasores cristãos passaram ao fio de suas espadas consagradas todo muçulmano e até mesmo todo judeu que encontraram no interior da cidade. “Os homens caminhavam com o sangue acima de seus tornozelos”.10 A carnificina foi “tão terrível quanto a pior já registrada na História”.11

Diante de uma tal vitória, relata um observador contemporâneo, os cristãos se ajoelharam em adoração e com lágrimas de regozijo renderam graças.12

A sexta cruzada assumiu caráter único. O rei Frederico II, que era capaz de falar diversos idiomas – inclusive o árabe ~ conseguiu subjugar Jerusalém, Belém e Nazaré através de negociação, sem haver derramado uma só gota de sangue.

Mas nem todas as cruzadas obtiveram sucesso uniforme. Algumas delas, particularmente a cruzada das crianças, foram desastrosas. A sétima cruzada não foi “nesta última vez como foi na primeira”. (Verso 29). Neste aspecto, a cruzada final ao Oriente Médio representou uma confirmação dos desastres, pois o piedoso monarca Luís IX foi feito prisioneiro no Cairo, Egito. Dez anos mais tarde, o sultão egípcio e seu general, Baibans, expulsaram os cristãos da Palestina definitivamente (até 1917).

Durante as cruzadas, os muçulmanos alugavam navios de guerra gregos, a fim de auxiliá-los na oposição aos cruzados. Estes são os “navios de Quitim do verso 30. (De “Quitim” significa “do Ocidente”). Embora a cristandade romana tenha finalmente sido derrotada nas cruzadas, o comércio entre a Europa e o Oriente foi grandemente estimulado pelas mesmas; os comerciantes italianos de Veneza e Gênova tornaram-se particularmente ricos. (Verso 28). Os europeus desenvolveram o gosto pelo açúcar, algodão, espelhos de vidro, guardanapos muitos outros produtos do Leste.  

Os ‘dois reis’ que se “empenham em fazer o mal, e a uma só mesa falarão mentiras” – mas sem prosperar (verso 27), representam a perfídia e a hipocrisia que tão bem caracterizaram a experiência das cruzadas. Os historiadores chamam a atenção para a mútua desconfiança entre os aliados de ambos os lados, especialmente do lado cristão. Mais especificamente, estes “reis” podem representar líderes cristãos como Reginaldo Chatillon e Guy de Lusignon, que desavergonhadamente violaram solenes tratados de paz estabelecidos com o generoso sultão islâmico Saladin.13 Eles também podem representar vários outros líderes cristãos e mulçumanos que estabeleceram e violaram tratados de acordo com o que as oportunidades sugeriam, bem como grande número de cruzados que prometeram segurança aos habitantes de povoações muçulmanas caso estas se rendessem, tão somente para quebrar logo depois sua palavra, massacrando desapiedadamente estas mesmas populações.14 […]

Tragicamente, o papado carrega sobre si a responsabilidade primária pelas cruzadas e suas inomináveis atrocidades. O Papa Urbano II lançou a primeira campanha. Se ele pode ser parcialmente. desculpado, um vez que supostamente não conseguiu antecipar plenamente os bárbaros desdobramentos consecutivos, o que dizer dos Papas Eugênio III, Gregório VIl, Clemente III, Inocêncio III e Gregório IX, que entusiasticamente – estimularam cruzadas posteriores, mesmo sabendo muito bem quais seriam os prováveis eventos relacionados com as campanhas? Efetivamente, o papado foi incentivado pelo espírito das cruzadas do Oriente Médio, a iniciar cruzadas europeias igualmente horrendas contra os cristãos “heréticos”. Muitos destes “hereges” eram sinceros crentes na “santa aliança’ de Deus (versos 28 e 30). Se em alguma oportunidade Roma cristã obscureceu o ministério do tamid de nosso compassivo Sumo Sacerdote no santuário celestial, mais do que nunca isto ocorreu na era das cruzadas.

Não é de admirar, pois, que os muçulmanos, que certamente não ignoram a sua História passada, hesitem até hoje em aceitar Jesus Cristo!

Não é de admirar, igualmente, que a cristandade medieval tenha sido apresentada em cores tão escuras nas páginas de Daniel!

Diante de um quadro como este, torna-se evidente que a “abominação desoladora” não pode ser confinada a um ídolo de metal erguido temporariamente por Antíoco Epifânio sobre um altar de pedra na antiga Jerusalém. Muito mais apropriado é considera-la como este vasto sistema de crenças e práticas que durante mais de mil anos desviou as pessoas do ministério sacerdotal de Jesus, privando-as do acesso ao “príncipe da aliança” mencionado no verso 22 (senão leu ainda, leia O Império contra Ataca).

Os “entendidos” que que “cairão pela espada, e pelo fogo, pelo cativeiro e pelo roubo” (verso 33) são o heroico povo de Deus, muito bem representado pelos valdenses, lolardos, hussitas, luteranos, anabatistas e huguenotes, que preferiram morrer afogados ou enforcados ou queimados na estaca ou torturados ou aprisionados, a abdicar de sua fé (veja Daniel Capítulo 7). Este grupo certamente também inclui devotos católicos romanos que mantiveram sua lealdade a Deus quando os protestantes, movidos pelo mesmo espírito de tirania medieval, lhe infligiram a perseguição reacionária.

O rei que haveria de se levantar e engrandecer “sobre todo deus” (verso 36), foi sem dúvida o papado medieval! Não que algum papa tenha alguma vez pretendido isto. Nenhum papa pretendeu colocar-se acima de Deus. Mas quando os papas pretenderam assumir o direito de matar as pessoas que Deus amava e de modificar os Dez Mandamentos que Deus outorgou no Monte Sinai, não é verdade que eles se exaltaram acima de Deus (veja o estudo A mensagem de Daniel 7)?

Quando os papas medievais contrataram exércitos com o fito de alcançar sus fins políticos; quando Júlio (que a si mesmo atribuiu o título de Júlio César II) conduziu seus próprios exércitos em batalha, não estava o papado colocando sua confiança no “deus das fortalezas“? (Verso 38). E o novo deus que seria honrado com ouro e prata e pedras preciosas (verso 38) – não é ele porventura a Bendita Virgem que, em toda a sua pureza e compaixão maternal, com muita frequência ocupou na devoção católica um lugar mais destacado que aquele  pertencente a seu divino Filho?

Quando lembramos que o “príncipe da aliança” é Jesus, e não meramente Onias III, e que a “abominação desoladora” ainda era um evento futuro nos dias de Jesus, constatamos que, em última análise, a mensagem de Daniel 11 é a mesma que a dos capítulos 7 e 8. Em Daniel 11, Deus nos adverte que, procedendo dos impérios seculares da Terra, apareceria uma entidade político- religiosa, a qual deveria (1) substituir o ministério sacerdotal de cristo por uma contrafação humana e (2) perseguir as pessoas que tentassem manter sua fé voltada para o verdadeiro Cristo.

Uma vez que os ensinamentos medievais persistem até hoje nas várias denominações cristãs – obscurecendo o ministério celestial de Cristo, ignorando o julgamento especial que já se encontra em processo e persuadindo as pessoas de que elas não necessitam guardar todos os Dez Mandamentos – a “abominação desoladora” ainda se encontra hoje em operação. A advertência de Daniel 11 é a evidência de que Deus Se importa conosco o suficiente para alertar-nos quanto ao perigo e dirigir-nos para Si próprio.

Esta imagem não está no livro Uma Nova Era Segundo as Profecias de Daniel

O que dizer quanto a Daniel 11:40 – 45? Até este momento não falamos coisa algum a respeito dos versos 40-45. O último destes versos estabelece um paralelo parcial da carreira e morte de Roma cristã.

Segundo vimos nos estudos de Daniel Capítulo 8 , a mais grave falta de Roma cristã foi o fato de ela haver obscurecido o trabalho de Jesus Cristo no santuário celestial. Em Daniel Capítulo 7 a cristandade romana é vista sobre o símbolo de um chifre pequeno sobre a cabeça de um animal simbólico de aparência extremamente desagradável. Tendo em vista a punição do animal face a suas atividades errôneas, é ele selecionado para menção especial em Daniel 7:11 e 26 – e aí aparece em conexão com o julgamento pré -advento. O destino atribuído ao animal é o de ser “morto e o seu corpo desfeito e entregue para ser queimado pelo fogo”, uma vez que “se assentará o tribunal para lhe tirar o domínio e o consumir até o fim”.

Em Daniel 11:45 o “rei do Norte dos últimos dias irá armar “as suas tendas palacianas entre os mares contra o glorioso monte santo; mas chegará ao seu fim, e não haverá quem o socorra”. O “glorioso monte santo” parece ser uma metáfora para o templo de Jerusalém que, por sua vez, simboliza o santuário celestial. Armar “tendas palacianas” entre o Mar Mediterrâneo e o templo de Jerusalém, simboliza a usurpação, por parte do rei do Norte, das prerrogativas de Cristo no santuário celestial. Como consequência desta usurpação, o rei do Norte será punido – à semelhança do animal do chifre pequeno de Daniel 7, que é figura paralela do rei – de tal modo que “chegará ao seu fim, e não haverá quem o socorra”. O poder representado pelo chifre pequeno e o rei do Norte aparentemente representam o mesmo poder terrestre.

Alguns destes assuntos tornar-se-ão mais claros quando chegarmos ao estudo de Apocalipse […]. Contudo, quanto aos eventos precisos que acompanharão o cumprimento desta profecia, a sabedoria parece sugerir que não os conheceremos até que eles ocorram efetivamente.

Nem sempre o propósito da profecia é prover conhecimento prévio de eventos futuros específicos. Muitas profecias bíblicas têm sido concedidas com a intenção de que elas venham a ser compreendidas – e assim contribuam para o fortalecimento da fé – apenas depois de seu cumprimento. Foi por isso que Jesus falou o seguinte a respeito de uma predição que envolvia Sua própria Pessoa: “Isso eu falei agora, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vocês creiam.” João 14:29.

Compare com João 13:19: “Desde já lhes digo isso, antes que aconteça, para que, quando acontecer, vocês creiam que Eu Sou.”

E ainda com João 16:4 : “Mas estou falando essas coisas para que, quando chegar a hora, vocês se lembrem de que eu já tinha dito isto para vocês.”

O impulso de esquematizar o futuro em detalhes, tem levado ao embaraço muitos cristãos sinceros, ao longo dos séculos. O Armagedom, por exemplo, provavelmente foi proposto cm relação a maior número de datas, por entusiásticos estudiosos da Bíblia, do que qualquer outro evento mundial. Seria você capaz de imaginar a excitação que pulsou em milhares de corações cristãos quando em 1918 os jornais faziam o relato dos progressos do General E. H. Allenby à medida que ele se aproximava do exército otomano acampado em Megido, na Palestina? Megido é o local tradicionalmente identificado com o Armagedom!

Por outro lado, achamo-nos em boa companhia quando desejamos esquematizar o futuro! Os próprios discípulos de Cristo, aparentemente, esqueceram durante algum tempo a advertência do Mestre, de que a abominação desoladora ainda pertencia ao futuro, em seus dias. Poucos momentos antes de Ele apartar-Se deles através da ascensão, eles ainda Lhe perguntavam se Ele iria estabelecer imediatamente o Seu reino eterno!

Jesus lhes respondeu que não lhes competia “conhecer tempos ou épocas” que Deus decidira manter em segredo. Atos 1:7. Nos poucos segundos remanescentes para a Sua permanência entre eles na Terra, esforçou-Se por desviar a atenção dos discípulos de esquemas relativos ao reino futuro, para uma promessa-profecia que Ele evidentemente considerou ser muito mais importante.

Disse o Mestre: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis Minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da Terra.” Atos 1:8

Jesus, que conhece a nosso respeito tudo quanto possa ser conhecido, sabia naquele dia – e evidentemente sabe ainda hoje – que o único remédio para as hostilidades humanas é a nova aliança, com suas promessas de (1) perdão, (2) poder para uma vida nova e (3)  um lugar entre o povo escolhido de Deus (veja Daniel Capítulo 8). Ele quer que apresentemos este concerto a todas as pessoas, em todos os lugares, pelo poder de Seu Espírito.

A inferência é óbvia. Quando as boas novas relativas ao concerto e ao reino tiverem sido levadas pelo poder do Santo Espírito “a todo o mundo”, então – e somente então -“virá o fim”. S. Mateus 24: 14.

Referências:

9. Previté-Orton, Medieval History, pag. 522

10. Thompon and Johson, Medieval Europe, pág. 528

11. William Ragsdale Cannon, History of Christianity in the Middle Ages: From the Fall of Rome to the Fall of Constantinople (New York: Abingdon Press, 1960) Pág. 172

12. Thompon and Johson, Medieval Europe, pág. 529

13. Previté-Orton, Medieval History, págs. 529-531.

14. Thompon and Johson, Medieval Europe, pág. 530

Tags , .Adicionar aos favoritos o Link permanente.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *