Resumo Romanos 7: Comentários George Knight

Fontes: Caminhando com Paulo através de Romanos

4ª Etapa: O caminho da santidade

Justiça Outorgada (Consentida)

-> Ressurreição e a Lei (7:1-25) : Libertação da condenação da lei

Uma comparação com o casamento

1Ou vocês não sabem, irmãos — pois falo aos que conhecem a lei —, que a lei tem domínio sobre uma pessoa apenas enquanto ela está viva? 2Por exemplo, a mulher casada está ligada pela lei a seu marido, enquanto ele vive; mas, se o marido morrer, ela ficará livre da lei conjugal. 3De modo que será considerada adúltera se, enquanto o marido estiver vivo, ela se unir com outro homem. Mas, se o marido morrer, ela estará livre da lei e não será adúltera se casar com outro homem. 4Assim, meus irmãos, também vocês morreram para a lei, por meio do corpo de Cristo, para que pertençam a outro, a saber, àquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de que frutifiquemos para Deus. 5Porque, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas despertadas pela lei operavam em nossos membros, a fim de frutificarem para a morte. 6Agora, porém, estamos livres da lei, pois morremos para aquilo a que estávamos sujeitos, para que sirvamos da maneira nova, segundo o Espírito, e não da maneira antiga, segundo a letra.

A lei e o pecado

-> Agora sob a autoridade do Espírito Santo

-> A salvação promove a integridade do ser humano. Por si mesmo o cristão não vence, mas no Espírito Santo e pela graça de Cristo. A natureza pecaminosa será liberta por Cristo.

7:1 “A Lei só pode exercer autoridade sobre um homem enquanto ele estiver vivo.” Romanos 7:1, Phillips.

Com Romanos 7 Chegamos a uma grande mudança no argumento de Paulo. Na última metade do capítulo 6, ele enfatizou que o crente não está sob o domínio do pecado. Agora, no capítulo 7, ele afirma que os crentes também não estão sob o domínio da lei.

Os paralelos entre os capítulos 6 e 7 são bastante convincentes. Em Romanos 6: 2, Paulo nos diz que o crente morreu para o pecado, em Romanos 7: 4 que eles morreram para a lei. Em Romanos 6: 7, 18 ele descreve os crentes como livres de pecado, e em Romanos 7: 4 eles estão livres da lei. Finalmente, em Romanos 6: 4 os crentes andam em novidade de vida, enquanto em Romanos 7: 6 eles servem em novidade de Espírito.

Nesses dois capítulos, Paulo indica que os cristãos olham para as coisas e experimentam a vida e até a religião de uma nova perspectiva. Romanos 7, em particular, é uma expansão da declaração de Paulo em Romanos 6: 14 de que “não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça”.

Na explicação parcial dessa declaração, o apóstolo já usou ilustrações relacionadas ao batismo e escravidão. Agora, em Romanos 7: 1-6, ele faz uma analogia com a lei do casamento.

Para perceber a força da ilustração, precisamos lembrar que guardar a lei era a maneira que os judeus piedosos esperavam obter a salvação. O jovem rico que disse a Jesus que havia observado todos os mandamentos era muito sincero em seu desejo de perfeição (Mat. 19: 16-30), e quando Paulo escreve que, como fariseu, ele não tinha culpa em relação à lei (Fil. 3: 6), ele estava falando em termos de fato sóbrio no que diz respeito ao

A mente farisaica percebia coisas. Ainda assim, em Cristo ele encontrou uma nova vida, novo poder, nova alegria e nova paz que ele nunca havia conhecido antes.

Em Romanos 7: 1-3, usando o relacionamento conjugal como analogia, ele observa que a esposa está ligada ao marido enquanto ele viver, mas que após sua morte ela está livre para se casar com outro. O argumento de Paulo é complexo, mas seu significado é claro. Como F. F. Bruce aponta, “a morte – a morte do crente com Cristo – rompe o vínculo que antes o prendia à lei, e agora ele está livre para entrar em união com Cristo”. A lei provou ser infrutífera como meio de salvação. A união com a lei trouxe pecado e morte, mas a união com Cristo traz vida eterna.

7:4 “Portanto, meus irmãos, vós também morrestes para a lei pelo corpo de Cristo, para que pertenças a outro, àquele que foi ressuscitado dentre os mortos, a fim de que possamos dar frutos para Deus.” Romanos 7: 4, NIV.

Mortos para a Lei! Em Romanos 7:1-3, notamos que a morte põe fim à obrigação legal do casamento. Agora, no versículo 4, Paulo aplica essa ilustração à experiência cristã, mas com uma ligeira mudança de caráter. A ilustração dos versículos 1-3 mostra a morte do marido libertando a esposa da lei. Mas, na aplicação do versículo 4, a morte do eu pecaminoso libera os crentes da condenação e domínio da lei e os liberta para se unirem a Cristo.

E como é que os cristãos “morreram para a lei”? Essa morte ocorreu quando eles permitiram que seus velhos fossem “crucificados” com Cristo ao entrarem na sepultura aquosa do batismo (ver Romanos 6: 3-6). A morte do crente com Cristo é uma morte para a lei como forma de salvação.

Confiar na graça de Deus significa matar qualquer confiança na lei como o caminho para o céu.

Cristãos são aqueles que sabem que não têm nada de bom em si mesmos, que Deus não deu a lei para salvar as pessoas e que a fé em Jesus é o único caminho para a vida eterna. Eles morreram para todas as formas de autossuficiência e observadores da lei como o caminho para a vida.

Neste ponto, devemos ter cuidado. Foi o crente que morreu, não a lei. A lei ainda está viva e bem, e como Paulo vai apontar um pouco mais adiante no capítulo, a lei é santa, justa, boa e espiritual (Rom. 7: 12,14). Mas Deus nunca deu para que as pessoas pudessem se salvar por guardá-lo.

A lei não morreu. Como João Calvino, o grande reformador, observa, “devemos lembrar cuidadosamente que esta não é uma liberação da justiça que é ensinada na lei.” A lei ainda permanece como a grande norma de justiça de Deus, ainda condena o pecado daqueles que a violam e ainda empurra homens e mulheres ao pé da cruz para a purificação da culpa e do pecado. Mas não tem poder de limpeza em si mesmo. Quando as pessoas morrem para a lei como meio de salvação, então elas podem ser ressuscitadas e casadas novamente com o verdadeiro plano de salvação de Deus em Cristo.

E nessa nova união eles produzirão frutos para o reino de Deus. Esse fruto, como Paulo observou em Romanos 6:22, seria fruto para “santidade”.

7:5 “Enquanto vivíamos na carne, nossas paixões pecaminosas, despertados pela lei, estavam operando em nossos membros para produzir frutos para a morte.” Romanos 7: 5, RSV.

O que Paula significa por “viver na carne”? Precisamos dar uma olhada no uso que Paulo faz dessa frase em seu contexto. “Carne” é uma palavra importante para Paulo. De suas quase 150 aparições no Novo Testamento, ele a usa mais de 90 vezes. Mas ele utiliza a palavra de muitas maneiras diferentes. Em Romanos 6:19, por exemplo, ele empregou a carne no sentido de fraqueza corporal que levou à fraqueza moral. Tem esse sentido no texto de hoje.

Assim, quando Paulo fala no passado sobre os cristãos “vivendo na carne “ele se refere ao tempo quando eles” eram controlados pela natureza pecaminosa”(NVI). A natureza pecaminosa é caracterizada por “desejos carnais com suas perspectivas”. Nesse sentido, Paulo compara” viver na carne “em Romanos 7:5 com viver no Espírito no versículo 6. O primeiro revela o que ele e outros cristãos tinham quando viviam sob o domínio do pecado, enquanto o segundo veio com o domínio da justiça.

Não devemos comparar o viver na carne com o viver em um corpo terreno. Em vez disso, Paulo está falando sobre o fato de que quando os romanos viviam de acordo com sua natureza inferior (sua natureza pecaminosa), a lei despertava suas paixões pecaminosas e produzia frutos mortais.

E como, você pode estar se perguntando, algo tão bom e santo como a lei de Deus despertou paixões pecaminosas e produziu a morte nas pessoas? Para obter a resposta a isso, precisamos voltar e olhar o que Paulo já disse em Romanos sobre a lei. Em Romanos 3:20 ele apontou que a função da lei é identificar o pecado, em Romanos 4:15 ele acrescentou que a lei traz ira e condenação, e em Romanos 5:20 Paulo chegou a dizer que a lei é o aumento do pecado no sentido de tornar explícito o significado dele. Aqueles que têm a lei, nesse sentido, têm motivos para definir mais coisas como pecado do que aqueles que não têm lei.

Mas aqui em Romanos 7: 5, Paulo parece ir um pouco mais longe ao indicar que a própria lei produz o pecado. Como? Pense por um momento na criança pequena a quem você diz: “Não, não toque nisso!” Qual é a primeira coisa que ele ou ela faz? Muitas vezes, com cautela, estender um dedo para tocar o objeto proibido. Da mesma forma, aqueles que “vivem na carne” são tentados a se rebelar contra Deus. A resposta de Deus é o renascimento espiritual para que as pessoas não “vivam mais na carne”, mas no Espírito.

7:6 “Mas agora estamos dispensados da lei, mortos para isso que nos manteve cativos, de modo que não sejamos escravos sob o código escrito antigo, mas na nova vida do Espírito.” Romanos 7:6, NRSV.

No passado, Paulo diz aos romanos, eles foram mantidos cativos da condenação da lei. As pessoas podem ter feito o possível para mantê-lo a fim de escapar da punição, mas o melhor nunca foi bom o suficiente. Escravos da lei, eles não tinham segurança ou paz genuína com Deus.

Mas as coisas mudaram quando eles perceberam a plenitude do evangelho, incluindo o que Deus havia feito por eles por meio de Cristo. Nesse ponto, a obediência se tornou uma resposta ao amor. Foi um amor transformador com o poder do Espírito Santo de Deus.

Os cristãos podem estar livres da escravidão da lei, mas essa liberdade não significa liberdade para fazer o que a lei proíbe (ver Rom. 6:1, 15; 3:31). A liberdade da lei não oferece licença para pecar. Exatamente o oposto. Pela primeira vez em suas vidas, aqueles que se tornaram cristãos são realmente capazes de guardar a lei, pois renasceram pelo Espírito Santo. Agora eles não mais encaram a lei como um legalista severo, mas como alguém que está apaixonado e pode dizer com Davi: “Oh, como amo a tua lei” (Salmo 1 19:97, RSV).

7:7 “Pelo contrário, eu não teria conhecido o pecado, exceto por meio da Lei; pois eu não saberia sobre a cobiça se a Lei não havia dito: “Não cobiçarás”.” Romanos 7: 7, NASB.

“Pelo contrário.” Em seu contexto, o versículo significa “Claro que a lei não é pecado, porque é a lei que define o pecado.”

Em Romanos 1:20 e 2:14,15, Paulo destacou que mesmo aqueles que não têm a lei revelada têm uma ideia do que é certo e errado. Mas essas pessoas sem a lei realmente não veem o mal como algo contra Deus. Como Leon Morris aponta, “há uma grande diferença entre a violação de um código moral humano e o pecado, aquela coisa má que Deus proíbe. É preciso que a lei mostre que a transgressão é pecado.” E ver a transgressão como pecado contra Deus ajuda as pessoas a sentir o peso do pecado e a necessidade de um Salvador. Portanto, a lei tem uma função salvífica indireta.

Paulo ilustra sua afirmação de que ele nunca teria conhecido o pecado sem a lei, referindo-se ao décimo mandamento. Essa é uma escolha interessante e perspicaz porque é o único dos Dez Mandamentos que se move explicitamente além das ações externas para a raiz interna que sustenta os atos pecaminosos. Ou seja, adorar um ídolo, guardar o sábado, roubar e honrar os pais são todos comportamentos externos ou ações externas. Por causa disso, a maioria das pessoas, incluindo muitos fariseus nos dias de Paulo, identifica o pecado como um comportamento.

Paulo, ao selecionar deliberadamente o décimo mandamento, vai além do comportamento para a motivação luxuriosa que o sustenta. Em outras palavras, ele está dizendo que o pecado é muito mais profundo do que nossos atos externos. Jesus fez a mesma coisa no Sermão da Montanha quando ilustrou a altura, a profundidade e a largura do pecado em Sua discussão sobre assassinato e adultério no coração. Novamente, Ele levantou o mesmo ponto em Mateus 15:18, 19, no qual afirmava que as ações pecaminosas procediam de um coração corrupto.

A escolha do décimo mandamento pelo apóstolo é uma contribuição extremamente importante para a nossa compreensão da lei e do pecado precisamente porque vai além da superfície e os relaciona com aquele egocentrismo pecaminoso que leva as pessoas a cometer atos de pecados no mesmo sentido dos outros nove mandamentos.

Assim, Paulo se recusa a ver o pecado e a conversão a Cristo como questões superficiais. Com ele, ambos são questões do coração. Isso também se aplica tanto à violação quanto à manutenção da lei. A lei tem um nível mais profundo do que o mero comportamento.

7: 7 – 9 “Que diremos, então? Que a lei é pecado? De modo nenhum! Mas eu não teria conhecido o pecado, a não ser por meio da lei. Porque eu não teria conhecido a cobiça, se a lei não tivesse dito: “Não cobice.” Mas o pecado, aproveitando a ocasião dada pelo mandamento, despertou em mim todo tipo de cobiça. Porque, sem lei, o pecado está morto. Houve um tempo em que, sem a lei, eu vivia. Mas, quando veio o mandamento, o pecado reviveu, e eu morri.” 

Paulo fora um homem orgulhoso. Era um fariseu entre os fariseus, um dos mais zelosos da sua seita. Se qualquer deles pudesse ter guardado a lei perfeitamente, esse teria sido Paulo.

Ele estava muito bem. Adorava a Deus de maneira suprema, não se inclinava aos ídolos nem tomava o nome de Deus em vão, e era cuidadoso em guardar as inúmeras regras a respeito da observância do sábado. Tampouco cometera adultério, roubara, ou dissera falso testemunho. Afinal, concluíra, ele era uma pessoa bastante boa. Paulo tinha boas razões para ter certa presunção religiosa.

No entanto, ele viu a luz. Viu um mandamento “diferente”, aquele que diz “Não cobiçarás”. De repente o pecado tomou uma nova forma. Afinal, esse pecado implica uma atitude mental e não um ato físico.

É verdade que ele evitara o próprio ato do roubo, do adultério e outros mais, mas aqui Paulo, o fariseu, esbarrara no significado mais profundo da lei. A lei também tinha que ver com as atitudes.

“Não cobiçarás” atingiu Paulo como um raio. Ele começou a compreender o significado mais profundo da lei e sentiu-se, conforme as palavras de Isaías, “destruído”. Ou como o próprio Paulo coloca: “O pecado reviveu, e eu morri.”

Paulo podia ficar feliz com suas realizações enquanto estava lidando com a letra da lei, mas sua ilusão de conduta perfeita foi esmagada de uma vez por todas quando ele compreendeu a verdadeira profundidade da lei.

A experiência de Paulo deve ser também a nossa. A profundidade do problema do pecado é revelado no espírito da lei e somos conduzidos até a cruz, onde também morremos para toda esperança em nós mesmos ou nas realizações próprias. [Caminhando com Jesus no Monte das Bem Aventuranças]

7:8 “Pecado, aproveitando a oportunidade por meio do mandamento, produziu em mim cobiça de todo tipo; pois separado da Lei está morto.” Romanos 7: 8, NASB.

Mais uma vez Paulo personifica o pecado – desta vez como um agressor militar. A palavra usada para “oportunidade” originalmente significava um ponto de partida ou base de operações para uma expedição, especialmente uma campanha militar. Assim, ele descreve o pecado como um agressor para desencaminhar as pessoas.

E como o pecado cumpre sua tarefa? Surpreendentemente, Paulo sugere que o pecado usa o mandamento para sua tarefa maligna. Então, mais uma vez, ele emprega o décimo mandamento para ilustrar seu ponto: “O pecado, aproveitando o mandamento, produziu em mim cobiça de toda espécie.”

Como o mal pode usar o “bom” mandamento de Deus (Rom. 7:12) para produzir o pecado? Paulo já havia aludido a essa questão no versículo 5, no qual afirmava que a lei despertou nossas paixões pecaminosas. Aqui, no versículo 8, ele leva sua lógica à sua conclusão natural ao declarar que a lei produz o pecado.

Como? Pense sobre isso por um minuto. Lembra-se da ilustração que usamos ao discutir o versículo 5 – que quando você diz às crianças para não tocarem em certo objeto, elas de repente têm um desejo irresistível de cuidadosamente estender um dedo para fazer a coisa proibida?

Nossas mentes adultas funcionam quase da mesma maneira.

O comando de não cobiçar desperta nele pensamentos sobre fazer isso.

Assim, embora os mandamentos sejam bons, o pecado leva a pessoa não renovada a vê-los como uma limitação à liberdade e, portanto, uma causa de ressentimento e oposição. Sem algo contra o que se rebelar, não há rebeldes.

O verdadeiro culpado, Paulo está nos dizendo, não é a lei, mas o pecado, que é hostil à lei (Rom. 8: 7). O pecado distorce a função da lei de expor o pecado para provocá-lo.

7:9 “Eu vivia separado da Lei; mas quando o mandamento veio, o pecado tornou-se vivo e eu morri.” Romanos 7:9, NASB.

Em seu contexto, as palavras de Paulo não afirmam tanto que ele não tinha conhecimento da lei, mas sim que ele não tinha percebido toda a força e profundidade das exigências da lei e, portanto, carecia de convicção pessoal de seu pecado. Em Filipenses 3: 6, por exemplo, ele se lembra dos dias em que se considerava “irrepreensível” “quanto à justiça perante a lei” (RSV). Como o jovem governante rico, ele se parabenizou por ter guardado os mandamentos desde a juventude (Mat. 19:20). E como o fariseu que orava, ele podia ser grato por não ser um pecador como as outras pessoas (Lucas 18:11).

“Mas quando o mandamento veio, o pecado tornou-se vivo.” Quando Paulo finalmente sentiu o significado completo, a força total da lei, quando a lei se tornou viva para ele, naquele ponto ele percebeu que era realmente um pecador. Se, por exemplo, ele tem em mente a ordem de não cobiçar, ele de repente percebeu que foi infectado pelo egocentrismo. Que ele não era realmente tão “inocente” quanto pensava que era.

Nesse ponto, o pecado ganhou vida nele. O pecado, é claro, sempre existiu, mas à luz do mandamento ele pôde reconhecê-lo pela primeira vez pelo que era. Ele não poderia mais ignorar sua existência. Porque ele passou a ver toda a profundidade do mandamento, ele também percebeu que era realmente um pecador, apesar de seu orgulho pecaminoso de sua justiça.

O resultado? Ele morreu. Essa morte não é a morte do cristão para o pecado da qual ele falou em Romanos 6:2, mas a morte para seu orgulho espiritual, autoconfiança e autossuficiência. Ele percebeu sua desesperança, que a lei, quando ele realmente a entendeu, o deixou na miséria.

A experiência de Paulo é a de cada pessoa. Todos devem chegar ao ponto de morrer para sua retidão pessoal, sua capacidade de guardar a lei por conta própria, sua capacidade de ganhar sua própria salvação. Foi nesse ponto que eles começaram a sentir a necessidade da justiça de Cristo para cobrir sua esterilidade. Assim, a plena luz da lei nos aponta para Cristo como nossa única esperança.

7: 10 – 11 “O próprio mandamento que prometia vida provou ser morte para mim. Pois o pecado, encontrando oportunidade no mandamento, me enganou e por isso me matou.” Romanos 7:10, 11, RSV.

Paulo está certo quando disse que o mandamento prometia vida. Deus nunca pretendeu Sua lei para a morte. Ele o criou como um padrão de justiça. Apresenta os princípios que conduzem à vida. O salmista foi muito claro sobre a bem-aventurança daqueles “que andam na lei do Senhor” (Salmo 119: 1, 2). E até mesmo Jesus disse a um intérprete da lei judeu que se ele guardasse a lei viveria (Lucas 10:28).

O problema é que, desde a queda de Adão, tem sido impossível para as pessoas obedecerem totalmente à lei de Deus. Ellen White deixa esse ponto explícito quando escreve que “era possível para Adão, antes da queda, formar um caráter justo pela obediência à lei de Deus. Mas ele falhou em fazer isso, e por causa de seu pecado nossa natureza caiu e nós não podemos nos tornar justos. Visto que somos pecadores, ímpios, não podemos obedecer perfeitamente à santa lei” (Caminho para Cristo, pág. 62).

Mas o pecado não nos diz isso. Em vez disso, nos assegura que, se tentarmos o suficiente, nos tornaremos bons o suficiente, que podemos até mesmo nos tornar perfeitos sem pecado por meio da obediência à lei. Ou, como diz Paulo, “o pecado, encontrando oportunidade no mandamento”, faz nos enganar ao acreditar em uma mentira.

A mentira é que podemos fazer isso por conta própria, que podemos nos tornar boas pessoas ao guardar a lei, que podemos até mesmo fazer com que Deus pareça bom fazendo o que Ele ordenou. O engano que prendeu Paulo e outros é que ninguém espera que o mandamento de Deus seja a ocasião da morte. Visto que a lei parece ser o caminho para a vida, quando na verdade não é, o pecado utiliza o mal-entendido para causar a morte.

É interessante que toda religião falsa, incluindo abordagens errôneas do cristianismo, de uma forma ou de outra se baseia no esforço próprio, na justiça própria e na autoconfiança. O Desire of Ages [Desejado de Todas as Nações] afirma que “o princípio de que o homem pode salvar a si mesmo por suas próprias obras está na base de toda religião pagã; tinha… se tornado o princípio da religião judaica” (pp. 35, 36).

A lei, com todos os seus pontos positivos, nunca procurou salvar [ninguém] do pecado. Acreditar nisso só nos levará à morte eterna. Suponho que se Paulo pudesse ter apenas um lema, seria “Olhe para Jesus”.

7:12 “Portanto a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom.” Romanos 7:12.

Com o versículo de hoje, o apóstolo deu uma volta completa no argumento que tem apresentado desde o versículo 7, no qual ele retrata seus detratores perguntando se a lei é pecado. Ele criticou essa sugestão com seu usual “de forma alguma” ou “certamente não”. Mas ele fornece uma segunda resposta no versículo de hoje: A lei não só não é pecado, mas, ao contrário, é “santa, e o mandamento santo, justo e bom”.

O pecado pode ter abusado da lei e os pecadores podem tê-la feito uso incorreto, como Paulo enfatizou em Romanos 7: 8-11, mas isso não é um reflexo da própria lei. O apóstolo permite que seus leitores saibam que o culpado é o pecado e que a própria lei é válida. Na verdade, pelo resto do capítulo, ele continua a exaltar a lei, chamando-a de “espiritual” no versículo 14 e “boa” no versículo 16, enquanto afirma que seu “homem interior” se deleita com ela no versículo 22. Não há a menor dúvida de que o apóstolo Paulo tem sentimentos extremamente positivos sobre a lei. Sua expressão desses sentimentos positivos é tão definida quanto os negativos em relação ao uso incorreto da lei.

Paulo está em plena harmonia com as grandes passagens do Antigo Testamento que louvam a lei. No Salmo 19, por exemplo, Davi afirma que “a lei do Senhor é perfeita, reavivando a alma; o testemunho do Senhor é seguro, tornando sábios os simples; os preceitos do Senhor são retos, alegrando o coração; o mandamento do Senhor é puro, iluminando os olhos; o temor do Senhor é puro, duradouro para sempre; as ordenanças do Senhor são verdadeiras e totalmente justas. Mais desejáveis são elas do que o ouro, mesmo muito ouro fino; mais doces também do que o mel e os gotejamentos do favo de mel “(versículos 7-10, RSV).

Como afirma um autor, “o fato de que a lei revela, suscita e condena o pecado e traz a morte ao pecador não torna a própria lei má. Quando uma pessoa é justamente condenada e sentenciada por homicídio, não há culpa na lei ou com os responsáveis por guardá-la. A culpa é de quem infringiu a lei.”

Paulo, o cristão convertido, ainda ama a lei de Deus. Só agora ele vê como ele e outros o empregaram para propósitos que Deus nunca planejou. Mas, quando usado corretamente, é de fato [o mandamento] “sagrado, justo e bom”.

A lei em si mesma é boa, mas não é boa para todas as pessoas, em todas as circunstâncias. Certamente tinha seu lado negativo para os judeus do tempo de Cristo.

Talvez a melhor maneira de considerar a questão, seja através de um exame da história de Israel. Deus deu a lei a Moisés, o qual a transmitiu aos israelitas. Os israelitas, porém, no início de sua história não prestaram muita atenção às ordens de Deus.

Eles ofereciam sacrifícios no estilo pagão, adotavam os costumes dos povos das culturas vizinhas, e com frequência simplesmente ignoravam o conselho divino.

Em consequência, Deus enviou profeta após profeta para adverti-los e conduzi-los de volta à fidelidade. Mas, na maioria das vezes, Israel não dava atenção aos profetas.

O resultado foi o cativeiro babilônico, com seus 70 anos de exílio.

Depois de voltarem do cativeiro, um núcleo significativo de líderes religiosos e políticos dos judeus decidiram que não repetiriam a experiência. Observariam a lei e não se misturariam com povos pagãos, nem adotariam seus costumes.

E o resultado? Israel conseguiu cometer o erro contrário. Sob a liderança de grupos como os fariseus, eles fizeram da lei o fim em si mesma e a utilizaram como meio de separar-se de outras pessoas. Tomaram-se fanáticos observadores da lei. A religião se tornou uma incessante rotina de ritos e cerimônias. A lei se tornou o centro da vida deles. Nesse processo, deixaram de compreender que a lei só era boa se sua natureza espiritual fosse o centro da observância da lei.

Uma vez mais precisavam ouvir os profetas. Deviam ouvir Miqueias, que escreveu que Deus não está satisfeito com a mera obediência exterior do sistema sacrifical. Se a lei é observada em espírito, nós praticaremos a justiça, “amaremos a misericórdia” e “andaremos humildemente com Deus” (Miqueias 6:8).

Precisamos de equilíbrio em nossa vida. Precisamos ouvir tanto a lei como os profetas. Precisamos observar a lei no espírito que Deus tencionou que a observássemos. Então ela se tornará sempre boa.

7:13 “O que é bom tornou-se uma causa de morte para mim? Que nunca seja! Em vez disso, foi pecado, a fim de que pudesse ser demonstrado que era pecado, efetuando minha morte por meio do que é bom, de modo que, por meio do mandamento, o pecado se tornasse totalmente maligno.” Romanos 7:13, NASB.

Agora, aqui está um verso complicado. A New Living Translation nos ajuda a ver o significado com um pouco mais de clareza: “A lei, que é boa, causou minha condenação? Claro que não! O pecado usou o que era bom para provocar minha condenação. Para que possamos ver quão terrível  o pecado realmente é. Ele usa o bom mandamento de Deus para seus próprios propósitos malignos. “

Vejamos as três partes principais do nosso texto. Primeiro, Paulo apresenta seu argumento novamente usando uma pergunta: A boa lei foi o agente da morte? Como nas três perguntas anteriores nos capítulos 6 e 7, ele rejeita vigorosamente essa sugestão com a frase forte “De maneira nenhuma!” Não é a lei que causa a morte, mas o pecado.

Nessa conjuntura, Paulo passa para seu segundo ponto no versículo 13: O pecado usa a boa lei para trazer condenação, uma verdade que ele havia levantado anteriormente no versículo 10. Como é isso? A lei identifica o pecado não apenas como mal, mas como rebelião deliberada contra Deus e os princípios de Seu reino. Essa rebelião resulta em pena de morte. Mas não foi a lei que causou a morte; antes, o pecado identificado pela lei. É o ato de homicídio que merece punição e não a lei contra o homicídio. A lei tem a função boa e saudável de apontar o que está errado. Não devemos culpar a lei pelo crime. A culpa pertence ao pecado que o motivou.

Isso nos leva ao terceiro ponto do apóstolo: a “totalmente” malignidade do pecado. William Barclay nos ajuda a compreender o caráter “totalmente” do pecado quando ele pensa que “a malignidade do pecado é mostrada pelo fato de que ele poderia tomar uma coisa excelente, esplêndida e adorável, e torná-la uma arma do mal. Sim, isso é o que o pecado faz. O pecado pode tomar a beleza do amor e transformá-la em luxúria. O pecado pode tomar o desejo honroso de independência [financeira] e transformá-la em desejo por dinheiro e poder. O pecado pode tomar a beleza da amizade e usá-la como uma sedução para as coisas erradas. Isso é o que Carlyle chamou de ‘condenação infinita do pecado’. O próprio fato de que o pecado tomou a lei e fez da lei uma ponte para o pecado mostra a suprema malignidade do pecado.

7: 14 “Sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal vendido ao pecado.” Romanos 7:14, RSV.

Com Romanos 7:14 Encontramos uma parte altamente controversa do livro de Romanos. A maior parte do debate sobre Romanos 7: 14-25 centra-se em quem é o “eu”; quer seja Paulo, quer se refira às pessoas antes de se tornarem cristãs, ou a elas depois de o terem se tornado. Mas precisamos reconhecer que Paulo não está muito preocupado com nossas questões sobre a natureza humana, mas com a lei.

Infelizmente, é impossível interpretar suas palavras sem tomar posição sobre o que ele está insinuando sobre a natureza humana. Isso não seria tão ruim, mas ele aparece nestes 12 versículos para fazer declarações que se aplicam tanto aos convertidos quanto aos não convertidos. Assim, ele pode usar o “eu” no versículo 22 para descrever alguém que se agrada da lei de Deus e no versículo 14 para imaginar uma pessoa carnal. Quem quer que seja o “eu”, é uma pessoa em tensão entre o bem e o mal.

A solução mais adequada é ver o “eu” na passagem que vai de Romanos 7:14 a 7:25 como um verdadeiro cristão quando ele ou ela caiu em pecado. Essa condição não é o quadro completo de sua vida cristã, já que o aspecto da vitória dessa vida é muito claro no capítulo 8. Mas aqui estão indivíduos que conhecem o bem, mas clamam de angústia por sua miséria quando não fazem o que é pra fazer.

Todos os cristãos se identificam com essa passagem em um nível psicológico. Nenhum crente está completamente sem pecado. Todos nós estamos presos na tensão. Assim, o “eu” tem um aspecto existencial que todos enfrentamos na vida diária. Paulo ilustra esse aspecto existencial usando percepções de sua própria experiência.

Para compreender as expressões de Paulo, precisamos nos lembrar de como nos sentimos quando caímos em fazer o que sabemos ser errado, apesar do que gostaríamos de ser. Não sei quanto a você, mas meu grito é “desventurado homem que sou!” (Rom. 7:24). Tenho vontade de me esmurrar.

Lembre-se, o apóstolo não está descrevendo a totalidade da vida de um cristão. Mas mesmo que essa vida seja geralmente vitoriosa e os cristãos tenham a paz e a alegria de sua fé, em outras ocasiões eles ainda se identificam com Isaías, que declarou “Ai de mim! … Pois eu sou um homem de lábios impuros” (Isa. 6: 5, RSV), e com Pedro, que no meio de uma crise caiu aos pés de Jesus, exclamando: “Aparta-te de mim, porque sou um homem pecador, ó Senhor” (Lucas 5: 8).

7:14 – 15 “Porque bem sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado. Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto.”

O filósofo grego Platão não era cristão, mas observava atentamente a atividade humana. Platão comparou o eu interior das pessoas a alguém cuja tarefa era conduzir dois cavalos. Um cavalo era manso e obediente às rédeas e às palavras de ordem, mas o outro era selvagem, indomável e rebelde. O primeiro cavalo se chamava razão, enquanto o segundo se chamava obsessão.

Conquanto a maneira como Platão classificou o problema possa não estar totalmente correta do ponto de vista bíblico, sua análise do problema humano está bem próxima da de Paulo, e ilustra muito bem a luta que enfrentamos dentro de nós mesmos na vida diária.

Até mesmo cristãos convertidos têm de lidar com os resíduos do pecado em sua vida. Podemos ter novo coração e nova mente, mas os velhos modos de pensar e agir estão escondidos abaixo da superfície, prontos a saltar para fora e assumir o controle. Por isso, como diz Paulo, precisamos morrer dia após dia (I Cor. 15:31). Ou como escreveu Frank Belden, um adventista compositor de hinos: “O eu é pior do que um gato com sete vidas, e precisa ser destruído por meio da Palavra diariamente.” A santificação progressiva é verdadeiramente uma obra da vida inteira.

A raiz do problema humano é a obstinação da natureza pecaminosa. Quando me uni à igreja, achei que todos que ali estavam desejavam sempre fazer as coisas certas. Fiquei extremamente desapontado. Descobri que alguns pensavam estar sempre fazendo a coisa certa; mas eram tão semelhantes aos escribas e fariseus, que fiquei imaginando se eles já haviam se deparado com a primeira parte das bem-aventuranças. Sua arrogância espiritual simplesmente fazia com que criticassem os outros.

E importante que, como cristãos, compreendamos a profundidade do problema do pecado em nossa vida. Só então entenderemos nossa necessidade da generosa graça de Deus para perdão e para verdadeiramente guardarmos Sua lei. [Caminhando com Jesus no Monte das Bem Aventurança]

7:15 “Não consigo entender minhas próprias ações; Não ajo como desejo; pelo contrário, faço o que detesto.” Romanos 7:15, Moffatt.

Este versículo obviamente tem em mente alguém cujo coração está correto para com Deus. A pessoa sabe o que é certo e tem um desejo profundo de fazê-lo, mas comete ações que entram em conflito com esse desejo.

Por quê? Qual é o problema aqui? A resposta começa em Romanos 7:14, em que Paulo fala do eu dividido: “Nós sabemos que a lei é espiritual, mas eu sou carnal, vendido sob o pecado.” A palavra “carnal” aponta para a natureza humana em sua fraqueza de criatura. O apóstolo contrasta com ser espiritual, implicando assim uma inclinação para o pecado ou autoindulgência.

Paulo conclui o versículo 14 observando que ele não é apenas carnal e fraco, mas que está “vendido sob o pecado”. Essa frase, no mínimo, reflete um resíduo periodicamente recorrente da escravidão ao pecado que uma vez o governou o tempo todo, uma escravidão que o levou às vezes a fazer o que ele sabia ser errado.

A tensão entre saber e desejar o que é certo, mas de vez em quando fazer o errado, nos leva ao versículo 15, no qual Paulo declara que às vezes não entende suas próprias ações, pois nem sempre age como deseja, mas faz o que deseja, detesta. James Denney ressalta que apenas a ideia de “escravidão explica seus atos”.

É absolutamente imperativo, ao ler esses versículos, perceber que Paulo não está falando sobre os melhores tempos da vida cristã. Ele não está dizendo que nunca faz o que é certo, mas sim que não está tão livre de erros quanto gostaria. Nem está dizendo que faz o mal habitualmente ou nunca faz o bem. Claro, ele não está aqui preocupado com o bem. O apóstolo deseja isso e espera viver esse tipo de vida. O problema é que às vezes não. Usando a metáfora da escravidão, ele expressa o pensamento de que ainda considera o pecado uma força poderosa e que não conseguiu resistir a ele a todo momento.

As percepções de Paulo se encaixam muito bem com as de Jesus, que nos diz que Deus perdoa pecadores arrependidos 70 vezes sete vezes, e com João, que afirma que o ideal de Deus é que não pequemos de forma alguma, mas que, se o fizermos, como cristãos nós podemos confessar e Deus “perdoará os nossos pecados e nos purificará de toda injustiça” (1 João 1: 9, RSV)

7: 16-17 “Agora, se eu fizer o que não quero, concordo que a lei é boa. Mas, na verdade, não sou mais eu que faço isso, mas o pecado que habita em mim.” Romanos 7:16, 17, NRSV.

Nestes dois versículos, chegamos ao cerne do que Paulo está tentando nos dizer em Romanos 7:14-20. Seu ponto principal é que não é a lei que é o problema, mas nós, como pessoas imperfeitas.

No capítulo 7, Paulo responde a duas perguntas sobre a lei: Primeiro, é pecado? E em segundo lugar, isso trouxe morte? (Rom. 7:7, 8). Com sua afirmação de que a lei é “boa” no versículo 16, ele responde a ambas as perguntas.

Tudo bem então, se a lei é tão boa, por que ela cria tantos problemas para nós? É exatamente essa pergunta que Paulo responde em Romanos 7: 14-20.

Ao olharmos para sua resposta no texto de hoje, precisamos reconhecer várias coisas. Primeiro, como observamos acima, Paulo acreditava plenamente na bondade da lei. Assim, Paulo não se opõe à lei. Ele concorda com isso.

Além disso, o próprio fato de Paulo chamar a lei de boa quando ele fez o que não queria (infringiu a lei ou pecou) demonstra que não é o verdadeiro Paulo por trás da ação. Ou seja, seu novo homem, seu eu cristão, está confessando de todo o coração a bondade e a inculpabilidade da lei. Como uma pessoa redimida, ele deseja honrar a profundidade da lei e cumpri-la perfeitamente.

Todo cristão é como Paulo nesse sentido. Cada um tem um senso de excelência moral da lei e um desejo de estar em harmonia com ela. Além disso, quanto mais maduros os cristãos se tornam, quanto mais percebem a santidade, a glória e a bondade da lei de amor de Deus, maior será seu desejo de estar em harmonia com ela.

Paulo sabe que não é a lei que falha na tensão que ele experimenta, mas o “pecado que habita dentro dele”. O apóstolo descobriu o que cada um de nós também aprende. Pecado, nas palavras de Leon Morris, não é mais o “convidado de honra” que costumava ser antes da conversão, “nem o inquilino pagante, mas o ‘posseiro’, não legitimamente presente, mas muito difícil de ser expulso”. Wesley, como observamos anteriormente, disse quase a mesma coisa quando comentou que na vida de um cristão o pecado não reina mais, mas permanece.

7:18 “Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em minha carne. Posso desejar o que é certo, mas não podendo fazer.” Romanos 7:18, NRSV.

Que a Lei é boa Paulo não tem a menor dúvida. Não é a lei que é o problema ou a causa de sua tensão. Em vez disso, é sua “carne”. Quanto à carne, Paulo diz que ela não tem “nada de bom”. Assim, o contraste é cristalino: lei “boa”, mas “nada de bom” em Paulo.

Isso é verdade mesmo? Não há nada de bom em Paulo? Afinal, ele não acabara de dizer que aprovava a lei e desejava em seu íntimo cumpri-la? Esses são certamente bons atributos.

Precisamos reconhecer que o apóstolo usa um qualificador quando fala do “nada de bom”. Ele nos alerta para o fato de que o “nada de bom” nele realmente se refere à sua “carne”. Aqui, Paulo está usando a carne para se referir à sua “natureza pecaminosa”. Assim, ele na verdade contrasta sua natureza inferior (seu eu carnal) com sua natureza superior (seu eu espiritual).

No processo de compreender o significado de carne de Paulo, precisamos perceber que ele não concordava com aqueles filósofos gregos que ensinavam que a carne era má em si mesma. Ao contrário, ele ansiava pela verdadeira ressurreição do corpo – algo impensável para os gregos que viam a existência física como má. Para Paulo, o problema não era que a carne fosse inerentemente má, mas fraca, propensa a sucumbir à tentação e incapaz de sempre fazer o bem que aprovava. Ernst Kasemann é útil aqui quando observa que “a carne é, terminologicamente, a oficina do pecado”. E, como sabemos, o diabo é especialista em saber como manipular aquela “oficina” particular.

Antes de deixar o versículo 18, precisamos reconhecer onde ele vai além dos versículos 15 e 16 ao falar sobre o tópico da fraqueza humana. Nos versículos anteriores, Paulo nos disse que não pode parar de fazer coisas que desaprova. Mas aqui ele acrescenta que não pode colocar em prática as coisas que aprova.

A carne é realmente fraca. Como Kasemann coloca: “Um ser humano não é visto como alguém que pode lutar contra seu destino e pode mudar seu destino, como o eu moral tenta fazer.” Precisamos de ajuda fora de nós mesmos.

Nossa única esperança está em Cristo Jesus nosso Senhor.

7: 18 – 19 “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim, mas não o realizá-lo.”

Ao ler rapidamente o capítulo seis de Mateus, sinto-me tão perdido como quando passei uma vista de olhos sobre o capítulo cinco. Eu era mau o bastante para entender que nem sempre fora o tipo de sal e luz que devia ser em meu testemunho diário, que a lei tem profundezas de significado que afetam minha vida, tanto na esfera do pensamento quanto na esfera da ação, e que não era tão perfeito em amar ou outros como Tu és. Mas no capítulo seis Tu me humilhaste novamente.

[…] depois de ler o sermão, reconheço que as duas esferas não podem ser separadas, mas Tu sabes o que quero dizer. Ajuda-me hoje a esquecer o egoísmo e a exibição pessoal. Ajuda-me a ser humilde de espírito, a ser manso e a ter fome e sede de justiça. Ajuda-me a não ter orgulho, nem mesmo de estar sendo espiritual ao fazer esse pedido.

E por favor, perdoa minhas fraquezas na área abrangida pela segunda metade do capítulo seis. Tu sabes como tem sido fácil para mim, fazer das coisas e posições meus alvos. E Tu sabes melhor do que ninguém como tenho lutado contra ansiedades e preocupações. O problema não é eu saber que a preocupação é contraproducente. Isto eu sei. Parece que simplesmente não consigo ajudar a mim mesmo. Continuo a me preocupar com os erros do passado e a me angustiar com as possibilidades negativas do futuro, em vez de apenas viver um dia de cada vez na confiança de que Tu resolverás as coisas. [Caminhando com Jesus no Monte das Bem Aventuranças]

7: 19 “Pois não faço o bem que quero, mas o mal que não quero é o que faço. Agora se eu faço o que não quero, não sou mais eu que faço, mas o pecado que habita dentro de mim.” Romanos 7:19, RSV.

A frustração continua! Nesses versículos, Paulo resume sua incapacidade de fazer o bem e evitar totalmente o mal. Como um cristão que conhece a profundidade de sua fraqueza, ele está em agonia de alma. Ele sente que não há nada de louvável em si mesmo.

Mais uma vez, observe que ele não está dizendo que não pode fazer nada de bom. Em vez disso, como cristão, ele lamenta o fato de ser incapaz de cumprir completamente os requisitos da lei. Ele expressou algo semelhante a esse desejo aos filipenses: “Não que já o tenha obtido ou seja perfeito; mas prossigo para torná-lo meu, porque Cristo Jesus me fez seu próprio. Irmãos, não considero que a tenha tornado minha; mas uma coisa eu faço, esquecendo o que está para trás e avançando para o que está à frente,” (Filip. 3: 12-14, RSV).

Uma coisa é os indivíduos virem a Jesus e darem suas vidas a Ele, confessarem seus pecados, receberem justificação e um novo coração e mente, e serem separados para uso santo no serviço de Deus. Todas essas coisas acontecem em um momento. Mas só porque as pessoas se tornaram cristãs não significa que sejam totalmente santificadas ou santas. John Wesley, Ellen White e outros identificaram muito corretamente a santificação progressiva (crescimento para se tornar mais semelhante a Deus) como a obra de uma vida inteira.

A caminhada cristã é contínua e tem seus reveses, desafios e fracassos. Mas à medida que os crentes crescem em sua vida espiritual, eles inevitavelmente desenvolvem um ódio cada vez maior ao pecado, um amor cada vez maior pela justiça e pela lei de Deus e um senso cada vez maior de suas próprias fraquezas. Esses aspectos do crescimento nos levam a uma confiança cada vez maior em Deus.

Em nossa vida diária, não precisamos ficar desanimados. Claro que temos nossos altos e baixos. E, quando eles são deprimentes, sentimos que somos absolutamente inúteis, que não temos nada de bom em nós. Mas quando isso acontece, precisamos de coragem. O mesmo desânimo esmagador veio a Paulo e Davi. Eles tiveram seus momentos de louvor, alegria e paz. Mas quando falharam, eles sabiam que sua única esperança estava na graça e no poder de Deus.

7:21 “Acho que é uma lei que, quando quero fazer o que é bom, o mal está ao meu alcance.” Romanos 7:21, NRSV.

Pode apostar que sim. Está em todo lugar. Na verdade, brincar e exibir o mal é uma das principais realizações das modernas indústrias de televisão e cinema. Se um produto não é cheio de sexo e violência, geralmente não vende.

A programação infantil, acredite ou não, é ainda pior do que a criada para adultos. Por causa do curto período de atenção das crianças, elas precisam ser alimentadas com várias cenas violentas por minuto. Do contrário, eles ficarão entediados, se afastarão do tela e perderão o anúncio. E se eles perderem o anúncio, não ficarão preparados para implorar e reclamar para que seus pais comprem os mais recentes cereais matinais – [secados com] ar quente [calor] revestido de açúcar. Que tragédia!

Sim, o mal está “próximo”. Não apenas na mídia, mas ainda mais perto – em nossos cérebros. Quer gostemos ou não e seja nossa culpa ou não, nossas mentes estão cheias de imagens do mal que a “carne” (natureza pecaminosa) acha bastante atraente (tentadora), apesar do fato de um cristão saber a diferença entre o pecado e justiça e até mesmo desejar o bem.

Os cristãos precisam perceber que ser batizado e absorver novos amores e desejos não significa um transplante de cérebro físico milagroso. Não, o mesmo velho “pedaço de carne” ainda está entre suas orelhas e começou sua nova vida cristã com uma biblioteca cheia de imagens atraentes armazenadas em seus bancos de memória. O mal certamente está ao nosso alcance.

Os cristãos ainda podem ter as imagens antigas armazenadas em suas mentes, mas porque tiveram uma experiência transformadora com Jesus, eles também sabem que muitas dessas imagens não devem ser encorajadas por causa de suas consequências destrutivas.

Por causa de sua conversão, os cristãos desejam fazer o que é certo. Mas, novamente, o mal está tão próximo, e faz a “contração da carne” sem que a pessoa tenha que pensar sobre isso.

Podemos agradecer a Deus por Ele também estar por perto e por podermos pedir Sua ajuda para obter força (e perdão quando precisarmos). A vida cristã é de crescimento e desenvolvimento, na qual chegamos a um senso cada vez maior da santidade da lei de Deus e um senso cada vez maior de nossa própria fraqueza e necessidade de Cristo e de Sua justiça.

7:22 “Eu me deleito na lei de Deus segundo o homem interior.” Romanos 7:22.

Aqui está a marca da pessoa convertida – alguém que pode “deleitar-se na lei de Deus”. Uma expressão mais forte do que “concordar com” ou reivindicar bondade para “deleite” expressa uma alegria na lei de Deus que aqueles em oposição a Deus não têm.

Aqui temos o “verdadeiro” Paulo. Aqui está Paulo, o homem de Deus. Aqui está Paulo, o cristão que “se deleita”, se alegra e encontra prazer na lei de Deus. Aqui está o Paulo que se opõe ao outro Paulo que é tentado e cai. Aqui está a preocupação do “homem interior” de Paulo em oposição à fragilidade da “carne” ou do homem exterior de Paulo.

E aqui está parte da prova de Paulo de que o pecado não mais reina como seu mestre, que Deus realmente o redimiu. Ele tem prazer na lei de Deus.

Esse mesmo deleite será encontrado em todas as pessoas que entregaram seus corações a Deus e nasceram do alto. A lei de Deus não é mais inimiga deles do que de Paulo. Eles amarão a lei do amor de todo o coração, mente e alma.

Encantar-se de coração na lei de Deus não era algo novo para Paulo. Deus planejou isso desde o início. Talvez os salmos expressem a atitude mais consistente de deleite na lei de Deus. Já mencionamos isso em um estudo anterior, mas vamos dar uma olhada mais detalhada aqui.

O Salmo 1 inicia o “desfile das delícias” com “bem-aventurado o homem”, cujo “deleite está na lei do Senhor, e na sua lei medita dia e noite” (Sal. 1: 1,2, RSV).

O Salmo 19 se junta ao coro do deleite, observando que “a lei do Senhor é perfeita, reavivando a alma” (Salmo 19: 7, RSV).

E, claro, o Salmo 119 se recusa a ser deixado de fora desta sessão de louvor: “Eu me deleito tanto no caminho dos teus testemunhos como em todas as riquezas” (Salmo 119: 14); “Tenho o meu prazer nos teus mandamentos, que amo” (versículo 47, RSV); “a tua lei é o meu deleite” (versículo 77, RSV); e “se a tua lei não tivesse sido o meu deleite, teria perecido na minha aflição” (versículo 92, RSV).

Como, meu amigo, é com o seu “homem interior”? O seu coração também ressoa com amor pela lei de Deus, como aconteceu com Paulo e os salmistas? Se não, por que não? Essas perguntas são de importância crucial quando examinamos a nós mesmos e, com a ajuda de Deus, traçamos nosso curso para o futuro.

“Os cristãos não são normais! Pelo menos não conforme o mundo define a pessoa normal. Vez após outra em nosso estudo do Sermão do Monte neste ano, observamos que cristianismo não é a soma da crença em Jesus e uns poucos bons hábitos na velha vida. Pelo contrário, a velha vida foi crucificada com Cristo e ressuscitou para uma nova maneira de pensar e agir. Mesmo as vidas consideradas boas precisam morrer para o orgulho e o preconceito. Cristianismo é uma vida transformada, uma nova criação, a experiência de um nascimento do alto. Qualquer coisa inferior a isso não é cristianismo.

Assim sendo, perguntamos novamente, o que é que envolve esse “de mais” mencionado em Mateus 5:47? D. Martin Lloyd-Jones, em seu excelente estudo do Sermão do Monte, provê alguns detalhes sobre esse assunto. Em primeiro lugar, o cristão convertido não pensa como os mundanos normais. A pessoa natural pode prestar obediência com murmurações, mas o cristão tem prazer “na lei de Deus”. Cristão é aquele que assimilou o espírito da lei de amor, não meramente sua letra.

Aqueles que se apegam à letra não chegam a atingir o verdadeiro significado do que é ser cristão. Por isso, uma segunda distinção entre pessoas “normais” e cristãos, é que a pessoa natural sempre pensa no pecado em termos de ações, coisas que fazemos ou deixamos de fazer. Em contraste, o cristão está interessado no coração. Esse tem sido o ponto principal de Jesus desde o versículo 20 do capítulo 5 de Mateus. Tanto o pecado como a justiça que “excede”, estão enraizados no íntimo do ser do cristão.

Mas essa justiça flui na vida diária de acordo com a lei de amor que excede em muito a dos fariseus e dos publicanos. Essa é a terceira distinção entre a própria “religião normal” e o cristianismo genuíno.

Uma quarta diferença entre os dois grupos é a atitude do cristão em relação a si mesmo. Enquanto a vida do mundano ou dos religiosos legalistas é impregnada de orgulho, o verdadeiro cristão tem a humildade de espírito e a fome e sede da justiça, que são a essência das Bem- aventuranças.

Os cristãos são realmente pessoas “mais do que” normais.

7: 23 “Mas vejo outra lei em meus membros, guerreando contra a lei de minha mente e levando-me cativo à lei de pecado que está em meus membros.” Romanos 7:23.

Paulo foi o campo de batalha de um grande conflito ou luta entre o bem e o mal. Ele amava a lei de Deus, mas via “outra lei”, “a lei do pecado”, guerreando contra seu eu espiritual. Em suma, ele estava travando um combate mortal com as forças do mal. O fato de que ele ainda está lutando, que ele não desistiu, é importante. O diabo nunca desiste, e nem devemos nós, embora tenhamos nos desapontado e falhado (novamente).

Como Paulo mencionou várias vezes desde Romanos 7:14, sua vida não foi tudo o que ele gostaria que fosse, mas ele não desistiu. Por outro lado, ele chegou a um senso de realismo que parece escapar a alguns cristãos modernos. Esse “realismo”, sugere J. I. Parker, “tem a ver com nossa disposição ou falta de disposição para enfrentar verdades desagradáveis sobre nós mesmos e começar a fazer as mudanças necessárias.”

Com Romanos 7: 14-24 em mente, James Montgomery Boice apresentou quatro declarações que estão na base do realismo espiritual. Primeiro, “quando Deus nos chamou para sermos cristãos, ele nos chamou para as lutas da vida contra o pecado”. É muito fácil querer escapar desse fato declarando-nos seguros e sãos de toda tentação e luta. Mas, como Paulo coloca tão vividamente, os cristãos terão que lutar contra o mal pelo resto de suas vidas. Essa guerra não é fácil, visto que é travada contra o resíduo do pecado que reside até mesmo em homens e mulheres convertidos. “O realismo exige uma preparação rigorosa, alerta constante, determinismo obstinado e confiança a cada momento apenas nEle, que pode nos dar a vitória.”

Em segundo lugar, “embora sejamos chamados a uma luta vitalícia contra o pecado, nunca alcançaremos a vitória por nós mesmos”. Terceiro, “mesmo quando triunfamos sobre o pecado pelo poder do Espírito Santo, o que deveria acontecer com frequência, ainda somos servos inúteis”. Por quê? Porque até mesmo as vitórias de um cristão vêm apenas pelo poder da graça de Deus.

Quarto, “devemos continuar combatendo e lutando contra o pecado, e devemos fazê-lo com as ferramentas que temos à nossa disposição, principalmente a oração, o estudo da Bíblia, a comunhão cristã [e] o serviço aos outros”. O apóstolo nos ordenou em Efésios 6 para “ser fortes no Senhor e na sua força” (versículo 6, NVI) e “revestir-se de toda a armadura de Deus para que você possa resistir às maquinações do diabo” (versículo 11, NIV)

“A expressão “choram”, em Mateus 5:4, é a palavra mais forte para pranto na língua grega. É a palavra usada para prantear os mortos. Como tal, é um ardente lamento por alguém amado. No Antigo Testamento grego é a palavra escolhida para expressar a dor de Jacó quando acreditou que seu filho José estava morto (Gên. 37:34). Ela reflete dor profunda. Por isso, William Barclay amplia a segunda bem-aventurança assim: “Bem-aventurado é o homem que chora como alguém que chora pelos mortos.”

Contudo, apesar do choro pelos mortos reproduzir a intensidade da experiência de Mateus 5:4, não reflete seu significado. A profunda experiência da segunda bem-aventurança é reproduzida no texto bíblico de  Rom. 7:24 – Esse clamor nos diz algo sobre o significado do choro. Reflete alguém tão aflito pela dor que ele ou ela chora em agonia de espírito. Os cristãos conhecem a experiência de sentir-se totalmente sem esperança por causa de suas falhas.

“Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne”, clamou o apóstolo Paulo, “não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém, o efetuá-lo. Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço.” Rom. 7:18 e 19.

Os cristãos choram por causa de seu profundo senso de indignidade. Não é por acaso que a primeira palavra de Jesus em Mateus é “arrependei-vos”. Arrepender-me é reconhecer minha pecaminosidade e renunciá-la. É lamentar que eu seja pecador e voltar-me para Deus em busca de perdão.

Essa não é uma experiência superficial. É sincera e profunda. É como a tristeza que se sente quando alguém morre. Mas com o pranto vem a esperança. Afinal, “se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça”. I João 1:9.

Assim, o choro traz vitória. O negativo vem antes do positivo. Estou convencido do pecado, de modo que posso experimentar a alegria da salvação.” [Caminhando com Jesus no Monte das Bem Aventuranças]

7: 24 – 25 “Quem vai me resgatar desse corpo de morte? Graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor!” Romanos 7:24, 25, NRSV.

O apóstolo passa de uma discussão sobre sua miséria para um grito por libertação: “Quem me salvará deste corpo de morte?”

Sua resposta é o grito de alegria: “Graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor!” Ele sabe por experiência própria que o problema do pecado tem apenas uma solução. É Cristo quem nos livra do dilema do pecado em curso e acabará literalmente resgatando Seu povo “deste corpo de morte” no segundo advento, quando, Paulo nos assegura, “os mortos serão ressuscitados imperecíveis e nós seremos transformados. Pois este perecível deve revestir-se do incorruptível e este mortal deve revestir-se da imortalidade” (1 Coríntios 15:52, 53, NASB).

O grito alegre de Romanos 7:25 fornecerá o assunto para o capítulo 8. Lidar com a vitória cristã, é em muitos aspectos o ponto alto do livro de Romanos. Mas antes de passar para os temas vitoriosos do capítulo 8, Paulo adiciona um pouco de equilíbrio no final do capítulo 7. Suas palavras finais são: “Portanto, eu mesmo em minha mente sou um escravo da lei de Deus, mas na natureza pecaminosa um escravo da lei do pecado” (Rom. 7:25, NVI).

Alguns acham que é uma frase estranha após o grito de vitória na primeira parte de Romanos 7:25 e pouco antes da tremenda declaração de segurança cristã em Romanos 8: 1. Vários intérpretes, como Moffatt e C. H. Dodd, chegam ao ponto de tratar a colocação da última parte do versículo 25 como um erro e anexá-la ao versículo 23, que tem o mesmo tema.

Mas não é um engano. Paulo pode saber que Cristo é a vitória, mas ele ainda é um realista. Assim, o final do versículo 25 é um lembrete, afirma D. Stuart Briscoe, de que “a guerra não acabou e a batalha continuará, mas com a certeza da vitória em vez da inevitabilidade da derrota.”

A contínua tensão entre o espírito e a carne permanece. Mas o cristão não luta sozinho. Cristo está ao lado de cada crente. E por meio do Espírito Santo (um tópico importante de Romanos 8), a vitória será conquistada. Paulo disse aos filipenses algo muito semelhante: “Estou certo de que aquele que começou uma boa obra em vocês, a completará no dia de Jesus Cristo” (Filipenses 1: 6).

Louve a Deus por todas as Suas bênçãos. Louvado seja Deus por não estarmos sozinhos. Louvado seja Deus, porque Ele nunca nos abandona, nem mesmo quando as coisas ficam difíceis.

por Arthur W. Pink: Romanos 7

No sétimo capítulo da carta aos Romanos, o apóstolo Paulo se referiu a dois assuntos: primeiramente, ele mostrou qual é a relação do crente para com a lei de Deus — judicialmente, o crente está emancipado da maldição e da penalidade da lei (vv. 1-6); moralmente, o crente está sob laços de obediência à lei (vv. 22, 25). Em segundo, Paulo nos protegeu da falsa inferência que poderia ser deduzida daquilo que ele havia ensinado no capítulo 6.  

No capítulo 6, versículos 1 a 11, Paulo havia apresentado a união do crente com Cristo, retratando o crente como alguém “morto para o pecado” (vv. 2, 7, etc.). Em seguida, do versículo 11 em diante, ele mostrou o efeito que essa verdade deve ter sobre o viver do crente. No capítulo 7, o apóstolo Paulo seguiu a mesma ordem de pensamento. Em Romanos 7.1-6, ele falou sobre a identificação do crente com Cristo, apresentado-o como “morto para a lei” (vv. 4 a 6). Em seguida, do versículo 7 em diante, Paulo descreveu as experiências do crente. Assim, nos capítulos 6 e 7 de Romanos, na primeira metade de ambos, Paulo aborda a posição do crente, enquanto na segunda metade de ambos os capítulos ele fala sobre o estado do crente, mas com a seguinte diferença: a segunda metade de Romanos 6 revela qual deve ser o nosso estado, enquanto a segunda metade do capítulo 7 (vv. 13-25) mostra qual é, na realidade, o nosso estado.  

A presente controvérsia suscitada sobre Romanos 7 é amplamente um fruto do perfeccionismo de John Wesley e seus seguidores. O fato de que esses irmãos, dos quais temos motivo para reverenciar, adotaram este erro de forma modificada apenas nos mostra quão abrangente em nossos dias é o espírito do laodiceísmo. A segunda metade de Romanos 7 descreve o conflito das duas naturezas que o crente possui; simplesmente apresenta em detalhes o que está sumariado em Gálatas 5.17. As afirmações de Romanos 7. 14,15,18,19 e 21 são verdadeiras a respeito de todos os crentes que vivem nesse mundo. Todo crente fica aquém, muito aquém do padrão colocado diante dele; estamos nos referindo ao padrão de Deus, e não ao padrão dos ensinadores da suposta “vida vitoriosa”. Se qualquer leitor crente disser que Romanos 7 não descreve a sua vida, afirmamos com toda a bondade que ele se encontra terrivelmente enganado. Não estamos dizendo que todo crente quebra a lei dos homens ou que ele é um ousado transgressor da lei de Deus. Estamos afirmando que a vida de todo crente está muito aquém do nível de vida que nosso Senhor vivenciou, quando esteve neste mundo. Estamos dizendo que muito da “carne” ainda se evidencia em todo crente, inclusive naqueles que se vangloriam, em voz alta, de suas conquistas espirituais. Estamos dizendo que todo crente tem necessidade urgente de orar suplicando perdão por seus pecados diários (Lucas 11.4), pois “todos tropeçamos em muitas coisas” (Tiago 3.2).  

Nos próximos parágrafos, consideraremos os dois últimos versículos de Romanos 7, que dizem: “Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte? Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado” (vv. 24-25).  Essa é a linguagem de uma alma regenerada e resume o conteúdo dos versículos imediatamente anteriores. O homem incrédulo é realmente desventurado, mas ele não conhece a “desventurança” que evoca a lamentação expressada nessa passagem. Todo o contexto se dedica a descrever o conflito entre as duas naturezas do filho de Deus. “Porque, no tocante ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus” (v. 22) — isso é verdade apenas sobre a pessoa nascida de novo. Todavia, aquele que tem prazer na lei de Deus encontra, em seus“membros, outra lei”. Isso não pode estar limitado aos membros do corpo físico, mas tem de ser entendido como algo que inclui todas as várias partes de sua personalidade carnal — a memória, a imaginação, a vontade, o coração, etc.  

Essa “outra lei”, disse o apóstolo, guerreava contra a lei de sua mente (a nova natureza); e não somente isso, ela também o fazia “prisioneiro da lei do pecado” (v. 23). Ele não definiu em que extensão se expressava essa servidão. Mas ele estava em servidão à lei do pecado, assim como todo crente também o está. A vagueação da mente, na hora de ler a Palavra de Deus, os maus pensamentos que brotam do coração (Marcos 7.21), quando estamos envolvidos na oração, as más figuras que, às vezes, aparecem quando estamos em estado de sonolência — citando apenas alguns — são exemplos de havermos sido feitos prisioneiros “da lei do pecado”“Se o princípio mau de nossa natureza prevalece, a ponto de despertar em nós apenas um pensamento mau, ele nos tomou como cativos. Visto que ele nos conquistou, estamos vencidos e feitos prisioneiros” (Robert Haldane).  

O reconhecimento dessa guerra em seu íntimo e o fato de que se tornou cativo ao pecado levam o crente a exclamar: “Desventurado homem que sou!” Esse é um clamor produzido por uma profunda compreensão da habitação do pecado. É a confissão de alguém que reconhece não haver bem algum em seu homem natural. É o lamento melancólico de alguém que descobriu algo a respeito da horrível profundeza de iniquidade que existe em seu próprio coração. É o gemido de uma pessoa iluminada por Deus, uma pessoa que odeia a si mesma — ou seja, o homem natural — e anela por libertação.  

Esse gemido — “Desventurado homem que sou!” — expressa a experiência normal do crente; e qualquer crente que não geme dessa maneira está em um estado de anormalidade e falta de saúde espiritual. O homem que não profere diariamente esse clamor se encontra tão ausente da comunhão com Cristo, ou tão ignorante dos ensinos das Escrituras, ou tão enganado a respeito de sua condição atual, que não conhece as corrupções de seu coração e a desprezível imperfeição de sua própria vida.  

Aquele que se curva diante do solene e perscrutador ensino da Palavra de Deus, aquele que nela aprende a terrível ruína que o pecado tem realizado na constituição do ser humano, aquele que percebe o padrão elevado que Deus nos tem proposto não falhará em descobrir que é um ser maligno e vil. Se ele se esforça para perceber o quanto tem falhado em alcançar o padrão de Deus; se, na luz do santuário divino, ele descobre quão pouco se parece com o Cristo de Deus, então, reconhecerá que essa linguagem de Romanos 7 é muito apropriada para descrever sua tristeza espiritual. Se Deus lhe revela a frieza de seu amor, o orgulho de seu coração, as vagueações de sua mente, o mal que contamina suas atitudes piedosas, o crente haverá de clamar: “Desventurado homem que sou!” Se o crente estiver consciente de sua ingratidão e de quão pouco ele tem apreciado as misericórdias diárias de Deus; se o crente percebe a ausência daquele fervor profundo e genuíno que tem de caracterizar seus louvores e sua adoração Àquele que é “glorificado em santidade” (Êxodo 15.11); se o crente reconhece o espírito pecaminoso de rebeldia que, com frequência, o faz murmurar ou irrita-o contra as realizações dEle em sua vida cotidiana; se o crente admite que está ciente não apenas de seus pecados de comissão, mas também daqueles de omissão, dos quais ele é culpado todos os dias, ele realmente clamará: “Desventurado homem que sou!”  

Esse clamor não será proferido apenas por aquele crente que se acha afastado do Senhor. Aquele que está em comunhão verdadeira com o Senhor Jesus também emitirá esse gemido, todos os dias e todas as horas. Sim, quanto mais o crente se achega a Cristo, tanto mais ele descobrirá as corrupções de sua velha natureza, e tanto mais ardentemente desejará ser liberto de tal natureza. É somente quando a luz do sol inunda um cômodo que a poeira e a sujeira são completamente revelados. Quando estamos realmente na presença dAquele que é luz, ficamos conscientes da impureza e impiedade que habita em nós e contamina cada parte de nosso ser. E essa descoberta nos levará a clamar: “Desventurado homem que sou!”  

“Mas”, talvez alguns perguntem, “a comunhão com Cristo não produz regozijo, ao invés de gemidos?” Respondemos que a comunhão com Cristo produz ambas as coisas. Isso aconteceu com Paulo. Em Romanos 7.22, ele afirmou: “Tenho prazer na lei de Deus”. Logo em seguida, porém, ele clamou: “Desventurado homem que sou!” Outras passagens também nos mostram isso. Em 2 Coríntios 6, Paulo disse: “Entristecidos, mas sempre alegres” (v. 10) — entristecido por causa de suas falhas, por causa de seus pecados diários; alegre por causa da graça que ainda permanecia com ele e por causa da bendita provisão que Deus fizera até para os pecados de seus santos. Também em Romanos 8, depois de haver declarado: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (v. 1); “O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus. Ora, se somos filhos, somos também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo; se com ele sofremos, também com ele seremos glorificados” (vv. 16-17), o apóstolo Paulo acrescentou: “Também nós, que temos as primícias do Espírito, igualmente gememos em nosso íntimo, aguardando a adoção de filhos, a redenção do nosso corpo” (v. 23). O ensino do apóstolo Pedro é semelhante ao de Paulo — “Nisso exultais, embora, no presente, por breve tempo, se necessário, sejais contristados por várias provações” (1 Pe 1.6). Tristeza e gemido não se encontram ausentes no mais elevado nível de espiritualidade.  

Nestes dias de complacência e orgulho laodicense, existe considerável parola e muita exaltação a respeito da comunhão com Cristo; porém, quão pouca manifestação dessa comunhão nós contemplamos! Onde não existe qualquer senso de completa indignidade; onde não existe qualquer lamentação pela depravação total de nossa natureza; onde não existe qualquer entristecimento por nossa falta de conformidade com Cristo; onde não existe qualquer gemido por havermos sido feitos “prisioneiros” do pecado; em resumo, onde não existe o clamor: “Desventurado homem que sou!”, deve haver um grande temor de que ali não existe, de maneira alguma, comunhão com Cristo.  

Quando estava andando com o Senhor, Abraão exclamou: “Eis que me atrevo a falar ao Senhor, eu que sou pó e cinza” (Gênesis 18:27). Estando face a face com Deus, Jó declarou: “Por isso, me abomino” (Jó 42:6). Ao entrar na presença de Deus, Isaías clamou: “Ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros” (Isaías 6:5). Quando teve aquela maravilhosa visão de Cristo, Daniel confessou: “Não restou força em mim; o meu rosto mudou de cor e se desfigurou, e não retive força alguma” (Daniel 10:8). Em uma das últimas epístolas do apóstolo dos gentios, lemos: “Fiel é a palavra e digna de toda aceitação: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal” (1 Timóteo 1.15). Essas declarações não procederam de pessoas não-regeneradas, e sim dos lábios de santos de Deus. Elas não foram confissões de crentes relaxados; pelo contrário, elas foram proferidas pelos mais eminentes membros do povo de Deus. Em nossos dias, onde encontramos crentes que podem ser colocados lado a lado com Abraão, Jó, Isaías, Daniel e Paulo? Onde, realmente?! Mas eles foram homens que estavam conscientes de sua vileza e indignidade!  

“Desventurado homem que sou!” Essa é a linguagem de uma alma nascida de novo; é a confissão de um crente normal (não-iludido, não-enganado). A essência dessa afirmativa pode ser encontrada não somente nas declarações dos santos do Antigo e do Novo Testamento, mas também nos escritos de muitos dos eminentes servos de Cristo que viveram nos últimos séculos. As afirmações e o testemunho pronunciado pelos eminentes santos do passado eram muito diferentes da ignorância e da arrogante jactância dos laodicences modernos! É um refrigério volvernos das biografias de nossos dias para aquelas biografias escritas há muito tempo. Medite nos trechos de biografias que apresentamos em seguida.  

Bradford, que foi martirizado no reinado de Maria, a sanguinária, em uma carta dirigida a um amigo que estava em outra prisão, subscreveu-se com as seguintes palavras: “O pecaminoso John Bradford, um hipócrita notável, o pecador mais miserável, de coração endurecido e ingrato — John Bradford” (1555).  

O piedoso Samuel Rutherford escreveu: “Este corpo de pecado e de corrupção torna amargo e envenena nosso regozijo. Oh! Se eu estivesse onde nunca mais pecarei!” (1650).  

O bispo Berkeley disse: “Não posso orar, mas cometo pecados. Não posso pregar, mas cometo pecados. Não posso ministrar, nem receber a Ceia do Senhor, mas cometo pecados. Preciso arrepender-me de meu próprio arrependimento; e as lágrimas que derramei necessitam da lavagem do sangue de Cristo” (1670).  

Jonathan Edwards, em sua obra A Vida de David Brainerd (o primeiro missionário entre os índios, cuja devoção a Cristo foi testemunhada por todos os que o conheciam), afirmou a respeito de Brainerd: “Sua iluminação, suas afeições e seu conforto espiritual parecem ter sido, em grande medida, acompanhadas por humildade evangélica; consistiam em um senso de sua completa insuficiência, de sua vileza e de sua própria abominação; com uma disposição correspondente e uma propensão do coração. Quão profundamente Brainerd foi afetado quase continuamente por seus grandes defeitos na vida cristã; por sua ampla distância daquela espiritualidade e daquela disposição mental que convém a um filho de Deus; por sua ignorância, seu orgulho, sua apatia e sua esterilidade! Ele não foi somente afetado pela recordação dos pecados cometidos antes de sua conversão, mas também pelo sentimento de sua presente vileza e corrupção. Brainerd não se mostrava apenas disposto a considerar os outros crentes melhores do que ele mesmo e a olhar para si mesmo como o pior e o menor de todos os crentes, mas também, com muita frequência, a ver a si mesmo como o mais vil e o pior de todos os homens”.

O próprio Jonathan Edwards, que entre muitos foi mais honrado por Deus (quer em suas realizações espirituais, quer na extensão em que Deus o usou para abençoar outros), escreveu nos últimos dias de sua vida: “Quando olho para meu coração e vejo a sua impiedade, ele parece um abismo infinitamente mais profundo do que o inferno. E parece-me que, se não fosse a graça de Deus, exaltada e elevada à infinita sublimidade de toda a plenitude e glória do grande Jeová, eu deveria comparecer, mergulhado em meus pecados, nas profundezas do próprio inferno, muito distante da contemplação de todas as coisas, exceto do olhar da graça soberana, que pode destruir tal profundeza. É comovente pensar o quanto eu ignorava, quando era um crente novo (infelizmente, muitos crentes velhos ainda o ignoram — A. W. Pink), a profunda impiedade, orgulho, hipocrisia e engano deixados em meu coração” (1743).  

Augustus Toplady, autor do hino “Rocha Eterna”, escreveu as seguintes palavras em seu diário no dia 31 de dezembro de 1767: “Ao fazer uma retrospectiva deste ano, desejo confessar que minha infidelidade tem sido excessivamente grande, e meus pecados, ainda maiores. Todavia, as misericórdias de Deus têm sido maiores do que ambos”. E mais: “Minhas falhas, meus pecados, minha incredulidade e minha falta de amor me afundariam no mais profundo do inferno, se Jesus não fosse minha justiça e meu Redentor”.  

Observem estas palavras de uma piedosa mulher, a esposa do eminente missionário Adoniran Judson: “Oh! Como eu me regozijo porque estou fora do redemoinho! Sou gaiata e fútil demais, para ser a esposa de um missionário! Talvez a gaiatice seja o meu mais leve pecado. Não são os atrativos do mundo que me tornam um simples bebê na causa de Cristo; pelo contrário, é a minha frieza de coração, a minha insignificância, a minha falta de fé, a minha ineficiência e inércia espiritual, por amor do meu próprio ‘eu’, e a minha pecaminosidade abundante e inerente de minha natureza”.   

John Newton, o escritor do bendito hino “Graça Admirável” (que afirma: “Graça admirável, quão doce é o som que salvou um ímpio como eu; estava perdido, mas fui achado; era cego, agora vejo”), quando se referia às expectativas que ele nutria no final de sua vida cristã, escreveu o seguinte: “Infelizmente, essas minhas preciosas expectativas se tornaram como sonhos dos mares do Sul. Vivi neste mundo como um pecador e creio que assim morrerei. Eu ganhei alguma coisa? Sim, ganhei aquilo com o que antes eu preferia não viver! Essas provas acumuladas do engano e da terrível impiedade do meu coração me ensinaram, pela bênção do Senhor, a compreender o que significa dizer: vejam, eu sou um homem vil… Eu me envergonhava de mim mesmo, quando comecei a procurar a bênção do Senhor; agora, eu me envergonho mais ainda”.  

James Ingliss (editor de “Marcos no Deserto”), no final de sua vida, escreveu:“Visto que fui trazido a uma nova opinião sobre o fim, a minha vida parece ser constituída de tantas oportunidades desperdiçadas e de tanta escassez de resultados, que às vezes isso é muito doloroso. A graça, porém, se apresenta para satisfazer todas essas deficiências; e o Senhor Jesus também será glorificado em minha humilhação” (1872). J. H. Brookers, o biógrafo de James Ingliss, observou sobre essas palavras: “Quão semelhante a Cristo e quão diferente daqueles que estão se gloriando em suas supostas realizações!”  

Apresentamos mais uma citação, proveniente de um sermão de Charles H. Spurgeon. O Príncipe dos Pregadores disse: “Existem alguns crentes professos que falam sobre si mesmos em termos de admiração. Todavia, em meu íntimo, detesto mais e mais esses discursos, a cada dia que eu vivo. Aqueles que falam dessa maneira arrogante devem possuir uma natureza muito diferente da minha. Enquanto eles estão congratulando a si mesmos, tenho de me prostrar aos pés da cruz de Cristo e admirar-me de que estou salvo, pois sei que fui salvo. Tenho de admirar-me de não crer mais profundamente em Cristo e de que sou privilegiado por crer nEle. Tenho de admirar-me de não amá-Lo mais profundamente, mas igualmente devo admirar-me até de que O amo de alguma maneira. Devo admirar-me de não possuir mais santidade e admirar-me, igualmente, de que eu tenho algum desejo de ser santo, levando em conta quão corrompida, degenerada e depravada natureza eu ainda encontro em minha alma, apesar de tudo o que a graça de Deus tem feito em mim. Se Deus permitisse que as fontes do grande abismo da depravação se rompessem nos melhores homens que vivem neste mundo, eles se tornariam demônios tão maus como o próprio diabo. Não me importo com o que dizem esses vangloriosos a respeito de suas próprias perfeições. Estou certo de que eles não conhecem a si mesmos; se conhecessem, não falariam como frequentemente o fazem. Mesmo no crente que está mais próximo do céu existe combustível suficiente para acender outro inferno, se Deus tão somente permitisse que uma chama caísse sobre ele. Alguns crentes parecem que nunca descobrem isto. Eu quase desejo que eles nunca o descubram, pois esta é uma descoberta dolorosa para qualquer um fazer; mas ela tem o efeito benéfico de fazer que paremos de confiar em nós mesmos e de nos levar a nos gloriarmos somente no Senhor”.  

Poderíamos apresentar outros testemunhos dos lábios e dos escritos de homens igualmente piedosos e eminentes, porém citamos o suficiente para mostrar que os santos de todas as épocas tinham motivo para fazerem suas essas palavras do apóstolo Paulo: “Desventurado homem que sou!” Faremos mais algumas poucas observações sobre essas palavras finais de Romanos 7.  

“Quem me livrará do corpo desta morte?” “Quem me livrará?” Esta não é uma linguagem de desespero, e sim de um desejo ardente de ajuda de fora e do alto. Aquilo do que o apóstolo desejava ser livre é chamado de “o corpo desta morte”. Esta é uma expressão figurada, pois a natureza carnal é chamada de “o corpo do pecado” e vista como algo que tem “membros” (Romanos 7:23).Portanto, entendemos que as palavras do apóstolo significam: “Quem me livrará desse fardo mortal e pernicioso — meu eu pecaminoso?!”  

No versículo seguinte, o apóstolo responde essa pergunta: “Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor” (Romanos 7:25). Deve ser óbvio para qualquer mente imparcial que isso aponta para o futuro. Paulo havia perguntado: “Quem me livrará?” A sua resposta foi: Jesus Cristo me livrará. Isso expõe o erro daqueles que ensinam uma libertação presente da natureza carnal, por intermédio do poder do Espírito Santo. Em sua resposta, o apóstolo não falou nada sobre o Espírito Santo; ao invés disso, ele mencionou apenas “Jesus Cristo, nosso Senhor”. Não é por meio da obra presente do Espírito Santo em nós que os crentes serão libertados “do corpo desta morte”, e sim por meio da vinda futura do Senhor Jesus Cristo para nós. Naquele tempo, esse corpo mortal será revestido de imortalidade, e a nossa corrupção, de incorrupção.  

Como se estivesse pensando em remover toda dúvida a respeito de que essa libertação ocorrerá no futuro, o apóstolo concluiu dizendo: “De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado”. O leitor deve observar cuidadosamente que Paulo havia agradecido a Deus pelo fato de que ele seria libertado. A última parte do versículo 25 resume o que ele havia dito na segunda parte de Romanos 7; descreve a vida dupla do crente. A nova natureza serve a lei de Deus; a velha natureza, até ao final da História, servirá à “lei do pecado”. Que isso aconteceu com o apóstolo Paulo é evidente das palavras que ele escreveu no final de sua vida, quando chamou a si mesmo de “o principal” dos pecadores (1 Timóteo 1:15). Essa afirmativa não era um exagero de fervor evangelístico, nem mesmo um motejo de modesta hipocrisia. Era uma convicção segura, uma experiência vivenciada, uma conscientização firme de alguém que viu com amplitude as profundezas da corrupção que havia em seu próprio íntimo e que sabia o quanto ficava aquém de atingir o padrão de santidade que Deus havia colocado diante dele. Essa também é a convicção e a confissão de todo crente que não se encontra cativo ao preconceito. E o resultado dessa convicção fará o crente desejar mais intensamente o livramento e agradecer a Deus com mais fervor pela promessa do livramento, na vinda de nosso Senhor, “o qual transformará o nosso corpo de humilhação, para ser igual ao corpo da sua glória, segundo a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas” (Filipenses 3:20). E, havendo feito isso, o Senhor Jesus nos apresentará, “com exultação, imaculados diante da sua glória” (Judas 24). Aleluia! Que grande Salvador!  

É admirável que somente mais uma vez a palavra “desventurado” é utilizada no Novo Testamento (no texto grego). Essa outra ocorrência está em Apocalipse 3.17, onde Cristo disse à igreja de Laodicéia: “Nem sabes que tu és infeliz”. A arrogância dos membros dessa igreja era que eles não precisavam “de coisa alguma”. Eles estavam tão inchados com a soberba, tão satisfeitos com o que haviam atingido, que não tinham consciência de sua própria miséria. E não é isso mesmo que testemunhamos em nossos dias? Não é evidente que estamos vivendo no período laodiceiano da história da Igreja? Muitos estavam cônscios da “necessidade”, mas agora imaginam que receberam a “segunda bênção”, ou queobtiveram o “batismo do Espírito Santo”, ou que entraram na “vitória”. E, imaginando isso, pensam que sua necessidade foi satisfeita. E a prova disso é que eles vivem em uma atmosfera de tal superioridade espiritual, que nos dirão haverem saído de Romanos 7 e entrado na experiência de Romanos 8. Com desprezível complacência, eles nos dirão que Romanos 7 não descreve mais a experiência deles. Com presunçosa satisfação, eles olharão com piedade para o crente que clama: “Desventurado homem que sou!” e como o fariseu, no templo, agradecerão a Deus porque a situação deles é diferente. Pobres almas cegas! É exatamente o que o Filho de Deus afirma nessa passagem de Apocalipse: “Nem sabes que tu és infeliz”. Nós dissemos: “Almas cegas”, porque observamos que é para os crentes laodicenses que Jesus declara: “Aconselho-te que de mim compres… colírio para ungires os olhos, a fim de que vejas”(Apocalipse 3:19).  

Devemos observar que na segunda parte de Romanos 7 o apóstolo Paulo fala no singular. Isso é admirável e bastante abençoador. O Espírito Santo desejava transmitir-nos a verdade de que mesmo as mais elevadas realizações na graça não isentam o crente da dolorosa experiência ali descrita. Com o pincel de um artista, o apóstolo retratou — utilizando a si mesmo como o objeto da pintura — a luta espiritual do filho de Deus. Ele ilustrou, por referir-se à sua própria experiência, o conflito incessante que se realiza entre duas naturezas antagonistas naquele que nasceu de novo.  

Que, em sua misericórdia, Deus nos liberte do espírito de orgulho que agora corrompe o ambiente do evangelicalismo moderno e nos conceda um humilde ponto de vista a respeito de nossa própria impureza; fazendo-o de tal modo que nos unamos ao apóstolo Paulo em clamar com um fervor cada vez mais profundo: “Desventurado homem que sou!” Sim, que Deus outorgue tanto ao autor dessas linhas quanto ao seu leitor uma tão grande percepção de sua própria depravação e indignidade, que eles realmente se prostrem no pó, diante de Deus, e O adorem por sua maravilhosa graça para com esses pecadores que merecem o inferno.

Lei, Graça e Liberdade: Romanos 6:1 – 7:24 William G. Johnsson

Fonte: Romanos, uma carta de amor de Jesus

Romanos capítulos seis e sete devem ser estudados juntos para entender a mensagem de Paulo. Ele lembra que estava ditando a carta e não parou entre o material desses capítulos.

Esses capítulos, poderosos em seu impulso existencial, abordam a questão do pecado na vida do crente. Paulo anteriormente na carta expôs as boas novas (Romanos 1-3), a natureza da fé que se apropria das boas novas (Romanos 4) e a natureza da graça que está no centro das boas nova (Romanos 5). Agora ele se volta para a experiência cristã para explicar como as boas novas se desdobram na experiência do crente.

Como em outras partes de sua carta, Paulo enquadra a discussão levantando questões que apontam para os argumentos daqueles que assumem uma posição contrária à sua.

“Então devemos continuar a pecar para que Deus nos mostre mais de sua maravilhosa graça?” (Romanos 6:1). Alguém poderia ter tirado essa inferência do que Paulo acabou de declarar em Romanos 5:20: “À medida que as pessoas pecavam mais e mais, a maravilhosa graça de Deus se tornava mais abundante.” Mais pecaminoso, mais graça, então por que não pecar ainda mais para que a graça abunde mais?

Paulo havia abordado essa questão no início da epístola: “Algumas pessoas até nos caluniam alegando que dizemos: ‘Quanto mais pecarmos, melhor’” (Romanos 3:8). Nesse ponto, Paulo simplesmente descartou a possibilidade dessa ideia: “Aqueles que dizem essas coisas merecem ser condenados”, respondeu ele.

Em Romanos 6, Paulo retorna a essa objeção à graça e a responde em detalhes, abordando-a através de duas perguntas, primeiro no versículo 1, como vimos, e depois no versículo 15: “Bem, então, já que a graça de Deus nos libertou da lei, isso significa que podemos continuar a pecar? Claro que não!”.

O original grego para “claro que não!”, mè genoito (μὴ γένοιτο), aparece 15 vezes no Novo Testamento, 14 delas nos escritos de Paulo. É uma forte expressão de aversão, algo como “de jeito nenhum!” ou “Deus me livre!” Paulo quer que seus leitores sejam claros: o evangelho da graça que ele proclama nunca deve ser mal interpretado como licença para pecar.

As duas perguntas que estruturam o argumento de Paulo (Romanos 6:1, 15) são semelhantes, mas não idênticas. A primeira decorre do pecado abundante e da graça superabundante, a segunda da experiência do cristão que não procura mais viver pela lei como meio de salvação, mas respira a atmosfera da graça. A menção de Paulo de não estar sob a lei aqui abre o caminho para seu argumento no capítulo 7, uma passagem que ocasionou muito debate sobre seu significado ao longo dos séculos e ainda é entendida de várias maneiras. Nossa discussão aqui estabelecerá as bases para o tratamento mais extenso a seguir no Capítulo 7.

Pergunta 1: Pecado Abundante, Graça Superabundante

A resposta de Paulo à primeira pergunta é desenvolvida em Romanos 6:2-14 e brinca com um vocabulário surpreendente. No espaço desses 13 versículos encontramos nada menos que 14 vezes referências à morte e morrer e oito vezes à vida e ao viver. Ele se refere ao batismo (e claramente ao batismo por imersão), mas o batismo não é seu ponto principal. O batismo, para o crente que desce às águas e ressurge, destaca a passagem da morte para a velha vida com sua ascensão para uma nova vida em Cristo, onde o pecado não mais reina sobre o seguidor de Jesus.

Veja os seguintes versículos que revelam o coração do pensamento de Paulo:

• “Já que morremos para o pecado, como podemos continuar a viver nele?” (v.2).

• “Pois quando morremos com Cristo, fomos libertos do poder do pecado” (v. 7).

• “E, já que morremos com Cristo, sabemos que também com ele viveremos” (v. 8).

• “Assim também eles devem considerar-se mortos para o poder do pecado e vivos para Deus por meio de Cristo Jesus” (v. 11).

• “Em vez disso, entregue-se completamente a Deus, porque você estava morto, mas agora você tem uma nova vida.” (v.13).

Aqui não se pode confundir o pensamento de Paulo – ele o diz cinco vezes:

Nós estamos mortos!. Quando descemos às águas batismais nos

juntamos a Cristo em sua morte. E essa morte significa que fomos libertos do pecado.

Paulo é enfático: mas nossa experiência diz o contrário. Como T.S. Elliot escreveu:

«Entre a ideia / e a realidade… A sombra cai». [John Hollander, The Substance of Shadow: A Darkening Trope in Poetic History (University of Chicago Press, 2016), p. 118.]

Se fosse assim! Se ao menos o batismo cuidasse do problema do pecado em nossas vidas diárias! Se ao menos, como recém-nascidos em Cristo, experimentássemos uma sucessão ininterrupta de vitórias sobre a tentação!

Mas esse não é o caso. A vida cristã é uma batalha e uma marcha. Avançamos, mas voltamos. O pecado em nosso próprio ser não está morto. Paulo estava bem ciente desse fato, como veremos ao estudarmos o próximo capítulo. Lá descobriremos que o mesmo Paulo, que enfatiza a morte para o pecado em Romanos 6, irá expor sobre o pecado que habita nele, sobre a “lei do pecado” em seu próprio ser.

Então, o que ele quer dizer com seu argumento sobre morte, vida e pecado em Romanos 6:1-14?

Veja novamente o raciocínio dele. “Devemos continuar pecando para que Deus nos mostre cada vez mais de sua maravilhosa graça?” ele pergunta. Obviamente, Paulo discorda disso, porque “nós morremos para o pecado” (Romanos 6:2), a batalha acabou. Sim, passamos da morte para a vida nas águas do batismo, mas ainda há uma corrida a vencer, uma batalha a vencer. Como recém-nascidos em Cristo, a possibilidade de voltar ao pecado está sempre presente.

Mas Jesus nos encontrou e fez toda a diferença. Velhos hábitos caíram como cordas queimadas. Os antigos prazeres perderam seu apelo. Os antigos companheiros já não nos satisfaziam. Nós mudamos. As pessoas que nos conheciam antes sentiram a mudança e se alegraram ou reclamaram. “Ele encontrou a religião!”, alguns zombaram. Não, não encontramos religião, Jesus nos encontrou.

Nós morremos para o pecado. O pecado não morreu — é uma realidade sempre presente — mas lhe demos as costas. Começamos um novo caminho, que brilha cada vez mais como o sol nascendo em sua força.

Neste novo caminho nosso GPS é o Espírito Santo. Ela nos guia, mas temos que estar dispostos a ser guiados. Temos que manter nossos olhos no GPS.

Assim, diz o apóstolo, “considera-te morto para o poder do pecado e vivo para Deus, por meio de Cristo Jesus” (Romanos 6:11). Ele explica: “Não deixe o pecado controlar a maneira como você vive; não ceda aos desejos pecaminosos. Não permita que nenhuma parte do seu corpo se torne um instrumento do mal para servir ao pecado. Em vez disso, entreguem-se completamente a Deus” (Romanos 6:12, 13).

A segunda parte de Romanos 6 (vv. 15-23), continua na mesma linha. Sua metáfora muda, no entanto: em vez de “vida e morte”, ele se torna “escravidão e liberdade”.

Pergunta 2: viva sob a graça e não sob a lei

Observe como Paulo brinca com a questão da escravidão em Romanos 6:15-23:

• “Eles se tornam escravos daquilo que escolhem obedecer” (v. 16).

• “Escravos do pecado… ou obedecer a Deus.”

• “Outra vez eram escravos do pecado” (v. 17).

• “tornaram-se escravos de uma vida justa” (v. 18).

• “escravidão à impureza e à iniquidade… escravidão à vida reta, para que você se torne santo” (v. 19).

• “Eles eram escravos do pecado” (v. 20).

• “livres do poder do pecado e feitos escravos de Deus” (v. 22).

A escravidão era comum nos dias de Paulo. Talvez até um terço das pessoas no Império Romano fossem escravos. Em aspectos importantes, a escravidão naqueles dias diferia da dos Estados Unidos. A escravidão não era de base étnica: tornava-se escravo por captura na guerra ou por dívida que levava a pessoa a se vender; muitos escravos simplesmente nasceram como escravos.

O império era baseado na escravidão. Os escravos não apenas realizavam tarefas manuais, alguns escravos eram bem educados e serviam como tutores. Se um escravo fosse bem-sucedido, ele ou ela poderia finalmente comprar sua liberdade. Por outro lado, alguns proprietários de escravos ficaram tão apegados a seus servos que os libertaram, às vezes fazendo essa disposição em seu testamento.

Com todas essas características positivas que elevaram a prática acima do que os escravos na América sofreram, no entanto, a escravidão em seu coração era funesta. O proprietário de um escravo exercia controle total sobre o escravo; ele podia fazer o que quisesse, não importando o quão cruel ou vil. Como nos Estados Unidos, a escravidão degradava tanto o proprietário quanto o súdito.

A linguagem de Paulo é inequívoca: somos todos escravos. Não há meio termo – somos escravos da justiça ou escravos do pecado.

Essa é uma ideia que a maioria das pessoas hoje encontra uma pílula amarga para engolir. Eles preferem o conceito de pessoa autossuficiente, o homem ou a mulher que administra sua vida e nem o homem nem Deus podem lhes dizer o que fazer.

Eu sou o capitão da minha alma. [William Ernest Henley, A Book of Verses (Londres: David Nutt, 1888).]

Não, diz o apóstolo Paulo, você não é o dono do seu destino; você não é o capitão de sua alma. Você está vivo ou você está morto, morto para o pecado ou vivo para ele, vivo em Cristo ou não. Você é um escravo do pecado para uma iniquidade cada vez maior ou você é o escravo voluntário de Cristo, no caminho da santidade.

Paulo começou esta seção (Romanos 6:15-23) fazendo a pergunta:

“Bem, então, visto que a graça de Deus nos libertou da lei, Isso significa que podemos continuar pecando?». Ela destrói esse raciocínio falso mostrando que o problema é muito maior, não é apenas estar debaixo da lei, mas a realidade de estar debaixo do pecado.

Ao longo da história cristã, seguidores sinceros de Jesus tentaram alcançar um nível de santificação onde o pecado não tem mais poder sobre eles. Essa busca os levou a todos os tipos de extremos nos esforços para mortificar a carne. Se apenas! — se ao menos pudesse ser alcançado o ponto mágico onde a tentação perde todo o poder de nos seduzir. Se apenas! —esse é o ideal, o conceito— Paulo nos afasta de toda essa teologia. Ela nos diz aqui, em Romanos 6, por meio das duas ilustrações principais – morte e escravidão – que o segredo da vida cristã não está em alcançar uma experiência máxima, mas em nos entregar continuamente, dia a dia, passando a cada momento em obediência a Cristo, nosso Mestre.

Lutero lutou com essa questão. Das profundezas da angústia pessoal, ele finalmente entendeu o ensinamento de Paulo. Somos, disse Lutero, santos e pecadores, e assim permaneceremos até que nosso Senhor retorne e transforme este mortal em imortal, e este corruptível em incorruptível.

Em sua obra épica A Divina Comédia, Dante apresenta graficamente a natureza de nossa batalha contra o mal. Ele tem 35 anos e se encontra em uma floresta sombria. À frente ele vê o topo de uma montanha, uma visão da vida que procura. Ele entusiasticamente dirige seus passos em direção ao seu sol.

Mas de repente três bestas correm para ele de fora da floresta. O primeiro é um leopardo; então um leão salta sobre ele; seguido por um lobo emaciado.

Esses animais ferozes que desafiam a subida de Dante à colina ensolarada representam a variedade de tentações. O leopardo representa a atratividade da juventude. O leão representa o pecado do orgulho: a tentação de nossos anos maduros. A realização e o sucesso nos tornam vulneráveis a essa nova abordagem do maligno.

Finalmente, o lobo da avareza (ganância) rasteja atrás de nós, perseguindo-nos persistentemente. Ela vem logo após o nosso zênite ter passado, seduzindo-nos com egoísmo e ganância.

Também vagamos pela floresta sombria. Somos constantemente vítimas de animais selvagens. Levantamos os olhos para o topo da montanha, mas não podemos alcançá-lo sozinhos. Precisamos de alguém para nos levar pela mão e ser nosso guia e nosso Deus.

O enigma de Romanos 7

Por muitos anos fiquei intrigado com o que Paulo quis dizer em Romanos 7. Ele escreveu na primeira pessoa, mas o que ele diz em “eu” não combina com o que ele nos diz sobre si mesmo em outros lugares. Poderia o “eu” referir-se não a Paulo, mas talvez a todos? E se sim, Paulo está descrevendo a experiência do crente antes ou depois de se tornar um seguidor de Jesus?

Minha compreensão vacilou de um lado para o outro. Não é apenas um mistério interessante, um enigma teológico. Não; porque está mais em jogo, algo prático, algo que toca meu cotidiano como seguidor de Jesus. Quero ser fiel ao meu Senhor que deu a vida por mim; quero honrá-lo na batalha contra o mal. Procuro toda a ajuda que posso encontrar; então eu olho ansiosamente para as instruções de Paulo enquanto o Espírito guia sua pena.

Como pensei muito sobre o que compartilhar neste livro, minha pesquisa levou a ideias que são bastante novas para mim e que considero empolgantes; Vou compartilhá-los aqui. Em particular, fui esclarecido pelo novo comentário do Dr. Sigve K. Tonstad sobre o livro de Romanos.

As perguntas listadas acima vêm das palavras de Paulo em Romanos 7:7-25. A primeira seção do capítulo, versículos 1-6, tem seu próprio conjunto de quebra-cabeças. Embora não sejam tão intrigantes quanto as questões levantadas nos versículos 7-25, ainda assim têm sido objeto de controvérsia. Portanto, prestarei atenção a eles antes de lidar com os versículos mais problemáticos 7-25.

Romanos 7:1-6: Uma analogia do casamento

Ao escrever aos romanos, Paulo mantém em vista a natureza mista da congregação, os judeus e os gentios. Em Romanos 7:1-6 ele se dirige aos cristãos judeus: “Vós que conheceis a lei” (Romanos 7:1). A ilustração em que se baseia – uma mulher casada que está ligada ao marido enquanto ele está vivo – não se aplicaria à sociedade romana porque, sob a lei romana, a mulher era livre para se divorciar do marido.

A analogia parece direta até tentarmos empurrá-la em detalhes; então se desfaz. Quem é a mulher casada no centro da discussão?

Presumivelmente, o crente em Cristo. Então, quem é o marido a quem ela está vinculada por lei enquanto ele viver? Não pode ser a lei, uma vez que a lei se opõe a ela, seja para declarar seu casamento legítimo ou para marcá-la como adúltera. É então, como alguns quiseram argumentar,

Nosso velho modo de vida, o “velho homem do pecado”? Mas isso não faz sentido: Paulo continua dizendo que eles “morreram para o poder da lei quando morreram com Cristo” (Romanos 7:4).

Todas as tentativas de fazer uma comparação direta entre a ilustração de Paulo e a vida do crente não nos levam a lugar algum – fazemos uma bagunça. O esforço não é frutífero porque é mal direcionado. Uma analogia faz um ponto-chave; não deve ser forçado além de sua intenção. A intenção de Paulo nesta passagem é simplesmente esta: a morte produz um impacto permanente.

A morte causa impacto na relação conjugal: a morte do cônjuge libera a mulher para se casar com outro sem ter infringido a lei ou ser acusada de adúltera. Da mesma forma com o cristão: ele ou ela morreu para a lei para se juntar a Cristo.

As palavras de Paulo nesta passagem dão o golpe de misericórdia para seus oponentes judaizantes em todos os lugares, não apenas em Roma. Vai além do que ele escreveu anteriormente sobre a função da lei, que aponta para o pecado (Romanos 3:20). Agora diz que a lei desperta o pecado e aumenta o pecado (Romanos 6:5). Estas são palavras fortes, especialmente para os adventistas do sétimo dia por causa de nossa insistência na perpetuidade da lei.

Os leitores de Paulo podem muito bem responder: “Bem, então, estou sugerindo que a lei de Deus é pecaminosa? Claro que não!” (Romanos 6:7). No restante do capítulo, Paulo elabora as ideias que ele abordou nos versículos 1-6. Ao fazê-lo, ele fornece uma análise psicológica e espiritual penetrante da vida cristã em relação ao pecado.

O pecado e a lei (Romanos 7:7-13)

“Antes eu vivia sem entender a lei. Mas quando aprendi o mandamento de não cobiçar, por exemplo, o poder do pecado ganhou vida e eu morri.

Então descobri que os mandamentos da lei, que deveriam dar vida, trouxeram a morte espiritual. O pecado se aproveitou desses mandamentos e me enganou; usou os mandamentos para me matar. Mas ainda assim, a própria lei é santa e seus mandamentos são santos, corretos e bons.

“Mas como pode ser isso? A lei, que é boa, causou minha morte? Claro que não! O pecado usou o que era bom para cumprir minha sentença de morte. Assim podemos ver quão terrível o pecado realmente é. Ele usa os bons mandamentos de Deus para seus próprios maus propósitos” (Romanos 7:9-13).

“Eu mesmo tenho motivos para tanta confiança. Se alguém pensa que tem motivos para confiar nos esforços humanos, eu faço mais: circuncidado no oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu puro; quanto à interpretação da lei, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor da igreja; Quanto à justiça exigida pela lei, irrepreensível” (Filipenses 3:4-6).

Em nenhum lugar da Bíblia — nem em Atos, nem nas cartas de Paulo — encontramos sequer um indício de uma vida anterior em que ele viveu à margem da lei. E nem um indício de um tempo “quando aprendi o mandamento de não cobiçar, por exemplo, o poder do pecado veio à vida, e eu morri” (Romanos 7:7). Parece impossível enquadrar o “eu” de Romanos 7 com o que sabemos da vida de Paulo.

Em vista dessa evidência, muitos estudantes de Romanos argumentaram que o “eu” representa todos os crentes. Mas é Melhor essa possibilidade do que a anterior? A descrição de Romanos 7:7-13, retrata com precisão a experiência de todos os que se tornam seguidores de Jesus? Podemos afirmar, por exemplo, que “o pecado se aproveitou daqueles mandamentos e me enganou; ele usou os mandamentos para me matar”.

As palavras não parecem se alinhar com a experiência cristã comum. Dr. Tonstad em seu comentário sobre Romanos oferece uma interpretação muito diferente. Ele ressalta que, embora a descrição em Romanos 7:7-13 não se ajuste a Saulo ou à experiência cristã geral, ela se alinha com uma passagem bem conhecida das Escrituras, a história da queda em Gênesis 3:1-7. Lá encontramos Adão e Eva em estado de inocência, mal cientes de que a lei existia – por assim dizer, vivos à parte da lei. Mas Satanás, agindo por meio da serpente, apoderou-se da proibição divina e a distorceu.

O Senhor havia ordenado: “Coma livremente do fruto de todas as árvores do jardim, exceto da árvore do conhecimento do bem e do mal” (Gênesis 2:16, 17). Satanás distorceu essa proibição, que havia sido projetada como uma proteção, em “Deus realmente disse que você não deve comer o fruto de nenhuma das árvores do jardim?” (Gênesis 3:1). A serpente deu a entender que Deus era arbitrário, tentando restringir a liberdade humana, retendo deles algo que seria benéfico para eles. “Você não vai morrer!” disse a cobra para a mulher. “Deus sabe que seus olhos se abrirão assim que você comer e você será como Deus, conhecendo o bem e o mal” (Gênesis 3:4-5).

Eva foi enganada pelas palavras astutas de Satanás (cf. 1 Tim. 2:13-14). O comando divino foi retorcido e distorcido para parecer o oposto de sua verdadeira intenção. Paulo escreve: “O pecado se aproveitou desses mandamentos e me enganou; usou os mandamentos para me matar” (Romanos 7:11).

Em Romanos 5:12-21, Paulo já havia esboçado a história da queda comparando e contrastando Cristo e Adão. Agora, em Romanos 7, ele revisa a queda enquanto se concentra no pecado em relação à lei. Junto com alguns outros estudiosos, Tonstad aponta os paralelos com um documento conhecido como O Apocalipse de Moisés. Nesse documento, a serpente é explicitamente identificada como Satanás disfarçado e Eva fala na primeira pessoa, como no trecho a seguir:

“Então a cobra me disse: “Viva Deus! Mas sofro por ti, porque não te deixaria na ignorância… Não temas, porque assim que comeres, também serás como Deus, no sentido de que conhecerás o bem e o mal. Mas Deus percebeu isso, que você seria como ele, então ele invejou você e disse: ‘Não coma dele.’ Não, coma da planta e você verá sua grande glória’” (citado em Tonstad, p. 212).

A data do Apocalipse de Moisés é incerta; Paulo pode ou não estar ciente desse documento. O que Tonstad considera significativo para nossa compreensão de Romanos 7 neste documento é o recurso literário da fala no personagem.

Essa compreensão da tentação e da queda traz insights significativos. A história de Adão e Eva é recapitulada até certo ponto em cada ser humano, e dentro dessa história está a história da lei. A ênfase na queda muda de transgressão e culpa para engano e pecado devido à desobediência para desconfiança e desejo. Como diz Tonstad: “A lei foi levada cativa antes dela (Eva). “O pecado se aproveitou desses mandamentos e me enganou; ele usou os mandamentos para me matar”” (p. 213).

O conflito interno (Romanos 7:14-25)

O apóstolo Paulo está descrevendo aqui o conflito que cada um de nós às vezes sente dentro de si. “O problema é comigo, porque sou muito humano, escravo do pecado… quero fazer a coisa certa, mas não faço. Em vez disso, faço o que odeio… quero fazer a coisa certa, mas não consigo. Eu quero fazer o que é bom, mas não faço. Não quero fazer o que é errado, mas faço mesmo assim… quando quero fazer o que é certo, inevitavelmente faço o que é errado… Há outro poder dentro de mim que está em guerra com minha mente. Esse poder me torna escrava do pecado que ainda está dentro de mim… Oh, que pessoa miserável eu sou! Quem me libertará desta vida dominada pelo pecado e pela morte?” Você já se sentiu assim? Eu sim. Sim, mesmo depois de aceitar Jesus, especialmente depois de aceitar Jesus, porque agora essas coisas importam para mim.

A análise de Paulo sobre lei, graça e liberdade em Romanos 6, 7 é penetrante. A discussão gira em torno de várias ideias-chave: vida e morte, liberdade e escravidão, pecado e libertação, e especialmente lei e graça.

• Deus nos chama à vida, à liberdade e à libertação.

• Ele nos chama para uma nova vida em Jesus Cristo morrendo para o pecado,

• Ele nos chama para a liberdade morrendo para a lei.

• Ele nos chama à libertação através da graça que agora se manifestou em Jesus.

As observações de Paulo sobre a lei — toda a lei — me impressionaram e instruíram, fazendo-me reconsiderar vários pontos. Por muitos anos ele se voltou para Romanos 7 para declarações em defesa da lei, como no versículo 14: “Assim, o problema não é com a lei, porque é espiritual e boa.

O problema é comigo, porque sou demasiado humano, escravo do pecado». Ele estava certo em fazê-lo, porque Paulo diz enfaticamente que a lei é boa (Romanos 7:12, 16). Claro que é; como poderia ser de outra forma, já que Deus é seu autor?

Mas há outra parte na discussão de Paulo sobre lei/a lei. É uma parte que eu, como adventista do sétimo dia, deixei passar anos.

Ele argumenta que “a lei despertou… maus desejos que produziram numa colheita de ações pecaminosas, resultando em morte” (Romanos 7:5). Ele continua dizendo que “o pecado usou esse mandamento [não cobiçarás] para despertar em mim todo tipo de cobiça; Se não houvesse lei, o pecado não teria esse poder” (Romanos 7:8).

A lei em si não é pecaminosa, mas o pecado é maior que a lei. O pecado pega o que é bom e o usa para enganar e corromper. A lei nos diz o que não fazer, o que por causa de nossa natureza pecaminosa nos faz querer fazê-lo. Você já pintou uma cerca e colocou uma placa: “Não toque”? O que esse sinal faz algumas pessoas fazerem? Eles tocam a tinta para ver se está realmente molhada. E esse é o tipo de história que Agustinho (que conhecemos como Gus anteriormente neste livro) contou. Quando criança ele morava em uma fazenda que tinha muitas árvores frutíferas, mas o que ele fazia? Ele escalou a cerca e roubou da pereira no quintal de seu vizinho. Ele não precisava da fruta, então por que ele fez isso? Porque era proibido.

O pecado é mais poderoso que a lei. A lei aponta o que é pecaminoso. O pecado usa a lei para despertar desejos pecaminosos. Dessa forma, a lei leva ao pecado, uma ideia chocante quando descobri Romanos.

Então aqui estou eu, em conflito. Tornei-me um seguidor de Jesus, mas a guerra continua dentro de mim. Eu tenho uma natureza pecaminosa e nunca recua e desiste.

O que fazer? Não há saída para este conflito? Sim! Morrer para o pecado, diz Paulo. Escolha Jesus de novo a cada dia.

E morrer para a lei. Pare de tentar salvá-lo, se martirizando pelos inevitáveis fracassos.

Viva sob a graça, não sob a lei.

“Quem me livrará desta vida dominada pelo pecado e pela morte?”, exclama Paulo ao encerrar a descrição gráfica de seu conflito interior. E a resposta vem logo depois: “Graças a Deus, a resposta está em Jesus Cristo, nosso Senhor” (Romanos 7:24-25).

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